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Sob ataque pós-eleição, Terras Indígenas estão desprotegidas

Sob ataque pós-eleição elas estão desprotegidas com desmonte da Funai

Da Carta Capital –  Invasores armados com motosserras e foices disparam ameaças e derrubam ilegalmente árvores centenares dentro da Terra Indígena Karipuna, em Rondônia. O posto de saúde dos Pankararu, em Pernambuco, é incendiado no dia da vitória de Jair Bolsonaro. As intimidações se repetem no Alto Rio Guamá, no Pará: “Eles enviam cartas com ameaças dizendo que o tempo do Lula passou e agora é Bolsonaro”, conta uma liderança indígena que prefere não se identificar.

Há pelo menos 14 homologadas sob ataque neste momento. A Repórter Brasil levantou os casos em conversas com 13 lideranças indígenas nas últimas duas semanas, cinco servidores da Funai e órgãos do terceiro setor. Lideranças indígenas e indigenistas concordam na avaliação de que o atual cenário político gera uma sensação de “liberou geral”.

Captura de Tela 2019 02 08 a%CC%80s 17.47.51TI Desmatamento Rogerio Greenpeace

NA TERRA INDÍGENA KARIPUNA FEITA POR MADEIREIROS ILEGAIS EM DEZEMBRO (FOTO: ROGÉRIO ASSIS/GREENPEACE)

“As invasões vão piorar”, diz Adriano Karipuna, liderança que tem enfrentado ameaças de madeireiros dentro de seu território. “Bolsonaro prega que índio não precisa de terra, que não trabalha, que é como animal num zoológico. Quem já tinha maldade para fazer isso está agora recebendo apoio”.

Uma liderança de Pitaguary, no Ceará, reforça que os ataques à comunidades indígenas explodiram desde que Bolsonaro assumiu a dianteira das pesquisas eleitorais, no final do ano passado.

“Uma liderança nossa levou um tiro. Um outro foi queimado por defender nossas terras. E agora vai piorar, porque as demarcações foram para outro lugar. Quem vai nos defender?”

“Quando Bolsonaro vai para Rondônia e diz que não vai demarcar nenhuma terra indígena, e a terra está em disputa entre indígenas e grileiros, você acha que ele dá moral para quem?”, questiona Danicley de Aguiar, do Greenpeace.

Diante dos invasores, indígenas têm protegido suas próprias terras. Caso do povo Guajajara, do , que criou o grupo Guardiões da Floresta há oito anos, hoje com 120 integrantes. Em vídeo gravado pelos indígenas em dezembro de 2018, os ‘guardiões' dão sermão em madeireiros ilegais encontrados explorando recursos em seu território. “Não tenho nem ideia da quantidade de vezes  já expulsamos os madeireiros”, conta Tainaky, uma das lideranças da comunidade.

Legenda vídeo: Indígenas Guajajara ‘caçam' madeireiros ilegais e dão sermão nos invasores (Vídeo: Guajajaras)

O desmonte da Funai

Além do avanço violento de grupos locais inflamados pelas falas do então polêmico candidato e hoje presidente Jair Bolsonaro, as terras indígenas estão ainda mais frágeis devido ao desmonte da Funai.

A Funai foi dividida em duas: parte submetida à pasta da Agricultura e outra parte está sob comando do Ministério da Mulher, Família e . O maior problema é a sua retirada do Ministério da Justiça, que também abriga a Polícia Federal – órgãos responsáveis por, juntos, protegerem as terras e os direitos indígenas.

A articulação com a Polícia Federal, que já não era simples, demanda agora estreita sintonia entre os três órgãos do Executivo. A mesma regra vale para para a criação de novas terras. “As demarcações, que já estavam em marcha lenta, vão parar de vez”, analisa outro servidor ouvido pela reportagem.

“Não sabemos como será nosso trabalho sem o contato direto com a Polícia Federal”, questiona um servidor da Funai que não quis se identificar. “A articulação direta com a Polícia Federal e a Força Nacional não será mais possível”, concorda Andrea Prado, presidente da Indigenistas Associados (INA), que representa os funcionários da Funai e que, como o movimento indígena, defende que o órgão volte a estar submetido ao Ministério da Justiça.

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ADRIANO KARIPUNA, NO FÓRUM DAS NAÇÕES UNIDAS: “AS INVASÕES [DE TERRAS INDÍGENAS] VÃO PIORAR” (FOTO: LUIZ ROBERTO LIMA/GREENPEACE)

Tudo isso ocorre em meio a um cenário de intensa disputa pelo território. Cerca de 450 terras indígenas enfrentam ou enfrentaram nos últimos anos invasões e ameaças por parte de grileiros, madeireiros, garimpeiros ou posseiros, segundo dados do Instituto Socioambiental (ISA).

Jogo de empurra

Se, por um lado, o presidente prometeu não homologar nenhuma nova terra indígena, por outro, ele revelou em campanha forte discurso contrário a invasores de terras. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, também tem repetido que o novo governo não tolerará invasões de terra.

