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Qual é o preço político de um golpe de Estado?

Qual é o preço político de um golpe de Estado?

Qual é o preço político de um golpe de Estado?

Cada vez mais, as Forças Armadas reivindicam para si uma autoridade que a não lhes garante. O nome disso é golpe…

Por Rodrigo Perez Oliveira/via Jornalistas Livres

Nossa geração não tem mais o direito de subestimar Jair Bolsonaro.

Subestimamos por quase 30 anos, quando o então deputado de baixo clero, aparentemente inofensivo, usava a tribuna parlamentar para defender torturadores e atacar a .

Subestimamos em 2018, quando acreditamos que o “histórico de declarações polêmicas” estabeleceria teto baixo para campanha presidencial de Jair Bolsonaro.

Subestimamos nos últimos três anos e meio, sempre que tratamos Bolsonaro como idiota, burro, não entendendo o tipo de que estava sendo colocado em prática. O objetivo nunca foi governar, no sentido usual do termo, mas, sim, implodir as instituições da democracia liberal-representativa. E nisso, o projeto vem sendo executado com eficiência. Impossível negar. Desde o fim da ditadura, a democracia brasileira nunca esteve tão precarizada.

Muitos continuam subestimando agora, em maio de 2022, a menos de seis meses das presidenciais. Subestimamos a capacidade de Bolsonaro em liderar, de fato, um golpe de Estado no . Há quem diga que na hora H, as Forças Armadas não apoiarão, as PMs não atenderão ao chamado e a tentativa de golpe será frustrada, como aconteceu no último 7 de setembro.

Aqueles que pensam assim possuem concepção equivocada do que seja um “golpe de Estado”. Tratam o golpe como um evento situado em momento específico do , como se tivesse mês e dia para acontecer. Acreditam que o golpe acontece apenas na hora H.

“Golpe”, porém, é algo complexo, fruto de processo de médio prazo, de lenta e constante deterioração das instituições do regime golpeado. Terminado o processo, é até possível dizer com clareza o momento (mês e dia) do desfecho do golpe. Mas esse momento não é a hora H do golpe. É apenas seu desfecho, o último capítulo de uma tragédia há muito anunciada.

Golpe Adnael

O golpe não acontece apenas quando termina. Está acontecendo a partir do instante em que começa a acontecer.

De 2018 pra cá, se tornou corriqueiro ver general ameaçando outras autoridades de República, blindados das Forças Armadas fazendo exercícios em provocação aos poderes Legislativo e Judiciário. Cada vez mais, as Forças Armadas reivindicam para si uma autoridade que a Constituição não lhes garante. O nome disso é golpe!

O golpe já está acontecendo. Se o desfecho do processo será vitorioso para os golpistas é outra conversa.

É que golpe de Estado é coisa complexa também para os golpistas. Não é algo fácil, e sempre envolve riscos. Não se dá golpe apenas colocando canhões nas ruas. É necessário conseguir apoio dentro e fora do país, reprimir adversários e evitar o contra-golpe que fatalmente leva os golpistas ao cemitério ou à cadeia.

Me parece claro que não será possível resistir ao golpe bolsonarista na bala, no enfrentamento direto. Não há homens armados e treinados dispostos a defender as instituições da democracia. Jair Bolsonaro e seus cúmplices conquistaram o apoio daqueles que sabem matar, que possuem know-how de : militares das Forças Armadas, servidores das diversas forças policiais (PMs, polícias civis, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal etc) e milicianos. Com raríssimas exceções, esses homens são bolsonaristas. E os que não são, não estão disponíveis em número suficiente para garantir armada.

Mas existem outras modalidades de resistência. É perfeitamente possível aumentar o custo político do golpe para os golpistas. A prioridade, hoje, precisa ser essa.

Por exemplo, ao invés de polemizar com Bolsonaro no Twitter, seria muito mais útil se Anitta usasse seu prestígio internacional para denunciar o golpe de Estado em curso no Brasil. O mesmo vale para outros artistas, personalidades públicas e influenciadores digitais que abraçaram a causa democrática. O mundo inteiro já sabe que Bolsonaro é misógino, homofóbico, racista e não tá nem aí pra preservação da . Agora, o mundo precisa saber que ele está tramando golpe de Estado em um dos países mais importantes do planeta.

A eleição terá papel fundamental na evolução do golpe. Todas as pesquisas mostram que Lula provavelmente sairá vitorioso das urnas. Mas há vitórias e vitória. O jeito como se dará a vitória será determinante para precificar o custo do golpe para os golpistas.

Explico.

Se houver segundo turno, Lula certamente vencerá por diferença não muito maior que dez pontos. Vencerá por 55 a 45, 57 a 43, algo próximo a isso. Os 30 dias que separam o primeiro do segundo turno serão de intensa agitação golpista, com ataques ao TSE, com ameaças, com questionamento às urnas. Nessa situação, o golpe custaria menos aos golpistas. Com Bolsonaro competitivo no segundo turno, seria mais viável efetivar o golpe, com o argumento da fraude eleitoral.

É verdade que a vitória de Lula no primeiro turno não impediria o desfecho do golpe, mas o tornaria mais custoso aos golpistas. É mais difícil dizer que uma fraude eleitoral é capaz de eleger um candidato ainda em primeiro turno. O movimento rumo à conclusão do golpe precisaria ser muito mais brusco. Os riscos seriam maiores.

Lula precisa vencer as eleições no primeiro turno. E aqui não tem nenhum terrorismo eleitoral. O terrorista dessa é o atual presidente da República.

O golpe bolsonarista precisa ser denunciado e combatido desde já. Mas para isso, precisamos ter a clareza de que o golpe já começou.

É que golpe de Estado jamais é evento único, isolado, a acontecer de um dia para o outro. É sempre processo.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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