7 de setembro: pluralidade e fim do cativeiro

Após o sequestro bolsonarista do Dia da Independência nos últimos anos, a celebração volta com Lula resgatando a importância da unidade dos brasileiros na construção da Nação

A história do 7 de setembro é uma narrativa de sequestros políticos, desde sua origem. A data que foi criada para agradar a província dos ricos barões paulistas, já foi um desvio do 12 de outubro em que o povo aclamou o imperador, no Rio de Janeiro. No entanto, muito antes desse protagonismo singular da nobreza, a pluralidade do povo brasileiro já lutava ferrenhamente pela libertação de Portugal, em guerras civis espalhadas pelo país que foram silenciadas pela monarquia.

De lá pra cá, o sequestro mais recente se deu durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), que transformou a data num ato antidemocrático e numa plataforma eleitoreira. Um movimento personalista que remete as celebrações dos tempos da ditadura militar, outro sequestro autoritário. Grande parte do país não se viu representada nos eventos do Bicentenário da Independência, marcados por ataques a agentes e órgãos dos Três Poderes, além do próprio processo eleitoral. 

Passado esse período obscuro, em que se ameaçava a República de golpe militar a cada 7 de setembro, a expectativa sobre esta quinta-feira de 2023 é enorme. A ideia do novo governo é reafirmar o caráter democrático do país, sua soberania restaurada após anos de isolamento e submissão a potências estrangeiras, e pacificar e unir o povo que ainda se percebe polarizado em extremos ideológicos.

Como disse Lilia Schwarcz, uma das autoras de O Sequestro da Independência – Uma história da construção do mito do Sete de Setembro, escrito em parceria com o historiador da arte Carlos Lima Junior e a antropóloga Lúcia Klück Stumpf, a sociedade brasileira tem maturidade e deve mostrar como a festa da Independência tem de ser uma festa da sociedade civil. 

“Era assim desde o começo da República, com banda, crianças desfilando, balões, piqueniques das famílias nos parques. A sociedade deve retomar, ocupar seu lugar nesse dia de festejos nacionais e festejos da soberania da sociedade civil, ou seja, a Independência não é uma festa militar, tem de ser uma festa civil”, defende ela. 

No entanto, é difícil dissociar a data dos desfiles militares, assim como a necessidade de pacificar a relação entre a sociedade brasileira e as Forças Armadas, mergulhadas em controvérsias durante o Governo Bolsonaro.

Pronunciamento de Lula

“O Brasil voltou a sorrir.” Em seu pronunciamento de véspera do desfile, em cadeia nacional de rádio e TV, o presidente Luis Inácio Lula da Silva dá a deixa para o clima que deve emanar das celebrações nacionais. Ele menciona uma melhoria geral no estado de ânimo do país, indicando que o Brasil está vivendo um período de otimismo, devido o crescimento econômico associado à inclusão social e à redução das desigualdades como conquistas do governo. “A melhoria do cenário econômico se traduz em mais oferta de empregos e melhores empregos para todas as profissões e classes sociais.”

Mas o tom central do discurso, que norteia o clima no Dia da Independência, é a união do povo brasileiro em contraste com o clima de ódio e extremismo vivido em 2021. O chefe do Executivo brasileiro declarou que a data serve para lembrar que o país é um só, uma “grande nação”, apesar das diferenças socioculturais e políticas em todo o território.

“Por isso, amanhã não será um dia nem de ódio, nem de medo, e sim de união. O dia de lembrarmos que o Brasil é um só. Que sonhamos os mesmos sonhos. Que podemos ter sotaques diferentes, torcer para times diferentes, seguir religiões diferentes, ter preferência por este ou por aquele candidato, mas que somos uma mesma grande nação, um único e extraordinário povo. Em apenas oito meses, recolocamos o Brasil no rumo da democracia, da soberania e da união. Do desenvolvimento econômico com inclusão social”.

A reafirmação da democracia comparece no discurso como base para alcançar objetivos e sonhos. ”A democracia é a matéria-prima para a realização dos nossos sonhos.”

Num recado ao nacionalismo tacanho e falso defendido pelo governo privatista e devastador de Bolsonaro, o discurso aborda a soberania como a proteção dos interesses nacionais em diversas áreas, além da segurança territorial. “Soberania é mais do que cumprir a importante missão de resguardar nossas fronteiras terrestres e marítimas e nosso espaço aéreo.”

“É também defender nossas empresas estratégicas, nossos bancos públicos, nossas riquezas minerais e fortalecer nossa agricultura e nossa indústria. É preservar a Amazônia e os demais biomas. Nossos rios, nosso mar, nossa biodiversidade”.

Ele também destaca a importância do diálogo e da busca pelo entendimento entre diferentes setores da sociedade e instituições políticas. “O entendimento voltou a ser palavra de ordem.”

Lula não deixou de falar de suas prioridades para transformar o país, partindo do recém anunciado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que começa com milhares de obras de escolas pelo país. ”Com o Novo PAC, a educação voltará a ser prioridade, com investimentos da creche à pós-graduação…”

Com isso, Lula enfatiza os avanços e conquistas do governo em áreas como crescimento econômico, inclusão social, educação e diálogo entre diferentes partes da sociedade. 

Ao longo do pronunciamento, o presidente destacou os pontos positivos da nova gestão, como a lei de igualdade salarial entre homens e mulheres, reajuste salarial dos servidores públicos federais, crescimento do salário mínimo acima da inflação e aumento do valor voltado para a alimentação escolar.

Fonte: Portal Vermelho Capa: Reprodução 


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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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