Cerrado: um berçário de fósseis
Fóssil é uma palavra oriunda do latim, que atualmente pode ser entendida como todo resto orgânico, ou evidência direta de sua existência, cuja idade limite é o início do Holoceno, ou seja, 11 mil anos A.P. Os fósseis são objeto de estudo da paleontologia e possuem inúmeras variações, desde indivíduos minúsculos, como pólens, foraminíferos ou estruturas como os estromatólitos, que foram os primeiros fabricantes de oxigênio, até vertebrados gigantes.
Por Altair Sales Barbosa
Para que haja a fossilização torna-se necessário um conjunto de fatores que permita a ocorrência da diagênese, que é a silicificação ou mineralização das partes orgânicas. Mas há outras formas de preservação sem que haja diagênese. Um inseto preso num âmbar ou um ser orgânico preservado dentro de um bolsão de petróleo são exemplos de fossilização natural sem que haja diagênese. De modo geral, a mumificação não se trata de fossilização, mas sim de um fenômeno cultural.
Mudando um pouco a rota do raciocínio, nossa educação superior se sustenta no fato de que não se fazem pesquisas porque não tem laboratórios. Ou simplesmente acreditam que o pesquisador é aquele que possui um título de mestrado ou doutorado e que investe muitos recursos [em pesquisa]. Na maioria dos casos, o resultado é negativo. Isso porque para ser pesquisador são necessários apenas três requisitos básicos: senso de observação, criatividade e vocação.
Claro que o laboratório é um suporte de peso. Mas, como sempre digo, se prendermos um pesquisador em uma sala vazia, ele sempre acha algo para investigar, diferentemente de outros, que acabam em depressão. Se ao senso de observação, criatividade e vocação se juntar a titulação, melhor ainda.
Vou citar um exemplo de laboratório vivo, que pode abrir a porta de vários horizontes. Quase todos os dias cruzo o Rio Meia Ponte, em Goiânia, e fico observando que, em época de chuva abundante, sempre se formam pequenas lagoas marginais, geralmente afastadas uns cem metros do leito principal do rio.
Observo também que quando as lagoinhas pouco profundas têm água, há sempre um bando de garças se alimentando de pequenos peixes e outros animais. Também observo que, às tardezinhas, um ou outro pescador solitário fica no local arriscando a sorte. Quando o período de chuva é mais prolongado ou mais abundante, vejo que as pequenas lagoas se mantêm perenes por período mais longo.
Passado algum tempo, vem o tempo da seca e imediatamente essas pequenas lagoas desaparecem, deixando exposta a superfície de um solo argiloso todo trincado. Quando se peneira ou escava essa terra, sempre se encontram, preservados, esqueletos de peixes, anfíbios, e até aves.
Claro que esse material não se classifica como fósseis, mas representa a fauna que habitava o local até a bem pouco tempo. E, acima de tudo, mostra como se dá o processo de fossilização, servindo, assim, como um laboratório para aqueles que estudam Geociências e Biologia.
Mas o local pode ir além dessas informações e se constituir um espaço onde inúmeras pesquisas possam ser desenvolvidas. Por exemplo, um professor, juntamente com seus alunos, pode aprofundar as escavações na área através de um corte estratigráfico pequeno, de 2 x 2 metros e, nesse local, desenvolver suas aulas práticas, utilizando metodologias trabalhadas pela Paleontologia, Arqueologia, Geologia, Geografia etc.
Aprofundando a escavação além do superficial, os professores e alunos irão encontrar material mais antigo, além de entenderem os processos de sedimentação ocorridos na área. Eles irão encontrar ossos de peixes e outros animais, fossilizados ou não, e comparando-os com os restos atuais, poderão constatar se houve modificação faunística no período.
Também poderão entender a dinâmica do rio, colher sedimentos, datá-los e efetuar análises polínicas, com o objeto de constarem se houve mudança na vegetação no decorrer do tempo.
Dessa forma, salientando apenas alguns pontos de uma lagoa marginal, pode-se demonstrar que um local com essas características pode ser transformado em um grande arquivo de pesquisas, que guarda informações importantíssimas de âmbito regional, mas que também pode demonstrar fenômenos globais.
Assim, para que tudo isso ocorra, o professor deve ser valorizado em todos os aspectos, com incentivo, recursos e motivação. Isso porque a motivação é a mola mestra da criatividade e, sem nenhuma sombra de dúvida, a antessala da alienação.
Altair Sales Barbosa–Arqueólogo. Antropólogo. Sócio-Titular do Instituto Histórico e Geográfi co de Goiás. Pesquisador do CNPq. Conselheiro da Revista Xapuri desde dezembro de 2014. Pesquisador convidado da Universidade Evangélica de Goiás.
PESQUISADORES LOCALIZM FÓSSIL QUE PODE TER 12 MIL ANOS
Por Carla Oliveira/PUC-GOIÁS
O fóssil encontrado nas escavações do sítio arqueológico de Serranópolis, onde pesquisadores da PUC e de mais sete instituições do Brasil e do exterior realizam escavações desde outubro de 2021, pode ser o mais antigo já encontrado no Centro-Oeste.
Sua idade pode chegar a 12 mil anos. Isso porque amostras de carvão coletadas aos pés do esqueleto já foram analisadas e datadas com idade entre 11.930 e 11.756 anos. O carvão, possivelmente, fazia parte de uma fogueira, entre as várias já encontradas no local.
De acordo com o pesquisador do Instituto Goiano de Pré-História e Antropologia (IGPA) da PUC Goiás, prof. Julio Cezar Rubin de Rubin, as escavações no local foram retomadas em 2021. No ano passado, já havia sido anunciada a localização de 10 crânios, algo inédito para a região. Os achados ampliam a quantidade e a qualidade do trabalho em Serranópolis e das informações para a comunidade acadêmica. Rubin de Rubin frisa que o local conta com uma variedade de dados físicos e químicos muito grande, o que é de grande relevância para o estudo.
O fóssil anunciado agora foi localizado ao dar prosseguimento a uma escavação de 9 metros quadrados e cerca de 1,90 metro de profundidade. O esqueleto, que está preservado, foi encontrado entre outubro e novembro de 2022, mas a descoberta só foi anunciada agora, após sua exumação, em março deste ano.
Segundo explica, a análise da amostra de carvão encontrada aos pés do fóssil foi realizada em Miami (EUA). O próximo passo, agora, é fazer a datação do próprio fóssil, também em Miami, onde todos os outros materiais localizados foram analisados. Em Serranópolis, já foram encontrados diversos artefatos.
A pesquisa conta com a participação de 20 profissionais, do Brasil e do exterior, e mais 10 alunos de graduação da PUC Goiás, dos cursos de Arqueologia e Biologia. O trabalho, retomado após décadas, conta com financiamento do Conselho Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) e da PUC Goiás.
O sítio arqueológico de Serranópolis é objeto de estudo de pesquisadores desde a década de 1970, quando os professores Pedro Ignácio Schimitz e Altair Sales Barbosa. Suas pesquisas continuaram até a década de 1990, chegando a pesquisar 33 sítios.