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Pedro e Marãiwatsédé: Uma luta, um luto!

Pedro e Marãiwatsédé: Uma luta, um luto!

Da luta contra a opressão, à semente brotada na vermelha terra conquistada, à resistência que segue: Gratidão, Dom Pedro! 

Por Ana Paula Sabino

Enquanto a terra vermelha do Araguaia recebe o corpo de Dom Pedro Casaldáliga para o seu descanso final, os Xavante celebram os 16 anos da  retomada  da Terra Indígena Marãiwatsédé,  conquistada depois de mais de três  décadas de resistência e de luta por um território invadido, tomado, devastado pelo . Luta de Pedro que segue, mesmo no luto.

No momento em que o corpo de Dom Pedro, sagrado homem do povo oprimido, por onde passa vai recebendo incontáveis expressões de gratidão por todo o Vale dos Esquecidos, passando por Aragarças, por Nova Xavantina, até chegar, nesta quarta-feira, 12, a São Felix do Araguaia, terra que escolheu para viver e para lhe servir de última morada, em nós reacende o exemplo de luta em defesa dos oprimidos pelo direito à terra, pelo direito à vida. 

De Dom Pedro, o bispo do povo, o defensor das causas mais justas e das pessoas mais vulneráveis, fica uma memória de poesia, amor, luta,resistência e fé. Onde houver razão para esperança, aí estará para sempre viva a presença de Dom Pedro porque Dom Pedro é semente que faz de nós resistência. Pedro é, para nós, o companheiro descrito por Chico Machado: “Pedro é igreja viva, não abandona nunca e sempre acolhe. E é dessa igreja viva que eu quero comungar, sentir e compartilhar com todos e todas.”

Agora, o corpo de Dom Pedro segue em procissão como nas Romaria dos Mártires, por ele criada para homenagear aos e às que “deram a vida pela vida” no e na América Latina:  , Antônio Conselheiro, o padre salvadorenho Oscar Romero, reconhecido como santo pelo , além do índio pataxó Galdino Jesus dos Santos, queimado vivo por jovens enquanto dormia numa praça em Brasília, e a missionária americana Dorothy Stang, assassinada a mando de fazendeiros no Pará.

Neste momento em que se aproxima o momento do descanso final de Dom Pedro às margens do , em sua fica o registro dos  16 anos da retomada tradicional que os Xavante fizeram de sua Terra Indígena Marãiwatsédé.

Ná década de 60, os Xavante de Marãiwasédé foram retirados de suas terras ancestrais, que se transformaram no  maior latifúndio do mundo. Depois de décadas de luta, em 1992, já haviam sido iniciados os estudos da Funai para identificação do território Xavante, homologado em 1998 pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, apesar do processo de invasão e de denúncias pela urgência da extrusão à época.

Em maio de 1995, saiu a primeira decisão da Justiça determinando a extrusão. Mas foi somente em 2004, após ficarem acampados por 10 meses à beira da Rodovia BR-158, onde morreram três crianças em um só dia, que um grupo de Xavante de Marãiwatsédé conseguiu, com respaldo em uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), retomar uma parte diminuta de seu território, onde permanecem até hoje. Essa conquista  é dos Xavante,  mas é também de Dom Perdro, que se fez presente o tempo todo. 

Trago aqui parte de um relato de Chico Machado:  “Em 1992, a Terra Indígena Xavante de Marãiwatsédé começou a sofrer um violento processo de invasão, comandado por grandes fazendeiros, que incentivavam os pequenos proprietários de terra a fazerem o mesmo. A Prelazia logo se manifestou contrária, denunciando veementemente mais aquela agressão ao .

A nossa equipe de pastoral estava no olho do furacão. Fomos todos ameaçados, tanto que numa de nossas noites, achávamos que era a nossa última noite, de tanto que rondavam a nossa casa. Naquela noite rezamos de mãos dadas e chorando, pois sabíamos que poderia ser a nossa última noite. Tanto que naquela noite, a igreja que ficava ao lado da nossa casa, amanheceu pixada, com palavra duras e agressivas a nós, a Pedro e à Prelazia em si.

Amanheceu e nos dirigimos a São Félix, para beber um pouco das forças de Pedro. Assim que ouviu nosso relato,  emocionado, disse-nos palavras de conforto e concluiu com muita serenidade: ‘A causa vale a pena se doar a vida por ela.' Assim que voltamos para a nossa casa, trouxemos conosco o bispo Pedro, que passou uma temporada conosco, como presença de profeta que caminha com os seus.

Como não se apaixonar por esta igreja e por este homem que caminhava a frente, sendo igreja com todos aqueles marcados para morrer? Pedro, uma lição de vida sem ter nada a temer”.

pedro cruz

Hoje os Xavante celebram a vitória pela terra ancestral retomada, enquanto vivemos todos juntos o luto pela perda do homem simples que honrou a igreja de Cristo presente, de um Cristo que ultrapassou templos e construiu pontes na luta contra o latifúndio e na defesa da vida dos oprimidos.

Cosme Rité, Xavante que está nessa luta lá em Marãiwatsédé, relata que “nós completamos 16 anos de resistências de um povo que nunca esquece de sua terra sagrada. Agradeço aquelas pessoas que nos apoiam durante dos nossos trajetos do nosso povo da remoção, retorno e da nossa retomada! ”

E eu, aqui de Brasília,  acompanho a despedida de Dom Pedro em tempo real, refletindo sobre suas sábias palavras, sobre os conselhos que me deu para cuidar da  preservação cultural, social, e da língua Xavante, e ter sempre a perseverança e a solidariedade como meta. Sigo firme, comemorando as conquistas da luta, ao mesmo tempo em que vivo o luto, junto como o povo  Xavante de Marãiwatsédé e com todos os povos  oprimidos, pela partida de Dom Pedro. 

De Dom Pedro aprendi que juntos somos fortes, somos sementes  brotadas para resistir até o último índio, até a última árvore, até um dia termos um equilíbrio social diante das igualdades impostas pela ganância do humano. Por Dom Pedro, mesmo neste momento delicado desta pandemia, seguiremos em união, com a força e a sabedoria de quem resiste, em especial com a Campanha SOS Xavante, que é uma iniciativa voluntária de pessoas e entidades  da sociedade civil brasileira.

Organizada pela Federação dos Bancários Centro Norte (Fetec), Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt) e pelo Conselho Distrital Indígena Xavante (Condisi), a Campanha se espelha no generoso exemplo de Dom Pedro para, pela solidariedade, salver vidas Xavante na terra vermelha de Pedro Casaldáliga.

Enlutada, Marãiwarsédéte te'a , Terra Indígena Xavante conquistada sob as bençãos de Pedro do Povo Pobre,  agradece para sempre o legado de Dom Pedro Casaldáliga!  Em sendo possível, faça uma doação para a SOS Xavante em memória de Dom Pedro:  https://www.captar.info/campanha/sosxavante/

Ana Paula Sabino é jornalista, membro do Conselho Editorial da

pedro Aldeia Marãiwatsédé hoje

 


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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