“Bandido é bandido, produtor é produtor e terra demarcada é terra demarcada. Nós não podemos incentivar o banditismo e grileiros, pois a lei está aí para isso e precisa ser cumprida”, declarou a ministra da Agricultura em entrevista à Globo News no último dia 17. “O não é uma republiqueta”, completou.

Por ora, as três pastas – Justiça, Agricultura e Direitos Humanos – ainda oferecem poucas explicações sobre como lidar e se articular diante das invasões de terras indígenas e fazem uma espécie de jogo de empurra.

Procurado pela Repórter Brasil, o Ministério da Agricultura não se manifestou com relação às recentes invasões de terras indígenas. O Ministério da Justiça disse que cabe à Polícia Federal atender aos pedidos de proteção feitos pelo Ministério Público Federal. E a Polícia Federal afirmou que nos casos elencados pelo MPF, “a proteção ou repressão de eventuais ataques deverão ser acompanhados por estes órgãos policiais [polícias militares]”. Em nota, o órgão informou ainda se reuniu em 29 de janeiro “com indígenas, representante do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, presidente da Funai e governo de Rondônia, para colher informações mais precisas dos fatos”. Leia aqui íntegra da resposta.

As ações, no entanto, não dão conta do problema. Apenas em Rondônia, além dos Karipuna, outras duas terras indígenas estão invadidas ou sendo ameaçadas, as do povo e Karitiana. No Pará, são pelo menos cinco homologadas somente na região de Altamira, segundo informações da Funai: Arara, Koatinemo e Trincheira Bacajá, invadidas nos últimos meses de 2018. Além das Terras Apyterewa e Cachoeira Seca, que têm problemas antigos, nunca resolvidos.

TI Tremembé Iago Batista

OS TREMEMBÉ, NO CEARÁ, TAMBÉM DENUNCIAM AS CONSTANTES AMEAÇAS (FOTO: IAGO BATISTA)

Os problemas se repetem no Maranhão (terras indígenas Araribóia, Awa e Caru), na terra Pankararu, em Pernambuco, na terra Tupiniquim, no Espírito Santo, na terra Kadiweu, que segue ocupada por pecuaristas no Mato Grosso do Sul, onde grande parte das terras não está regularizada – um problema que se arrasta por décadas.

Cerca de 220 ameaças às comunidades indígenas no país são feitas por fazendeiros e pecuaristas, enquanto outras 207 são relacionadas à madeireiros e 139 ligados à posseiros, segundo monitoramento do Instituto Socioambiental. O banco de dados, apesar de registrar conflitos intermitentes, dá uma ideia da dimensão do problema.

Houve aumento de 62% nos registros de invasões e exploração ilegal de recursos naturais em comunidades indígenas – homologadas ou não – entre 2016 e 2017, de acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), que deve divulgar em abril os dados de 2018.

Além de ameaçarem e atacarem os indígenas, os invasores estão destruindo extensas áreas de mata. O povo Uru-Eu-Wau-Wau gravou um vídeo onde se veem grileiros, área desmatada e grandes picadas na floresta. Um dos invasores diz, na gravação, que chegariam outras 200 pessoas. Em outubro de 2018, o sistema de monitoramento do Instituto Socioambiental encontrou 42 focos de desmatamento apenas nesta terra indígena.

‘Invasores enfrentam os Karipuna com foices'

“O pessoal está sem medo de entrar na nossa terra”, afirma Adriano Karipuna, liderança indígena na Terra Indígena Karipuna, em Rondônia. Ele relata que, há duas semanas, seus parentes encontraram cerca de 20 invasores na estrada com foices e motosserras.

Captura de Tela 2019 02 08 a%CC%80s 17.48.40MAIS DE 8 MIL HECTARES FORAM DESMATADOS NA TERRA KARIPUNA, EM RONDÔNIA, NOS ÚLTIMOS 4 ANOS (FOTO: ROGÉRIO ASSIS/GREENPEACE)

Mais de oito mil hectares foram desmatados nos últimos quatro anos no território dos Karipuna, segundo o Greenpeace. A última invasão veio também com ameaças. Após o Natal, Adriano ouviu um alerta de um conhecido: “Avisa que o pessoal vai dar sumiço no Adriano e no irmão dele”.

Diante dos crescentes ataques e invasões às comunidades indígenas, o Ministério das Mulheres, da Família e dos Direitos Humanos enviou na semana passada uma  comitiva encabeçada pelo presidente da Funai, general Franklimberg Ribeiro de Freitas, pelo estado de Rondônia para apurar as denúncias feitas pelo Ministério Público Federal.

A Polícia Federal também apreendeu, na terça-feira (23), tratores usados para desmatamento e roubo de madeira em áreas vizinhas à Terra Indígena Karipuna. Três pessoas são investigadas pelas ações criminosas. Após a ação da Polícia Federal, os intrusos desapareceram. “Por enquanto não tem ninguém mais, mas amanhã pode entrar de novo”, pondera Adriano.

ANOTE:

Fonte: https://www.cartacapital.com.br/carta-capital/ao-menos-14-terras-indigenas-estao-invadidas-hoje-numero-deve-ser-maior/

 


 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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