Sintomas da crise civilizacional
O sintoma mais doloroso da crise civilizacional (…) é um difuso mal-estar da civilização. Aparece sob o fenômeno do descuido, do descaso e do abandono, numa palavra, da falta de cuidado
Por Leonardo Boff
(…) Há um descuido e um descaso na salvaguarda de nossa casa comum, o planeta Terra. Solos são envenenados, ares são contaminados, águas são poluídas, florestas são dizimadas, espécies de seres vivos são exterminadas; um manto de injustiça e de violência pesa sobre dois terços da humanidade.
Um princípio de autodestruição está em ação, capaz de liquidar o sutil equilíbrio físico-químico e ecológico do planeta e devastar a biosfera, pondo assim em risco a continuidade do experimento da espécie homo sapiens e demens (…)
Face a essa situação de falta de cuidado, muitos se rebelam. Fazem de sua prática e de sua fala permanente contestação. Mas sozinhos sentem-se impotentes para apresentar uma saída libertadora. Perderam a esperança.
Outros têm fé e esperança. Mas propõem remédios inadequados aos sintomas de uma doença coletiva. Não vão à causa real das mazelas. Tratam apenas dos sinais.
(…) Importa buscar respostas, inspiradas em outras fontes e em outras visões de futuro, para o planeta e para a humanidade.
Nesse sentido, as respostas vêm sendo formuladas concretamente, pelo conjunto de pessoas que ensaiam práticas coletivas em todos os lugares e em todas as situações do mundo atual. Portanto, não há um sujeito histórico único. Muitos são os sujeitos dessas mudanças (…) Elas emergem de um caminho coletivo que se faz caminhando.
Sintomas da Crise Civilizacional. In: Saber Cuidar, Editora Vozes, 2012.
LEONARDO BOFF E A PREOCUPAÇÃO COM A CRISE CIVILIZACIONAL E SEUS SINTOMAS
Leonardo Boff nasceu em Concórdia, Santa Catarina, aos 14 de dezembro de 1938. É neto de imigrantes italianos da região do Veneto, vindos para o Rio Grande do Sul no final do século XIX.Fez seus estudos primários e secundários em Concórdia-SC, Rio Negro-PR e Agudos-SP. Cursou Filosofia em Curitiba-PR e Teologia em Petrópolis-RJ. Doutorou-se em Teologia e Filosofia na Universidade de Munique-Alemanha, em 1970. Ingressou na Ordem dos Frades Menores, franciscanos, em 1959.
Durante 22 anos, foi professor de Teologia Sistemática e Ecumênica em Petrópolis, no Instituto Teológico Franciscano. Professor de Teologia e Espiritualidade em vários centros de estudo e universidades no Brasil e no exterior, além de professor-visitante nas universidades de Lisboa (Portugal), Salamanca (Espanha), Harvard (EUA), Basel (Suíça) e Heidelberg (Alemanha).
Esteve presente nos inícios da reflexão que procura articular o discurso indignado frente à miséria e à marginalização com o discurso promissor da fé cristã gênese da conhecida Teologia da Libertação. Foi sempre um ardoroso defensor da causa dos Direitos Humanos, tendo ajudado a formular uma nova perspectiva dos Direitos Humanos a partir da América Latina, com “Direitos à Vida e aos meios de mantê-la com dignidade”.
É doutor honoris causa em Política pela universidade de Turim (Itália) e em Teologia pela universidade de Lund (Suécia), tendo ainda sido agraciado com vários prêmios no Brasil e no exterior, por causa de sua luta em favor dos fracos, dos oprimidos e marginalizados e dos Direitos Humanos.
De 1970 a 1985, participou do conselho editorial da Editora Vozes. Neste período, fez parte da coordenação da publicação da coleção “Teologia e Libertação” e da edição das obras completas de C. G. Jung. Foi redator da Revista Eclesiástica Brasileira (1970-1984), da Revista de Cultura Vozes (1984-1992) e da Revista Internacional Concilium (1970-1995).
Em 1984, em razão de suas teses ligadas à Teologia da Libertação, apresentadas no livro “Igreja: Carisma e Poder”, foi submetido a um processo pela Sagrada Congregação para a Defesa das Fé, ex Santo Ofício, no Vaticano. Em 1985, foi condenado a um ano de “silêncio obsequioso” e deposto de todas as suas funções editoriais e de magistério no campo religioso. Dada a pressão mundial sobre o Vaticano, a pena foi suspensa em 1986, podendo retomar algumas de suas atividades.
Em 1992, sendo de novo ameaçado com uma segunda punição pelas autoridades de Roma, renunciou às suas atividades de padre e se auto-promoveu ao estado leigo. “Mudou de trincheira para continuar a mesma luta”: continua como teólogo da libertação, escritor, professor e conferencista nos mais diferentes auditórios do Brasil e do estrangeiros, assessor de movimentos sociais de cunho popular libertador, como o Movimento dos Sem Terra e as comunidades eclesiais de base (CEB’s), entre outros.
Em 1993 prestou concurso e foi aprovado como professor de Ética, Filosofia da Religião e Ecologia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
Em 8 de Dezembro de 2001 foi agraciado com o premio nobel alternativo em Estocolmo (Right Livelihood Award).
Atualmente vive no Jardim Araras, região campestre ecológica do município de Petrópolis-RJ e compartilha vida e sonhos com a educadora/lutadora pelos Direitos a partir de um novo paradigma ecológico, Marcia Maria Monteiro de Miranda. Tornou-se assim ‘pai por afinidade’ de uma filha e cinco filhos compartilhando as alegrias e dores da maternidade/paternidade responsável. Vive, acompanha e re-cria o desabrochar da vida nos “netos” Marina , Eduardo, Maira, Luca e Yuri.
É autor de mais de 60 livros nas áreas de Teologia, Espiritualidade, Filosofia, Antropologia e Mística. A maioria de sua obra está traduzida nos principais idiomas modernos.
Fonte: Leonardo Boff