PAULO COLINA: QUANDO PELA GARGANTA

PAULO COLINA: QUANDO PELA GARGANTA

Quando pela garganta 

Por Paulo Colina 

Quando pela garganta
desce abrupta mão,
nenhum punho fechado pode
transmutar nosso canto livre
Em grito
Há sede é ,
esse ardor pelo espaço usurpado
e nervos
sem declinar de qualquer sentimento gentil
salvo a palavra bruta.
Tudo o que transporta o ar,
nós revelamos.
Sonhamos coisas que existirão,
ainda que você sempre duvide.
Nem todo o privado de visão é cego;
quem rala a alma pelo lado de fora
sim.
Ventre armazenado de calor.
Negro, a cor de princípios.

Paulo Colina – poeta e prosador

Paulo Colina poeta, prosador e ensaísta, nascido Paulo Eduardo de Oliveira em Colina, de São Paulo, a 9 de março de 1950. Membro da geração fundadora dos Cadernos Negros e do coletivo Quilombhoje, estreou com o volume de contos Fogo cruzado (1980), ao qual se seguiram as coletâneas de Plano de voo (1984), A noite não pede licença (1987) e Todo o fogo da luta (1989).

Traduziu vários poetas japoneses para o português, entre eles Takuboku Ishikawa (1885-1912), Bokusui Wakayama (1885–1928) e Akiko Yosano (1878-1942). Seu conhecimento e traduções da poesia japonesa refletem-se em seu trabalho, que prima muitas vezes pela concisão. Morreu prematuramente em 1999, deixando vários inéditos, entre eles o volume Águas-fortes em beco escuro, que reúne sua produção ensaística.
:: Fonte: DOMENECK, Ricardo. Paulo Colina. in: Revistamododeusar. (acessado em 30.6.2015).

“Não sou um negro escritor e muito menos um escritor negro. Na verdade, sou um contador de es/histórias tal como meu avô ou meu tio-avô, quando nos reuníamos no
quintal, no verão, ou na cozinha, nas noites frias, sentados em banquinhos de madeira.
Sou um repórter do dia-a-dia, da nossa realidade. Sou um olho-vivo nas vilas, favelas, cortiços, nos sambas, na cidade-vida nossa. O que me difere do meu avô contador de histórias é que eu escrevo ao invés de falar, pois as nossas realidades mudaram muito pouco, e que, contar, para ele, era um ato lúdico, enquanto que para mim é algo compulsório, do qual não posso fugir.”
– Paulo Colina, no conto “Fogo Cruzado”. em: ‘Cadernos Negros 2’. São Paulo: Edição dos Autores, 1979, p. 103.

OBRAS DE PAULO COLINA

:: Fogo cruzado. [prefácio Fábio Lucas]. São Paulo: Edições Populares, 1980.

Poesia
:: Plano de voo. São Paulo: Roswitha Kempf Editores, 1984.
:: A noite não pede licença. [prefácio Cláudio Willer]. São Paulo: Roswitha kempf Editores, 1987.
:: Todo o fogo da luta. São Paulo: Scortecci Editora, 1989.

Teatro
:: Entredentes (Drama para negros em um ato). Inédito.

Ensaio
:: Águas-fortes em beco escuro. Inédito. 199-.

Artigos, ensaios e prefácio
:: Prefácio, ao livro ‘O negro escrito – apontamentos sobre a presença do negro na literatura brasileira‘, organizado por Oswaldo de Camargo. São Paulo: Imesp, 1987.

:: Reflexões pela noite viva. comunicação apresentada no 40º congresso anual da SBPC, em 1988.

:: O escritor negro no , quem é ele? [Manifesto do Triunvirato: Paulo Colina, Oswaldo de Camargo e Abelardo Rodrigues]. In: XAVIER, Arnaldo; CUTI; ALVES, Miriam (org.). Criação Crioula, Nu Elefante Branco. São Paulo: IMESP, 1985. p. 99-100.

::  para os paulistanos – Um poeta percorre a noite de São Paulo para encontrar e mostrar onde se diverte a beleza negra. In: ANGELO, Ivan, RIBEIRO, Teresa (Coord.); SERVA, Leão (Concepção). O romance de um dia – Fac-símile completo da edição especial do Jornal da Tarde comemorativa da 14ª Bienal do Livro, inteiramente produzida por escritores. São Paulo: Jornal da Tarde, 1996.

