NEGRITUDE

Negritude

Não!
Meu cabelo não
É teu espelho

É o retrato
Da minha raça
Tua culpa já
Não disfarça
Tua atitude
Desumana
Tua desgraça

Não!
Meu cabelo
Não é teu espelho!

Minha
Pele negra
Reflete teu abuso
E minha dor
Toda violência
Da tua ganância

Rasgando
A liberdade
Dos meus sonhos
Desde a infância

Esbanjando
Pura maldade
Estruturas
Privilégios da
Sociedade
Que exclui
Minha humanidade

Não!
Meu cabelo
Não é teu espelho!

É testemunho
Da minha beleza
Da minha raça
Da minha nobreza
De ser pessoa
Negra!

Por Iraquitan Palmares

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A arte, mais que um meio de expressão, é também um dos principais meios de sobrevivência e resistência de um povo. Num país como o Brasil, refém de genocídios diversos, a negritude, umas das vítimas mais frequentes de violências policiais e civis, se reinventa brilhantemente ao resistir e reforça sua identidade na construção dos muitos caminhos para a tolerância e o respeito.
Nesta data da Consciência Negra, o SINDIEDUTEC homenageia e reconhece a luta do povo negro. Confira abaixo 20 indicações de álbuns, livros e filmes que retratam a feição de um Brasil que persiste e reluz. 
FILMES E DOCUMENTÁRIOS
Ôrí (1989) – Raquel Gerber
O documentário parte da biografia da historiadora Beatriz Nascimento, militante do Movimento Negro Unificado e morta em 1995. A partir deste ponto, são documentados os movimentos negros do Brasil entre 1977 e 1988, passando pela cultura – música, dança, religiosidade – afrobrasileira, tendo como ideia centra a metáfora do quilombo enquanto meio de resistência. Disponível no Now e no Tamanduá.
 
M8 – Quando a morte socorre a vida (2020) – Jeferson De
Maurício é um estudante esforçado que começa a estudar na renomada Universidade Federal de Medicina. Em sua primeira aula de anatomia, ele conhece M8, um cadáver de outro jovem negro que servirá de estudo para ele e os amigos. Durante o semestre, o mistério da identidade do corpo só pode ser desvendado depois que ele enfrentar suas próprias angústias relacionadas à sua identidade. Disponível no Netflix

Quanto vale ou é por quilo? (1995) – Sérgio Bianchi
Quais paralelos há entre a exploração escravagista do corpo negro e a comercialização da miséria nas periferias do Brasil? É este o tema central do filme. Disponível no YouTube. 
Sankofa – A África que te habita (2020) – César Fraga
César é fotógrafo e é formado pela Escola Superior de Desenho Industrial/UERJ e pós-graduado em marketing pela COPPEAD/UFRJ. Afrodescendente, percorreu, ao longo de dois meses, cidades e povoados de nove países, em busca de “lugares de memória” do tráfico transatlântico de escravizados. O fio condutor da narrativa são os relatos do fotógrafo, amparados pelas belas imagens recolhidas por ele. Suas impressões abrem espaço para novos diálogos e múltiplas perspectivas sobre a herança da escravidão colonial. Disponível no Netflix. 
Mães do Pina (2015) – Leo Falcão
A memória e a força de cinco mães de santo que constroem a identidade cultural religiosa da Comunidade do Bode, no Pina, em Recife. Disponível na Amazon.

Prime Video: Mães do Pina
Kizomba – 30 anos de um Grito Negro na Sapucaí (2018) – Nathalia Sarro
Em 1988 a Escola de Samba de Vila Isabel foi campeã do carnaval carioca com um samba enredo memorável que pede o fim do Apartheid, fala das belezas do povo negro em diáspora e das religiosidades que assentaram no Brasil a partir dos povos africanos escravizados. O documentário descreve como se deu a construção do enredo – assinado por Martinho da Vila – e vai até o desfile. Disponível no YouTube 
Ó paí ó (2007) – Monique Gardenberg
A vida dos moradores de um animado cortiço do centro histórico de Salvador é o ponto de partida da história. Eles compartilham a paixão pelo Carnaval e a antipatia pela síndica do prédio, Dona Joana, uma religiosa intransigente que se incomoda com a farra dos condôminos. Tudo se evidencia no carnaval – a sorte, o azar, o amor, a violência, o turismo, o racismo.
LIVROS
Rio Negro – Nei Lopes
Nei Lopes é compositorcantorescritor e estudioso das culturas africanas, no continente de origem e em diáspora. Neste livro, Lopes retrata o mítico Rio de Janeiro dos anos 1950 – não o da bossa nova, e sim aquele em que intelectuais, sambistas, jogadores de futebol, músicos, políticos, malandros, vedetes, padres e pais-de-santo, majoritariamente negros, espalhados em bares como o Nice, o Café Capital, o Abará e, principalmente, o Rio Negro, passavam noites inteiras discutindo questões políticas, sociais e culturais.
Quarto de Despejo – Carolina Maria de Jesus
Publicado em 1960, o livro é um diário de uma favelada, mãe solo de três crianças que trabalha como doméstica e mora em condições precárias em um terreno ocupado na cidade de São Paulo – a favela Canindé. Traduzido para treze idiomas, Carolina ganhou o mundo e e foi comentada por grandes nomes da literatura brasileira como Manuel Bandeira, Raquel de Queiroz e Sérgio Milliet.

