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“Revivió Pinochet” ou nem tanto? – A derrota do Chile

“Revivió Pinochet” ou nem tanto? – A derrota do Chile

“Revivió Pinochet” ou nem tanto? – A derrota do Chile

A luta por uma Constituinte no Chile começou em 2013, e não foi com partidos políticos. A organização social Marca AC, mais conhecida como “Marca tu Voto” iniciou em 2013 um movimento que reuniu líderes estudantis, intelectuais, artistas e personalidades públicas para que, a partir das eleições presidenciais daquele ano, os eleitores pudessem marcar AC (Assembleia Constituinte) no canto superior direito da cédula, além da preferência de seu voto…

Por Maurício Falavigna

Com 27 anos, Gabriel Boric era um líder estudantil e um dos principais organizadores do Marca Tu Voto e, como candidato independente, sem partido, elegeu-se para a Câmara dos Deputados.

O movimento avançou durante o segundo governo Bachelet, foi travado durante a gestão de Piñera e chegou a lançar candidato à presidência em 2017, Alejandro Guillier. O movimento não alcançava nem a popularidade e nem o convencimento dos parlamentares e dirigentes para ser instalada a Constituinte, até outubro de 2019, quando o processo de convulsão social levou os chilenos às ruas por meses, enfrentando a resistência do governo.

Conselhos autoconvocados em todas as regiões do país realizaram um sem número de assembleias, que sistematizaram as reivindicações dos manifestantes. Mais uma vez o assembleísmo e o voluntarismo dos movimentos abdicaram da estrutura partidária, revelando uma cisão entre movimentos ditos progressistas e a essência dos partidos de esquerda chilenos.

No início do Marca AC, os principais temas considerados urgentes e apresentados à população referiam-se aos direitos dos trabalhadores chilenos: substituição de pensões privadas por um sistema público, valorização salarial, redução da jornada de trabalho para 40 horas e incluía a demanda por um sistema de saúde universal. Durante as longas manifestações, promovidas com largo apoio de organizações sociais, outros temas foram ganhando vulto. Pautas étnicas, de gênero, sexualidade e morais foram tomando espaço crescente, com uma divulgação dúbia dos meios de comunicação.

Boric, por sua vez, antes mesmo de assumir a presidência, teve apoio declarado do governo Biden, e aparentemente esteve comprometido em promover a “democracia com liberdade”, fechando acordo com as pautas mais caras ao progressismo difundido pelos democratas americanos e fundações privadas. Grosso modo, foram as pautas da Open Society que ganharam os noticiários chilenos e o debate na opinião pública, provocando a rejeição moral de boa parte da sociedade, unindo a elite, as velhas forças de produção e costumes conservadores da classe trabalhadora e excluída.

A nova Assembleia Constituinte já guardava em si a derrota de não se chamar assim, nem ser uma nova Constituição, mas sim uma Convenção Constitucional que aprimoraria a Constituição de Pinochet. Agora, nem mais. A rejeição foi massacrante.

No Brasil, tanto para os que se animaram com a eleição de Boric quanto para os enlutados do domingo, as diferenças de estrutura social, política e processos de resistência devem ser levadas em consideração. Aqui a retomada progressista se fez com alianças, mas os movimentos primaveris daquele junho fatídico ainda não se reorganizaram com a mesma força.

Parte das elites participam da Frente Ampla contra o atual governo militar. E a liderança que coordena o processo é histórica, aglutina forças e camadas sociais diversas e possui uma vida partidária e uma trajetória de convivência com as instituições do País. Não há possibilidade de paralelismos, apenas de lições. E, principalmente, não há desvios da centralidade das questões nacionais e populares. Até agora.

Block

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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