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AMAZONIZAR O MUNDO

AMAZONIZAR O MUNDO

Nacionalizar a Amazônia e ‘amazonizar’ o mundo é o caminho para o futuro

Que esse despertar da nossa sociedade continue no exercício de pautar ao invés de se deixar pautar, de integrar ao invés de excluir

Por Caetano Scannavino 
 
Lema do Grupo de Amazônico, rede de organizações e movimentos criada no marco da RIO-92, “nacionalizar a e amazonizar o ” sempre foi um desafio.

Nacionalizar no bom sentido, do resto do Brasil despertar para o bioma, compreender melhor suas realidades, desafios, culturas, potencialidades e oportunidades, sobretudo nosso centro formador de opinião, o eixo RJ-SP. Só que precisou cair uma chuva de cinzas por lá para Amazônia trancar a pauta nacional, formando a tal tempestade perfeita ajudada por um governo que enxerga até as árvores como inimigos.

Nunca antes nesse país se falou tanto de meio ambiente, de , das queimadas e das ONGs – sobre estas, vale dizer que jamais um presidente valorizou tanto o Terceiro Setor ao atirar de forma obcecada nelas, o que acabou se voltando contra ele, o efeito “bumerOng”.

Com a Amazônia em evidência, abre-se uma janela rara para ir além do mais do mesmo, para trazer ao debate socioambiental não apenas o que se perde como o que se deixa de ganhar. Até para sustentar essa mobilização no tempo, faz bem para alma refletir também sobre o que somos a favor, até porque por inércia acabamos mais no que somos contra.

Quem sabe assim nossa sociedade deixe de enxergar a Amazônia como um ônus onde só existem conflitos e desmates e perceba o bônus que tem nas mãos – uma região com quase 25 milhões de cidadãos brasileiros de expressiva diversidade sociocultural, de importância estratégica crescente em tempos de aquecimento global, do futuro com economias de baixo , acordos internacionais em torno da distribuição dos benefícios da biodiversidade e serviços ecossistêmicos.

Como o maior detentor dos ativos naturais do , ocupando mais de 60% do Bioma Amazônico, a responsabilidade que cabe chamarmos é ao mesmo tempo um prêmio que, se manejado de forma sustentada e includente, poderá garantir o nosso pé de meia e justificar que o Brasil, aquele “país do futuro” que ouvíamos na , chegou.

Taoquei?

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Nem tanto. Isso se continuarmos na vanguarda do atraso alimentando um embate raso e polarizado em torno de desenvolvimento x meio ambiente. Esse debate está errado. Ninguém é contra as facilidades da energia, dos transportes, da internet e outras tecnologias. Nem a favor do fim das florestas, mesmo quem planta (exceto aquele lado ogro do agro) – sem elas não tem água, sem água não tem agricultura.

Portanto, o debate necessário é sobre qual modelo de desenvolvimento que queremos, se para muitos ou para poucos, se para região ou só para fora, se só para agora ou para sempre, se para frente ou para trás.

Ao invés de brigar com os satélites ou minimizar os dados crescentes de da Amazônia, o que precisa trazer para mesa é o fato de termos devastado uma área equivalente a duas Alemanhas de florestas, para que 63% dela fosse ocupada por pastagens de baixíssima produtividade, com menos de um animal por hectare, e outros 23% fossem abandonados (Fonte: Embrapa e Inpe). Desmata-se para ficarmos ainda mais pobres, monetária e não-monetariamente. Não pode ser por aí.

Pouco se fala em politicas e incentivos nessas áreas agrícolas já consolidadas do bioma para se transitar do atual sistema para práticas mais modernas, eficientes e amigáveis ao meio ambiente, onde se produz mais com menos terra, menos desmatamento, menos pressão sobre as e Terras Indígenas. Se é para crescer, que seja para cima, até porque para o lado é caso de polícia no combate ao lucro fácil de especuladores e grileiros de terras.

Iniciativas de manejo racional que inclusive trouxeram maior lucratividade como as dos pecuaristas de Paragominas/PA ou dos sojicultores do Grupo de Agricultura Sustentável (GAS) deveriam ser regra, não exceção. Rumar nesse sentido já seria um passo para ordenar a agricultura de grande escala na região, como estratégia de redução de danos, pois já vimos que insistir focado em mais boi e soja como vetores de desenvolvimento para Amazônia é insano e insustentável.

Por outro lado, há caminhos no país líder em biodiversidade. Por exemplo, está mais do que na hora de alavancar a agenda da bioeconomia. Esta sim é uma atividade com vocação regional ao movimentar o manejo, a coleta e o processamento de produtos da floresta como o açaí, cacau, cupuaçu, castanha, andiroba, ucuuba e tantos outros, muitos ainda desconhecidos numa Amazônia onde a vem descobrindo uma nova espécie a cada dois dias (Fonte: MCTIC/Mamirauá/WWF).

Os frutos e amêndoas são beneficiados na forma de manteigas, polpas, óleos, essências, extratos, com alta demanda de mercado junto às indústrias de fármacos, alimentos e cosméticos. Além de grandes e médios, abrem-se espaços para os pequenos, incluem-se as associações e cooperativas comunitárias, os conhecimentos tradicionais são valorizados, e a floresta é conservada ao se demonstrar que ela em pé tem mais valor do que caída.

Há um potencial bioeconômico gigantesco ainda a ser explorado, com o desenvolvimento de tecnologias de ponta na ponta e investimentos para maior agregação de valor a estes produtos. Como bem lembra o cientista Carlos Nobre: “O grande potencial do Brasil é o potencial da biodiversidade, aí nos precisamos de uma indústria da biodiversidade, e de uma ciência e tecnologia que desenvolva esse potencial”. No vídeo, ele compara as experiências no Pará de produção do açaí (6.711 dólares por hectare) com a da soja (819 dólares por hectare).

Publicado originalmente no site de Carta Capital

Fonte: Envolverde

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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