“Assum Preto, cego dum zóio, num vendo a luz, ai, canta de dor”
É provável que você já tenha ouvido a música Assum Preto, composta por Luiz Gonzaga, descrevendo a maldade feita com uma ave passeriforme da família Icteridae, comumente avistada por todo o território brasileiro…
Por Eduardo Pereira
Retraado por grandes artistas brasileiros, como J. Borges e Henfil, o assum preto, também conhecido no Nordeste como graúna (derivado do tupi “guira-uma” = ave preta), no Maranhão como chico-preto, no Mato Grosso como arranca-milho, chopim e chupão, e nas outras regiões do Brasil como cupido, melro e pássaro-preto, é um pássaro muito aprecidado por seu canto.
Infelizmente, ainda existem regiões no Brasil onde os assum-pretos são vistos em gaiolas, cantando incessantemente. A razão para essa crueldade: diz-se que como o assum preto só canta durante a noite, os passarinheiros furam seus olhos com espinhos de laranjeira para que, em estado de escuridão eterna, “pra ele assim, ai, cantá mió”.
Embora essa prática seja largamente combatida por ambientalistas e amantes da natureza, infelizmente ainda hoje há relatos de graúnas, e também de sabiás, com os olhos furados por esse Brasil afora.
Confira a antológica letra contando a tragédia do assum preto, do mestre Luiz Gonzaga:
Tudo em vorta é só beleza
Sol de abril e a mata em frô
Mas Assum Preto, cego dos oio
Num vendo a luz, ai, canta de dor
Mas Assum Preto, cego dos oio
Num vendo a luz, ai, canta de dor
Tarvez por ignorança
Ou mardade das pió
Furaro os oio do Assum Preto
Pra ele assim, ai, cantá mió
Furaro os óio do Assum Preto
Pra ele assim, ai, cantá mió
Assum Preto veve sorto
Mas num pode avuá
Mil vez a sina de uma gaiola
Desde que o céu, ai, pudesse oiá
Mil vez a sina de uma gaiola
Desde que o céu, ai, pudesse oiá
Assum Preto, o meu cantar
É tão triste como o teu
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos oios meus
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos oios meus.
Eduardo Pereira – Sociólogo. Produtor Cultural. Conselheiro da Revista Xapuri.
ASSUM PRETO – FICHA TÉCNICA
Seu nome científico significa: do (grego) gnorimos = notável; e psar, psarus = estorninho; e do (guarani) chopi onomatopeia que faz referência ao canto desta ave. ⇒ (Ave) notável parecida com um estorninho.
Vale lembrar que a referência a aves europeias era comum, pois os ornitólogos que descreveram pela primeira vez estas espécies faziam associação e referiam-se às aves que conheciam no Velho Mundo.
Mede entre 21,5 e 25,5 centímetros de comprimento e pesa entre 69,7 e 90,3 gramas.É inteiro negro incluindo pernas, bico, olhos e penas, o que origina seu nome popular. Filhotes e jovens não possuem penas ao redor dos olhos. Trata-se de um dos pássaros de voz mais melodiosa deste país. A fêmea também canta.
Espécie sem dimorfismo sexual. É onívoro. Come frutos, sementes, insetos, aranhas e outros invertebrados. Aprecia o coco maduro da palmeira buriti. Apanha insetos atropelados nas estradas e aproveita restos de milho junto às habitações humanas ou desenterra sementes recém-plantadas.
É comum em áreas agrícolas, buritizais, pinheirais, pastagens e áreas pantanosas, plantações com árvores isoladas, mortas, remanescentes da mata. Sua presença está fortemente associada a palmeiras. Vive normalmente em pequenos grupos que fazem bastante barulho. Pousa no chão ou em árvores sombreadas.
Há quem confunda o passaro-preto com o atrevido chupim (Molothrus bonariensis), famoso por parasitar o ninho de várias espécies (ex.: tico-tico). Enquanto o chupim é elegantíssimo, esguio e traja cintilantes vestes de tom violáceo, o passaro-preto é negro e de porte mais avantajado, com bico mais alongado, fino e com sulcos (estrias) na maxila inferior.
O passaro-preto sabe nidificar e não se descuida da criação da ruidosa prole. No nordeste ocorre a subespécie (Gnorimopsar chopi sulcirostris), que é maior, medindo 25,5 centímetros de comprimento. Quando canta arrepia as penas da cabeça e pescoço. Um fato interessante é a interação de G. chopi e M. rufoaxillaris (chupim-azeviche) em especial durante alimentação e forrageio.
Excluindo-se a Amazônia, onde está presente apenas no leste do Pará e Maranhão, é encontrado em todo o restante do País. Encontrado também no Peru, Bolívia, Paraguai, Argentina e Uruguai.