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Estrada

Estrada

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Existem dias que o coração retumba toque de macumba em ritmo tão forte que a dor exalta como agora das veias com pulsadas dolorosamente fartas. São gritos da alma: fartas-faltas bem-amadas de mim em sua falta…

Por Reinaldo Bueno Filho

A saudade é um lugar comum agora. A memória, sua casa amada agora se enche de orgulho, de amor, de histórias e causos tantos. De vida. Tantas vidas. Sempre – agora, e na infalível memória.

É estrada em instante de breu, estrela em céu nublado, brilho da memória, ou um memorial astuto. É falta de minha ancestral. Mas, a Professora ainda ensina, sempre ensinou. A vida era sua mais confortável sala de aula. Essa aula, a própria vida, nunca foi simples. Nem seria. E creio que nunca um dia chegue a ser fácil qualquer vida, mas, muito mais: nem mesmo quero que seja.

Aprendi a amar o passado como quem ama o futuro ou o presente. O tempo verbal é detalhe para exímio poetizar. A memória estuda a saudade inquieta com suas linhas brilhantes de velar: o tempo sempre foi de amar, lutar, superar, e ainda que é saber esperar… O luto. Esquecer, não. É memória valiosa: “Esquece não”. Existe amor em cada inflexão, em cada reflexão. Fez boa escola.

Dê-se, minha mãe, para a quintessência, longa Estrada, estirada em caminho guiado: há Estrela em céus a desanuviar. Ou seria elevar? Admiro A Estrela do Oriente em seu olho através de minha memória cansada e salgada, vejo sem ver a roda da Graça, às Graças, rodeando até mesmo um pouco de pólvora ao povo; ou, para mim, amor sempre e sempre de novo.

Revejo no pensamento o encanto de seu Ouro disposto em filosofia a buscar tudo transformar – pedra encantada – professora, sempre, certa, certeira. Aos montes e às estradas. Às Estrelas. Admiro o céu que vivia aberto em seu peito de desbravar. E eu que tanto aprendi ao observar seus dias, agora ainda aprendo ao pensar me em seus dias. Ícaro nunca me veio… À Estrada: céu seu, em horizonte e dentro do peito – abre alas para seu carro-chefe alegórico perfeito, na Lapa, no Pelô, no mundo ou no além-mundo. É sua filosofia a transformar mais. Caminhar mais.

Os Orixás e todas as entidades mais a abençoariam. Deus o faria também. Aos pagãos, a sã ciência acolheria sua vida em propósito cumprido. A sua Estrela é Guia. Guia sua Estrada. Ora aluna, professora, coragem, luta… Quanta batalha. A magia não falha e a Estrada também é seu lugar – sempre foi e sempre será. É do amor em Cora, uma vida sua também ao pé do borralho, uma de tantas Vidas suas, talvez, acocorada. Benzia, curava. Amaldiçoava, chorava, ria, caía, levantava e lutava. Quanto orgulho da poesia que fez versos doces de amargas frutas. Venceu muito mais que uma única última batalha.

Admiro, como filho, e aluno curioso também, seu olhar protagonista. Às vezes por demais goiano, mas sempre do Mundo. Seu Mundo. Agora mais além dele. O menino talvez não fala, mas sente, pensa e age. Ensinamentos seus. Seguir a caminhar como Estrada, em fé e com fé, assim como me foi ensinado pela Mater, Matriarca, Mente-Mantea-Mãe amada. Salve. E voe em encontro dos seus tantos sonhos além-mundo mandado. Tem o infinito, mãe minha. E minha infinita saudosa e amorosa memória.

Obrigado pelo privilégio de ser filho seu, cria sua. Com tanta Bravura. Estradas e Estrelas são nosso lugar comum em amor e encantos de amar. Em aprendizados, tantos ainda! “Amar enche a vida”, escutei mais baixo do que gostaria, mas, guardei. Amo a senhora. Para sempre. E sigo como sempre me pediu: caminhando em passos curtos e ritmados, retumbados, encantados. E evoluindo: “Peça bença e faça das Virtudes seus Guias; são as Guias de maior força para caminhar. É Magia”.

Somos da mesma constelação, e minha memória sempre vai admirar a sua Estrela brilhando. E que as Estradas e o Caminhar, em tantos planos e ideias, sejam como aqui: chão para aprender o quão mais for em transcendentalidade. Ser aluno e ao mesmo ensinar é a dádiva divina e encantada dos nossos espíritos também encantados. É encantaria, é uma saudade, uma memória, uma estrada que há de se encontrar ainda. É seu todo universal. Uma vez mais, com amor à eternidade que você apreendeu precocemente: obrigado por tudo que de conhecimento foi deixado. Sua estrada inspira e a estrela é sempre guia. “Con amor, para mi mamá un regalo poético cósmico”. Gracias.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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