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Pirilâmpagos e ignorâmpagos

Pirilâmpagos e ignorâmpagos

Antônio Carlos Queiroz (ACQ) 
O Pedro Henrique, oito anos, entrou porta adentro no maior berreiro. “Pai, pai, acabo de ver uma nuvem de pirilâmpagos!” Eliseu tentou entender a novidade embevecido pelo neologismo, lembrando o trabalho escolar que tinha escrito há 20 anos sobre os vaga-lumes do Incidente em Antares do Érico Veríssimo. Eram tantos – um que pousa no nariz da Dona Quitéria, outros que formam a tiara na cabeça da Erotildes, ambas insepultas por causa da greve dos coveiros, etc.
Despachada pra longe a recordação, o Eliseu perguntou ao moleque onde ele tinha visto o enxame luminoso. O Pedro Henrique puxou o pai uns 50 metros até a esquina, de onde se podia ver, desde o nono ou décimo andar do prédio em construção do outro lado da rua, a cascata de fagulhas saindo da tocha de um soldador, cada vez mais nítida com o dia escurecendo. “Ô, PH, cê tem razão, são mesmo pirilâmpagos!”, reagiu o Eliseu, sacando o celular. “Vamos filmar!”
Quando a vizinha Dona Santina me contou essa história, que ela jurou ser verdadeira, eu tive dois pensamentos, um de alegria, pela sorte do Pedro Henrique ter um pai amigo da ciência e da imaginação, e outro de tristeza, ao lembrar certa experiência que eu mesmo tive com um relâmpago. Eu juro que a minha história também é a mais completa expressão da pura verdade.
Deu-se assim: a gente, uma turma de onze ou doze, estava almoçando no bar Resenha, na 410 Sul, o tempo meio fechado mas sem indicar que iria chover naquela tarde. Lá pelas tantas, ouvimos um estrondo na vizinhança, e eu vi um relâmpago subindo da ponta de um para-raios do prédio do BRB. Agitado, quis saber dos meus assustados convivas se tinham percebido o mesmo que eu. Surpresa! Em vez de afirmações ou negações, choveram dúvidas sobre a própria manifestação do meu raio invertido. “Ô, ACQ, lá vem você com as suas invenções… Onde já se viu raio que sobe! Imagine! Kkkkk e talecoisa!”
Meu queixo caiu / e me fez ficar assim… Com a boca aberta, chocado com a ignorância dos meus amigos e amigas, entre os quais, se me lembro bem, havia dois engenheiros e uma engenheira, tentei argumentar que os raios ascendentes existem, sim, embora mais escassos que os descendentes. Repeti a explicação técnica do fenômeno, isto é, que os raios positivos descendentes produzem, dentro da nuvem de tempestade, depois do contato com o solo, descargas negativas de longa duração e baixa intensidade com extensão horizontal de muitos quilômetros. Essas, passando por cima de torres altas ou para-raios, podem induzir cargas positivas nas suas pontas. Se a potência for suficientemente forte, elas sungam na forma dos raios ascendentes…
Vã tentativa, ninguém quis acreditar, e eu fui embora com a cara de tacho, muito embora resplandecente. Minha vingança contra essa turma de caga-lumes foi a criação da novíssima palavra que compõe a expressão “bando de ignorâmpagos”!


 

 
"Raios te partam", subindo e descendo!

“Raios te partam”, subindo e descendo!


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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