Outubro Rosa: Realidade Criminosa

Outubro Rosa: Realidade Criminosa

Por Marcelo Abreu

Médicos avisam: a mamografia é o mais eficaz exame para detectar o câncer de mama, na fase inicial. Fiz muita matéria sobre isso. Só há um porém: na rede pública, o aparelho está sempre quebrado. Quase sempre. Rotina.

É sempre o mesmo enredo. A mulher descobre um caroço no seio. Corre pra uma consulta na rede pública. Mas, ao chegar, a consulta dela será, com sorte, em três ou quatro meses.

Aí, depois desse tempo todo, o primeiro contato com o médico (mastologista). Ela sente que o caroço já aumentou. Ele também percebe que a  coisa  não tá  boa. Ao  ser consultada, a indicação do médico é a mamografia. O aparelho está com defeito. Via crucis.

Ela, pobre, não pode pagar uma clínica particular para realizar o exame. Espera o tal aparelho ser consertado, depois aguarda a vez numa fila sempre quilométrica. E reza para que o tal aparelho, o único, não quebre de novo, enquanto espera na fila. Em um ano, o caroço, que era tão pequeno, tão mínimo, lá no começo, agora se espalhou pelo corpo todo. Metástase.

As mulheres neste país, especialmente as mais pobres, morrem de câncer de mama pelo descaso das autoridades, pelos desmandos, pela corrupção generalizada, pela roubalheira sem limites. E isso é histórico. Realidade de TODOS os governos. De A a Z. O resto é propagada bonita, que JAMAIS corresponderá à realidade. Essa é a única realidade. E é triste. É devastadora. É CRIMINOSA.

Marcelo Abreu  – Jornalista

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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação. 

Resolvemos fundar o nosso.  Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário.

Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também. Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, ele escolheu (eu queria verde-floresta).

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Já voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir.

Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. A próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar cada conselheiro/a pessoalmente (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Outras 19 edições e cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você queria, Jaiminho, carcamos porva e,  enfim, chegamos à nossa edição número 100. Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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