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A loca de pedra.

A LOCA DE PEDRA

A loca de pedra. Antigamente, havia uma pedra que tinha um papagaio encantado, que três índios descobriram.

Por Ailton Krenak

Esses índios eram o capitão, o cacique e o pajé. Eles estavam procurando alimentos, quando viram uma pedra alta e foram lá vê-la.

Chegando lá, tinha um cipó dependurado na pedra. Eles subiram pelo cipó e a pedra ficou “baixa”.

Então, eles alcançaram a loca. Eles foram entrando, lá era muito grande, e no canto havia um papagaio.

Eles voltaram e chegaram no acampamento deles e falaram para os seus parentes que eles haviam encontrado um local mais seguro, que dava para esconder todo o povo do ataque dos brancos.

Todos os índios foram para a loca de pedra. Nessa época, não havia território indígena demarcado.

O local onde é hoje a aldeia Krenak era antigamente denominado Minhãn Rat. O governo entrou por Minhãn Rat e nomeou “Dallo” Cristino para reunir os índios da região neste local.

Desde menino, “Dallo” Cristino sabia falar Krenak. Ele saiu pela mata procurando os índios. Nesse momento, os índios já estavam fugindo dos brancos. Ele saiu pela mata e encontrou um dos índios e perguntou onde estavam os outros. O índio não disse nada, foi então até o capitão e contou que um KRAI estava procurando o local onde os índios se escondiam.

O capitão mandou o índio conversar com o “Dallo” Cristino e manda-lo ir até o esconderijo para conversarem. Quando ele chegasse perto da pedra, se ele estivesse com a polícia, era para ele assoviar; caso o chefe estivesse sozinho, era para ele chamar na língua indígena.

Como só foram o “Dallo” Cristino e o índio, o capitão foi ao seu encontro. Aí o chefe falou para o capitão que o governo mandou demarcar a terra, que era para os índios ficarem sossegados. Fez uma reunião com os índios de Panças e de Cuparaque para todos irem para Minhãn Rat.

Os índios também queriam ir para lá. Então o governo demarcou a terra que hoje se chama Krenak. 

Depois de um tempo, “Dallo” Cristino queria conhecer o antigo esconderijo dos índios. Eles contaram que se encontrava no local da pedra e que lá tinha um papagaio. Lá também tinha ossos de peixe, tatu, de muitas caças que provavelmente serviram de alimento para o papagaio.

O capitão morreu e o seu irmão assumiu o seu lugar. “Dallo” Cristino queria buscar o papagaio. Pegou uma gaiola e chamou dois índios, e seguiram, mas o irmão do capitão disse que eles iam perder a viagem. Mesmo assim, eles foram. Chegando lá́, a loca da pedra tinha “crescido”. Aí o índio falou:

—Takruk! (A pedra cresceu!)

Ailton KrenakAilton Krenak – “5 narrativas dos índios Krenak, os últimos Botocudos do Leste”, depoimento a Eduardo Ribeiro, em julho de 2020. Ilustração: resultado da pesquisa do ilustrador indígena Gustavo Caboco, do povo Wapichana de Roraima, para a matéria. Texto completo disponível em: Elastica Abril.

 
 
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revista 115

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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