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A viagem do vovô no balão de sonho

A viagem do vovô no balão de sonho

Por José Lopes Agulhô Junior

Algumas peças publicitárias apelam para a ideia de que a satisfação nos leva às alturas. Hall’s, Kolynos, Red Bull. Então, voar em um balão é isso: uma fantasia. Não há nada emocionante, zero de adrenalina. Balão de sonho.

Afora pelas baforadas de para enchê-lo de calor, o silêncio é total, especialmente com turistas nada brasileiros a bordo. Coisa para aposentados ou mote para histórias infantis. Taí: eu vou contar para Liz que um dia o vovô viajou em um balão.

            “Teve um dia que o vovô tava viajando de balão, aí anoiteceu e ele teve que ficar estacionado na Lua, só voltando para casa no dia seguinte. Aí,           quando ele chegou, a vovó ralhou brava com ele porque ele num tinha         avisado aonde ia. Aí o vovô falou pra vovó que tinha dormido na Lua, e a             vovó disse que ele era doido, como ele pode ter dormido na Lua sem ter             levado nenhum agasalho.

            – E faz frio na Lua, vovô?

            – Fazer frio faz, mas o vovô achou um pedacinho de Sol e ficou dormindo debaixo dele até de manhãnzinha.

A coisa é tão maneira que eu tirei uns cochilos a bordo. Estava exausto da correria da viagem. Só não dormi de verdade porque eu me esforcei para ficar acordado. A gente fica de pé dentro da cabine (cesto), então é mais difícil dormir e sonhar que está voando em um balão. Acho que para o João Gallo seria perigoso.

E O PARAQUEDAS?

A chegada dá até um frisson leve porque os caras estacionam a coisa sobre um reboque. É até bacaninha o pouso, bem calculado.

Tá bom, tem a paisagem vista de cima, a alternância de altura sim, mas é só. Muito organizado, o piloto era inglês, mil cuidados. Nada de aventura, gente aflita, desmaiando, dando gritinhos de horror, homens falando que no último voo cruzaram da Ilha de Galápagos ao Havaí.

E se lá em cima fôssemos obrigados a lançar fora sacos cheios de areia para reduzir o peso, trocar o cilindro de gás, pois a válvula sofreu uma avaria? Quem sabe um pássaro furasse a lona (?) e a coisa se rasgasse e tivéssemos que pular de paraquedas.

Epa! Eu não vi paraquedas a bordo.

Putz, agora eu fiquei com medo. Essa será a primeira e única vez que vou virar personagem em histórias envolvendo voo em balão.

Enfim, voar em um balão é como esse post: uma folia.

Até breve.

José Lopes Agulhô Junior – Escritor. Conto para a neta em gestação.

Em  https://avosidade.com.br/a-viagem-do-vovo-no-balao-de-sonho/

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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