A resistência das mulheres durante a ditadura
Mulheres que lutaram contra o golpe de 1964 foram torturadas e abusadas sexualmente nos porões da clandestinidade
‘Se o interrogatório é de longa duração, com interrogador ‘experiente’, ele te bota no pau de arara alguns momentos e depois leva para o choque, uma dor que não deixa rastro, só te mina”.
O depoimento é da ex-presidente Dilma Rousseff, uma das centenas de vítimas, entre homens, mulheres e crianças, torturadas pelo regime ditadura militar.
Contrariando os estereótipos de passividade e fragilidade, Dinalva Oliveira, Maria Amélia de Almeida, Edna Roland, Miriam Leitão, Diva Moreira,Helenira Resende, assim como outras mulheres, são exemplos de grandes lideranças que sofreram crueldade de torturas e até mesmo abusos sexuais no período sombrio da história brasileira.
A historiadora e jornalista, Fabiana Faria, conta que as mulheres não eram acusadas apenas de serem terroristas e militantes. O fato de serem mulheres ocupando um espaço público supostamente destinado aos homens, aumentava a intensidade de como eram tratadas pelo regime militar.
“Os militares tinham a ideologia de que a mulher tinha que ser humilhada e colocada em seu “lugar”. A tortura se iniciava com o psicológico, e chegando alvos de extremas violências sexuais”, afirma.
Muitas mulheres grávidas sofreram abortamentos forçados durante as sessões de tortura. Em outros casos, eram aplicados choques elétricos em seus órgãos genitais. Não bastassem as violências, foram também estupradas por vários agentes do estado. Até mesmo seus filhos foram condicionados a verem suas mães sendo torturadas
A ex-ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres no governo de Dilma Rousseff, Eleonora Menicucci, é um exemplo dessa atrocidade. Presa entre 1971 e 1974, ela e sua filha pequena [na época] foram torturadas na sede do Exército, em São Paulo.
“Um dia, eles me levaram para um lugar que hoje eu localizo como sendo a sede do Exército, no Ibirapuera. Lá estava a minha filha de um ano e dez meses, só de fralda, no frio. Eles a colocaram na minha frente, gritando, chorando, e ameaçavam dar choque nela. O torturador era o Mangabeira [codinome do escrivão de polícia de nome Gaeta].”
E as mulheres negras ?
A pesquisadora Tauana Olívia Gomes, idealizadora da tese de doutorado ‘Mulheres Negras nos Movimentos de Esquerda durante a Ditadura no Brasil (1964-1985)’, busca visibilizar as histórias de mulheres negras como parte da resistência à ditadura, colocando-as como sujeitas políticas.
Mulheres negras, como Arabela Pereira Madalena, Edna Maria Santos Roland, Maria do Espírito Santo Tavares dos Santos, Diva Moreira, Thereza Santos, Helenira Resende de Souza Nazareth, Lúcia Maria de Souza, Dora Lúcia de Lima Bertúlio, Maria Diva de Faria, Arabela Pereira Madalena, entre outras, se cruzaram pela barbaridade da ditadura, e ainda têm suas histórias e vivências invisibilizadas.
Justiça pela memória e respeito!
Para fazer justiça à memória de todas as mulheres vítimas do regime, a escritora e historiadora Maria Cláudia Badan Ribeiro, escreveu o livro “Mulheres na luta armada: protagonismo feminino na ALN”. O livro traz reflexões sobre o legado de luta dessas lideranças, e ao mesmo tempo, expõe as vidas tão pouco contadas das mulheres brasileiras que pegaram em armas contra a ditadura.
Em 2012, Dilma instalou a Comissão Nacional da Verdade, com o objetivo de apurar as violações dos direitos humanos que ocorreram no período entre 1946 e 1988, o que inclui a ditadura militar (1964-1985).
Essas histórias, por muitas vezes, apagam a existência das mulheres que estiveram à frente de lutas por igualdade, respeito e melhores condições de vida. Por elas, e por todas as outras pessoas que tiveram suas vidas tiradas, é importante enfatizar que esse período nunca mais se repita!