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Nota de Repúdio do Povo Xikrin

Nota de Repúdio do Povo Xikrin da Terra Indígena Trincheira Bacajá

“Todos falam que devemos ficar na aldeia para se proteger, mas não fazem nada”

O Xikrin da Trincheira Bacajá, vem manifestar publicamente sua indignação e seu repúdio de como estamos sendo tratados diante da Pandemia do Corona Vírus 19.

Desde 17 de março de 2020 a Funai estabeleceu a Portaria 419 que proíbe a entrada em Terra indígena para proteger nós do vírus. Porém não apresentou nenhum direcionamento para a Norte Energia, empresa responsável pela Usina Hidrelétrica de Belo Monte, para não parar as atividades do PBA-CI.

A executora do PBA-CI fala que está fazendo o que está autorizado pela Norte Energia por causa da Pandemia e da Portaria da Funai. Enviamos vários ofícios e mensagens para a Norte Energia que responde que está seguindo as orientações da FUNAI e que está aberta ao diálogo e conversando com a Funai. A Funai responde que está conversando com a Norte Energia. E quem conversa com os índios? A Funai que deveria nos defender e proteger está ajudando a Norte Energia a não cumprir as obrigações por causa dos impactos da construção da usina de Belo Monte.

A Norte Energia se aproveita da situação e ao invés de melhorar o serviço, piora ainda mais e parou tudo em nome da Funai. Nós indígenas somos sempre os prejudicados! A Usina de Belo Monte não parou de funcionar e a Norte Energia contínua ganhado o dinheiro com a geração de energia, mas o PBA-CI pode parar com a autorização do órgão que devia nos proteger e ficar do nosso lado? A Funai está ajudando a Norte Energia e não os índios.

As atividades do PBA-CI contratadas para a Terra Indígena Trincheira Bacajá foi com muita luta do povo, pois se dependesse na Norte Energia estava tudo parado há muito tempo até a revisão do PBA-CI que nunca avança. Todas as atividades foram definidas por nós com base nosso Plano de e não podem ser paradas ou suspensas sem diálogo e participação do povo Xikrin. Está na convenção 169 da OIT, é nosso direito ser consultado e decidir sobre nossa vida.

A Norte Energia nunca cumpre o que promete e há muito tempo vem atrasando e deixando de entregar as ferramentas da roça o que causa prejuízo na produção das famílias e aumenta ainda mais a situação de risco. Essa situação dos insumos e ferramentas do PAP já vem acontecendo mesmo antes da Pandemia e foi feito denúncia por nós a Funai e ao MPF e não foi tomada nenhuma providência. Com a situação da Pandemia se agravou, porque além das ferramentas e insumos para a produção que sempre atrasam e são insuficientes, estamos sem acompanhamento técnico e sem apoio do Programa de Atividades Produtivas porque a Funai proibiu a execução nas aldeias. Além disso, a Norte Energia nem contratou ainda a empresa que vai fazer os estudos de viabilidade que já deviam ter começado, para autorizar produções definidas pelas aldeias. Ou seja, tudo já estava atrasado mesmo antes da Pandemia e agora com a autorização da Funai para parar tudo, vai ficar pior ainda mais para os índios. A Norte Energia sempre mentiu e nada acontece e agora está mentindo com a ajuda da Funai.

Todos falam que devemos ficar na aldeia para se proteger, mas não fazem nada. Já tem mais de 4 meses que está tudo parado e nenhuma proposta, ou conversar foi feita com os índios para encontrar um jeito de amenizar os impactos da pandemia. Estamos presos na aldeia e em situação de risco maior do que se estivéssemos saindo, porque se não morrermos pelo vírus, vamos morrer de e de tristeza diante dessa situação de abandono e de descaso de todos com o apoio da Funai. Não vamos aceitar ser tratado desse jeito, jogado na aldeia, vivendo de esmola de cesta básica que não dá nem para alimentar por uma semana ! Vamos lutar pelos nossos direitos! Vamos descer para a cidade e brigar e se ficar doente, vamos morrer lutando e a culpa vai ser da Funai e da Norte Energia!

Kroire Xikrin
Presidente
Associação Bebô Xikrin do Bacajá

Fonte: APIB

 

 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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