 

:: Um breve tambor nos . In: Simpósio Internacional de Estudos sobre Jorge Amado, 1, 1992, Salvador. Um grapiúna no país do carnaval. Salvador: Edufba, Casa de Palavras, 2000. p. 231-250.

:: Axé — Antologia contemporânea da poesia negra brasileira. [prefácio Joel Rufino]. São Paulo:  Global Editora, 1982. Prêmio APCA — Associação Paulista de Críticos de Artes — de literatura: Melhor livro de poesia do ano.

Antologias (participação)
:: Cadernos Negros 2 (Contos).. [Organização Luiz Cuti; apresentação José Correia Leite]. São Paulo: Edição dos Autores, 1979.
:: Cadernos Negros 3 (Poesia). São Paulo: Edição dos Autores,1980.
:: A razão da chama – antologia de poetas negros brasileiros. [organização Oswaldo de Camargo]. São Paulo: Edições GRD, 1986.
:: O voo da paz: conceitos de escritores, poetas e artistas plásticos. [coordenação Durval Borges]. São Paulo: IBRASA, 1987.
:: O negro escrito. [organização Oswaldo de Camargo]. São Paulo: Secretaria de Estado da Cultura, 1987.
:: Poesia negra brasileira – antologia.  [organização Zilá Bernd]. Porto Alegre: Instituto Estadual do Livro,
1992.
:: Literatura e afrodescendência no Brasil: antologia crítica. [organização  Eduardo de Assis]. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2011. 4vTraduções realizadas por Paulo Colina
ISHIKAVA, Takuboku.Tankas. [tradução Paulo Colina e Masuo Yamaki]. São Paulo: Roswitha Kempf Editores, 1ª ed., 1985; 2ª ed., 1986.
BRUTUS, Denis. Canção da cidade noturna (Night song city).. [tradução Paulo Colina]. In:
Cultura Afro-Brasileira – número especial do Suplemento Literário de . Org. de Adão Ventura, nº 1033, Belo Horizonte (MG), 26 de julho de 1986.
WAKAYAMA, Bokussi. Tankas de Bokussui Wakayama. [tradução Paulo Colina]. In: Yashiu, nº 207, São Paulo.Dezembro de 1987.
YOSSANO, Akiko. Tankas. [tradução Paulo Colina]. In: Yashiu, nº 215, São Paulo. Abril de 1988.
NISHIDA, Sueko. Rolinha. [tradução Paulo Colina e Masuo Yamaki]. São Paulo: Edição da autora, 1987.
SOYINKA, Wole. Ulysses – Anotações para minha aula sobre Joyce (“Ulysses – Notes from here to my Joyce Class”); Aos loucos sobre o muro (“To the madmen over the Wall”)Um toque de teia no escuro: (“A Cobweb’s touch in the dark”) Eu consagro minha carne (décimo dia de jejum): (“I anoint my flesh (tenth day of fast)”): poemas de Wole Soyinka. [tradução Paulo Colina]. In: Escrita, nº 37, São Paulo(SP), 1987.
A poesia ante a porta da liberdade: seis poetas sul-africanos. [tradução Paulo Colina]. Jornal da Tarde, Caderno de Sábado. São Paulo: 03/08/1991.
OUTRA gente nada estranha: poesia negra sul-africana contemporânea. [tradução Paulo Colina]. In: Exu, nº 29, setembro/outubro 1992, ano V, revista bimensal da Fundação Casa de Jorge Amado, Salvador, Bahia.
TAWARA, Machi. Comemoração da salada. [tradução Paulo Colina e Masuo Yamaki].  São Paulo: Estação Liberdade, 1992.“Escrevo porque há que se despertar a consciência adormecida e preguiçosa de nosso , porque há que se cutucar com punhais/palavras os marginalizados que são meus personagens (e que provavelmente – não por falta de empenho de minha parte – nem venham a ler meus textos), porque há que se tentar sacudir a classe média, que só tem monstros sagrados e empoeirados e best-sellers, que em nada condizem com a nossa realidade, em suas estantes, uma realidade que fingimos não ver, e porque entendo que a literatura não deveria pertencer a uma determinada classe social e/ou raça.”
– Paulo Colina, no conto “Fogo Cruzado”. em: ‘Cadernos Negros 2’. São Paulo: Edição dos Autores, 1979, p. 103.

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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