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Estudo lista ameaças aos povos tradicionais do Tapajós

Garimpo, hidrelétricas e agropecuária: estudo lista ameaças aos povos tradicionais do Tapajós

Mapeamento Sociocultural, Econômico e Ambiental do Tapajós tem objetivo de contribuir com o conhecimento sobre a bacia. Uma área superior à do estado de Santa Catarina foi desmatada ao longo dos últimos 30 anos na bacia do Tapajós, localizada entre os estados de Mato Grosso, Amazonas e Pará e que figura hoje entre as mais ameaçadas da Amazônia brasileira.

Por WWF-Brasil 

No período, 10 milhões de hectares de florestas nativas deram lugar a cidades, pastagens, garimpos, plantios de grãos como a soja e grandes obras de infraestrutura, em um avanço muitas vezes violento sobre áreas ocupadas por povos indígenas e populações tradicionais.

Este cenário de diversidade e conflitos é o foco do Mapeamento Sociocultural, Econômico e Ambiental do Tapajós, relatório inédito lançado nesta terça-feira (14). O documento é resultado do projeto Amazônia Indígena: Direitos e Recursos (AIRR) busca melhorar a participação dos povos indígenas no desenvolvimento econômico da Amazônia, fortalecendo a conservação da Natureza e reduzindo a perda de florestas. No Brasil é implementado por COIAB, FEPIPA, FEPOIMT, ICV, OPAM, WWF-Brasil e NESsT, com o apoio da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).

Segundo as entidades, o objetivo do trabalho é contribuir com o conhecimento sobre a região e, com isso, promover o protagonismo dos povos tradicionais na tomada de decisões que envolvem o seu futuro.
“O apoio ao fortalecimento institucional das organizações indígenas é importante para a sobrevivência delas. E é também essencial para a autonomia e o protagonismo dos povos indígenas, que têm o direito de debater e decidir sobre o uso de seus territórios”, diz trecho do documento.

Para Alice Thuault, diretora executiva do ICV, é preciso “falar sempre mais do Tapajós, bem como é preciso ouvir sempre mais os seus povos”. “Eles são parte da solução do grande desafio da nossa geração: a mitigação das mudanças climáticas”, afirma.

Importante ressaltar que as informações dispostas no mapeamento destacam dados das regiões do médio e alto rio Tapajós, locais principais de atuação do projeto Amazônia Indígena: Direitos e Recursos (AIRR).

Fronteira agrícola

Além da redução da floresta, o documento aponta a expansão da fronteira agropecuária, representada pelo aumento de 6,5 milhões de hectares de pastagem e outros 4,4 milhões de hectares destinados à agricultura. Só na área destinada à cultura da soja, por exemplo, houve um aumento de 6.182%

“Os agrotóxicos usados nas grandes plantações da região são uma enorme ameaça socioambiental, pois eles provocam danos à saúde humana, atrapalham o desenvolvimento de cultivos de pequenos produtores, poluem rios e intoxicam peixes”, diz trecho do mapeamento.

Hidrelétricas

Ao menos 44 grandes usinas hidrelétricas (UHEs) com potência superior a 30 megawatts estão sendo planejadas para a bacia do Tapajós. Conforme o documento, esta é a maior ameaça ecológica para a região e tem o objetivo de atender ao agronegócio e aos grandes centros urbanos do país.

Uma delas é a UHE Chacorão, que se concluída inundaria 18,7 mil hectares da Terra Indígena Munduruku. No mesmo sentido, a UHE São Luiz do Tapajós, se construída, inundaria as zonas rurais dos municípios de Itaituba e Trairão, ambos no interior do Pará.

“Decisões judiciais desfavoráveis às barragens são, muitas vezes, revertidas com a justificativa de que a paralisação de suas obras causaria danos à ‘economia pública’. Portanto, elas tendem a ser liberadas mesmo com graves violações ao meio ambiente e às pessoas locais.”

Garimpo 

O Tapajós possui a maior concentração de garimpeiros em toda Amazônia brasileira. Somente em Itaiuba, no Pará, estima-se que existam mais de 27 mil pessoas trabalhando em mais de 2 mil pontos. Mais da metade desses locais são consideradas ilegais por estarem inseridos em Terras Indígenas e Unidades de Conservação.

documento destacou que a atividade traz graves impactos para as populações locais, em especial aos indígenas, que sofrem com a invasão de seus territórios, o aumento das doenças infectocontagiosas, a destruição dos recursos hídricos e o desmatamento.

Um estudo recente da Fiocruz em aldeias do povo Munduruku constatou que 60% dos participantes apresentavam altos índices de contaminação por mercúrio, substância que em alta concentração afeta gravemente a saúde humana.

Nove de 57 crianças indígenas submetidas a testes clínicos apresentaram problemas de neurodesenvolvimento.

Territórios e povos

A bacia do rio Tapajós é localizada em 74 municípios nos estados de Mato Grosso, Pará, Amazonas e Rondônia. Com 500.000 km² de extensão, representa quase 6% do território brasileiro. Seus principais afluentes são os rios Jamanxim, Teles Pires e Juruena.

Ao menos 1,8 milhões de pessoas residem na extensão da bacia, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Em seu território estão presentes 11 Unidades de Conservação de proteção integral, 19 Unidades de Conservação de uso sustentável e 34 Terras Indígenas.

A presidente da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt), Eliane Xunakalo, destacou que o mapeamento é um instrumento científico reconhecido que deve ser utilizado para conquistar mais investimentos para os territórios.

“E principalmente para que nós possamos barrar todas as ameaças que hoje estão em volta no nosso território, e por vezes já estão dentro. Então é uma junção do conhecimento científico do não indígena com o conhecimento tradicional. O documento mostra o quanto é importante investir nas nossas potencialidades e combater nossas fragilidades”.

Já a secretária executiva da Federação dos Povos Indígenas do Pará (Fepipa), Eli Tupinambá, explicou que é muito importante ter esses dados para pensar ações de proteção e fortalecimento dos povos tradicionais da região.

“Então a gente vai saber onde está tendo a retirada ilegal de maneira, em que lugar o garimpo está ainda, onde a violência opera. Tudo isso acontece dentro do território. Sem contar que isso é produção para estudos no futuro e para ter uma base muito clara de como estão os territórios de verdade”.

Fonte: WWF Brasil. Foto: Mancha de sedimentos no rio Tapajós- Observatório do Clima/Divulgação. Este artigo não representa a opinião da Revista e é de responsabilidade do autor.


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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