Procura
Fechar esta caixa de pesquisa.

Com continuidade da seca, estratégia de emergência é montada para salvar botos

Com continuidade da seca, estratégia de emergência é montada para salvar botos

São esperados pelo menos mais sete dias de seca e redução do nível do Lago Tefé. Cerca de 10% da população local de botos já foi perdida. 

Por Cristiane Prizibisczki/O Eco 

Com a previsão de que a seca que assola o Lago Tefé, interior do estado do Amazonas, deve continuar pelos próximos dias, pesquisadores e voluntários da força tarefa montada no local para salvar botos afetados pelo superaquecimento e redução do nível da água preparam estratégias de emergência para deslocar os animais dos trechos mais críticos.

Até o momento, 153 botos já morreram, o que representa cerca de 10% da população local. 130 dos animais que pereceram eram botos cor-de-rosa (Inia geoffrensis) e 23 da espécie tucuxi (Sotalia fluviatilis). Em todo o lago, a população das duas espécies não passa de 1500 indivíduos.

Durante o final de semana, um grupo de botos que estava na enseada de Pacucu, trecho do lago Tefé onde o nível da água chegou a 50 centímetros, foi deslocado para partes mais fundas e frias.

Emergencia Botos 03 10 Miguel Monteiro 9
Foto: Miguel Monteiro/Instituto Mamirauá

Segundo Miriam Marmontel, líder do Grupo de Pesquisa em Mamíferos Aquáticos Amazônicos do Instituto Mamirauá, que está à frente das operações no local, o deslocamento foi feito de maneira que impactasse o mínimo possível os animais.

Para isso, adaptações foram feitas em uma tradicional cerca de varas usada localmente, chamada de “pari”, para isolar os pontos de acesso dos botos. Depois, os animais foram conduzidos aos locais mais fundos usando uma rede de pesca.

“Nós pensamos primeiro em passar um arrastão, empurrando os animais para fora dali. Finalmente nós desenhamos uma cerca de varas, adaptada da cerca tradicional que eles usam, e com a rede fomos lentamente, fazendo zigue-zigue, conduzindo os animais para fora”, explica a pesquisadora.

A translocação via barco, cogitada no início da mortandade, em 23 de setembro, foi descartada, devido à dificuldade da operação e impacto nos animais.

“Foi um experimento que fizemos, porque a translocação, agora que está mais ou menos descartada a doença infecciosa, não seria possível fazer, seria uma operação de guerra”, disse.

Segundo a pesquisadora, pelo menos 21 organizações de todo Brasil e do exterior estão envolvidas na força tarefa de salvamento dos botos em Tefé, incluindo o Fundo Internacional para o Bem Estar Animal (IFAW), que é especializada em resgate e reabilitação de cetáceos, incluindo grandes encalhes em massa. 

Com a previsão de continuidade da seca e redução do nível das águas por pelo menos mais sete dias, pesquisadores e voluntários se preparam para novas ações de deslocamento – como a que foi realizada na enseada de Pacucu – e até mesmo operações de translocação, nas quais os botos serão levados de barco para o rio Solimões.

“A gente está preparado, porque o conceito funcionou, o pari [cerca de varas] funcionou, a rede funcionou, vimos que a gente consegue tirá-los, conduzi-los para fora dali, se for necessário. Se chegar ao ponto de secar tão rápido, que eles fiquem presos, e mesmo ali nos poços internos, fique prejudicial para eles, aí nós vamos ter que remover”, explicou a pesquisadora.

Cerca de 100 pessoas trabalham no local diariamente nas ações de resgate de carcaças e realização de necropsias (setor Operação Mortos), monitoramento da água, peixes e fitoplanctons (Setor Operação Ambiental) e monitoramento dos animais vivos (Setor Operação Vivos).

Causa da morte

Desde o inícios das mortes, no dia 23 de setembro, o grupo de pesquisadores da força tarefa montada pelo Instituto Mamirauá tenta descobrir as causas da mortandade em massa.

Emergencia Botos 14 10 Miguel Monteiro 3 1 scaled 1
Foto: Miguel Monteiro/Instituto Mamirauá

Após análises de sangue e tecidos em laboratórios do Rio de Janeiro e São Paulo, já foi possível descartar doenças infecciosas por vírus ou bactérias (Toxoplasmose, Clostridium, H4N1 e morbilivirus) e contaminações por biotoxinas.

Segundo Marmontel, as necropsias e exames nos tecidos também não apontaram nada de anormal.

“Nesse momento, cada vez mais se configura que o grande vilão dessa história foi a alta na temperatura, o calor demasiado naqueles dias específicos [quando o maior número de mortes ocorreu]”.

De acordo com a pesquisadora, por falta de estudos na área, não é possível dizer exatamente como o calor afeta a biologia dos botos. O que se sabe é que o corpo desses mamíferos aquáticos se comporta de forma semelhante ao corpo humano em situações de estresse de calor.

“Vários sintomas que afetam o corpo humano a gente também viu nos botos”, disse

Entre os dias  23 e 29 de setembro, a água do lago Tefé chegou a 40ºC. A temperatura mais alta que havia sido historicamente registrada foi de 32ºC. Atualmente, a temperatura da água no local tem variado entre 29 e 37ºC, diariamente.

“Ainda que não bata lá nas alturas, essa variação de 10ºC é muita coisa para um corpo suportar. Obviamente que traz alguma implicação fisiológica”, explica.

Cristiane PrizibisczkiJornalista. Fonte: O Eco. Foto: Miguel Monteiro/Instituto Mamirauá.

[smartslider3 slider=43]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

PARCERIAS

CONTATO

logo xapuri

posts relacionados

REVISTA