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Morreremos com as abelhas

Morreremos com as abelhas

Morreremos com as abelhas

As abelhas estão sendo dizimadas por agrotóxicos, mas é ele que mantém o PIB do Brasil – diz a propaganda na TV.A tragédia do extermínio de abelhas por agrotóxico em São José das Missões (RS) me conduz a uma indagação intrigante: vale a pena morrer pela bandeira do agronegócio? Pela soja, especialmente?

Por Nilton Kasctin dos Santos/Brasil de Fato
 
Vamos situar a questão. Por causa da propaganda intensa dos grandes produtores de soja e empresas que fabricam e vendem adubos químicos, agrotóxicos e sementes, a sociedade passou a acreditar que esse tipo de produção perversa de grãos para exportação é fundamental para a economia do País.
A sociedade inteira não vê a cor do dinheiro da produção de soja, mas tem certeza de que o Brasil vai quebrar se adotarmos uma forma de cultivo agrícola sem veneno. Isso se chama lavagem cerebral. Todos acreditam piamente que tem que ser assim, porque assim diz a propaganda do agronegócio.
As pessoas nunca se preocuparam com a comida da sua avó, mas agora se preocupam com a alimentação do povo chinês. O Brasil precisa alimentar o mundo, dizem em coro.

O sistema perverso de produção agrícola monocultural do Brasil, que destrói a vida planetária e enche o bolso de poucos fazendeiros e empresários do ramo, pode custar-nos a vida, mas não tem outro jeito, dizem as pessoas comuns. E as autoridades políticas também.

As abelhas estão sendo dizimadas por agrotóxicos, mas o agronegócio é o que mantém o PIB do Brasil, diz a propaganda da televisão. E a sociedade inteira. E por cima ainda é “tech”, “pop” e outras coisas que as pessoas gostam de ouvir, sem saber o que significam.

Estamos loucos. A ponto de morrer pela causa do agronegócio. Sim, porque se as abelhas desaparecerem, como já desapareceram ao redor da lavoura desse plantador de soja, toda a espécie humana será extinta. Em apenas quatro anos, diz a ciência. Acontece que são esses insetos que polinizam as flores de quase todos os alimentos vegetais que consumimos. Sem abelhas, não tem milho, soja, feijão, trigo, aveia, frutas etc.

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Segundo a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), apenas um plantador de soja, com apenas uma aplicação de veneno, causou a morte de 12 milhões de abelhas. A conta está errada. A Emater contabilizou só as abelhas mortas das duzentas caixas de produção de mel. Mas morreram todos os enxames de abelhas de ferrão existentes nas matas ao redor, num raio mínimo de seis quilômetros (área de voo das abelhas). Também morreram marimbondos, vespas, mamangavas, cigarrinhas, besouros, joaninhas e pulgões. Detalhe: nenhum desses bichos estraga soja; eles só se alimentam de néctar ou de seiva das plantas.

E morreram também as abelhas sem ferrão, como jataís, mirins, mandaçaias, irapuás, manduris, uruçus e muitas outras espécies.

Morreram em seus ninhos nos matos, a maioria sem ter visitado a lavoura envenenada, bastando que alguns insetos tenham levado pólen em suas patinhas ou néctar na vesícula melífera. Uma microgota levada por meia dúzia de abelhas contamina e mata toda a colmeia.

Então, pode colocar na conta funesta desse agricultor, não 12 milhões de vidas animais, mas bilhões e bilhões de seres preciosos para a nossa vida.

Estou falando de uma localidade pequena onde foram criminosamente aplicados agrotóxicos para insetos em uma pequena plantação de soja. Imagine o que está acontecendo por todo esse imenso território brasileiro, completamente tomado de soja.

É de chorar. Dá tristeza de verdade. Mas o mais triste é saber que isso parece ser apenas o começo. Porque o Presidente Bolsonaro garantiu aos ruralistas, em campanha, que, quando eleito, iria acabar de vez com a “indústria” das multas ambientais e simplificar a legislação no que interessa ao agronegócio, incluindo, obviamente, a liberação rápida de mais agrotóxicos.

Nilton Kasctin dos Santos é professor e promotor de Justiça de Catuípe.

Fonte: Brasil de Fato

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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