Torto Arado – Itamar Vieira Júnior
Um dos hits da literatura nacional mais comentados da pandemia, o livro conta a história de duas irmãs, Bibiana e Belonísia, marcadas por um acidente de infância, e que vivem em condições de trabalho escravo contemporâneo em uma fazenda no sertão da Chapada Diamantina. A narrativa traz para fora relatos encravados de um Brasil profundamente marcado por relações de trabalho e de terra herdadas do passado colonial. 
Imagem de Livro - Torto arado
Amoras – Emicida
No seu primeiro livro infantil, o rapper Emicida versa sobre negritude, representatividade, preconceito e autoconfiança, além de ser um exemplo de como a paternidade presente e afetiva contribui para a construção de referências positivas que levam ao desenvolvimento saudável da criança.
História Social da Beleza Negra – Giovana Xavier
Neste livro, a historiadora e teórica do feminismo negro Giovana Xavier explora o surgimento de uma indústria cosmética voltada para a mulher negra nos Estados Unidos na virada do século XIX ao XX, período de normatização agressiva da brancura como padrão de beleza universal, de popularização da eugenia e de difusão de valores associados à ideia de supremacia branca. Ao traçar paralelos entre Brasil e Estados Unidos, História social da beleza negra relaciona racismo e indústria da beleza, evidenciando as raízes sociais desse conceito sutil da subjetividade feminina negra e do que é considerado belo.
Insubmissas Lágrimas de Mulheres – Conceição Evaristo
A antologia é composta de 13 contos, cujas histórias têm como protagonistas mulheres negras. De dentro da cena, vozes-mulheres explicitam suas dores, anseios, temores, mas, antes de tudo revelam a imensa capacidade de se retirarem do lugar do sofrimento e inventarem modos de resistência.
ÁLBUNS
Elza Soares – Do Coccix até o Pescoço (2002)
Antes da nova reinvenção de Elza com o álbum A Mulher do Fim do Mundo, houve outra tão barulhenta quanto, capaz de agregar funk, rap e beats eletrônicos. O disco foi um dos melhores de 2002 segundo a crítica da IstoÉ e traz reflexões acerca da sua trajetória pessoal e da condição do povo negro no Brasil.
Gilberto Gil – Refavela (1977)
Depois de ter ido a um encontro em Lagos, Nigéria, no mesmo ano, Gil traçou paralelos entre os ritmos africanos que se desenvolveram no continente e as heranças rítmicas que se misturara ao redor do mundo. Desse paralelo, nasceu Refavela, um dos discos mais importantes da carreira do músico.
Xênia França – Xênia (2017)
Ex integrante do grupo Aláfia, este é o primeiro álbum da cantora. Nele, há a mistura de ritmos contemporâneos, não tão contemporâneos e ancestrais para falar de cabelos crespos, apropriação cultural, afirmação e o entendimento de que mulheres negras não são mais fortes que ninguém, são seres humanos que merecem a mesma dose de respeito e compreensão.
Xenia eleva mulher e orgulho negro em álbum solo de textura moderna | G1 Música Blog do Mauro Ferreira
Cassiano – Cuban Soul: 18 kilates (1976)
Ícone do Soul Brasileiro, Genival Cassiano dos Santos era paraibano e trabalhava como servente de  pedreiro assim que chegou ao Rio de Janeiro com a família. Seu talento e memória não são muito conhecidos na atualodade, mas são seus sucessos como “Eu amo você” e “Primavera”, famosas na voz de Tim Maia. Este é o disco mais importante da carreira do paraibano, que morreu em maio de 2021 de pneumonia e doença pulmonar obstrutiva crônica.
Jorge Ben – África Brasil (1976)
Eleito pela revista Rolling Stone como um dos 100 maiores discos da música brasileira, é o único álbum brasileiro no ranking dos 50 discos mais legais do mundo, também organizado pela revista. O trabalho traz misturas dançantes de ritmos africanos pelo mundo: funk, R&B, samba e rock. Prova da ponte rítmica proposta pelo disco é o vídeo abaixo, produzido por Daniela Schuarts e Leonardo Salomão, em divulgação de um projeto de financiamento de comunidades carentes na Zâmbia. Nele, crianças dançam ao som de Umbabarauma, uma das músicas mais famosas do álbum.
Mateus Aleluia – Olorum (2020)
Ex integrante do grupo Os Tincoãs, famoso grupo dos anos 60 e 70 que traziam temáticas afro religiosas com melodias vocais marcantes, Mateus Aleluia tem uma estética afro-barroca, segundo o portal G1, que é minuciosa e de fé. 
Lia de Itamaracá – Ciranda Sem Fim (2020)
Aos 75 anos, a cirandeira mais famosa do Brasil, lançou novo disco para preservar a memória de uma das expressões culturais mais lúdicas do Brasil. 

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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