Ághata, Ághata, Ágatha… Perdão, Ághata. Perdão!

Ághata, Ághata, Ágatha… Perdão, Ághata. Perdão!
 
Na de força para escrever, tomamos emprestados os textos de Fabiana Freire Pepeu no Facebook. Eles representam um pouco da nossa indignação.
 
Perdão, Ághata. Perdão.
 
 
Se vocês falarem, eu escuto o enredo todo, mas eu mesma hoje talvez não consiga encarar.
Rio de Janeiro de novo? PM de novo?”
 
Faça chuva ou faça sol, vivo olhando para o Céu. Hoje, peço a Deus que a gente, brancos privilegiados de merda desse paísteatrodoabsurdo, tome tenência e faça qualquer coisa para evitar a de outra Jéssica. Não, Fabianna, a garotinha de hoje também é da Zona Norte do Rio, mas a que foi assassinada pela PM hoje é Ághata. Jéssica faz 7 meses.
 
Outras pretas e pobres foram assassinadas nesse meio , no Rio de Janeiro? Tem dú? Dê uma geral nas notícias policiais, mas isso não é editoria de polícia, isso é . Política? Mas o não saiu nem da escravidão vai saber o que é notícia de polícia ou de política. É um lugar sem lei, entregue a uma gente sem escrúpulos. Tem uns jornalescos que noticiam as coisas. Ah, é? Sim. Parece um país, mas é mais um espaço desumano no mapa. Só isso? Só.
 
Tem uma tragédia, mas eu estou me negando a tocar nessa dor. Tangencio a tragédia com Bandeira que também viveu sua dor, mas é muito diferente, pois Manuel era adulto, teve uma vida. Ou não? Tem um assunto aí que eu vi de longe, mas eu não sei se dou conta de cuidar.
 
Tem uma , sim, dessas matadas no Brasil escatológico. Se vocês falarem, eu escuto o enredo todo, mas eu mesma hoje talvez não consiga encarar. Rio de Janeiro de novo? PM de novo? Era preta, né? Quantos anos? 8? Mais nova que meu sobrinho… Tiro nas costas. Vou aguentar falar disso não. Não, não pode ser. Ághata Ághata Ághata. Perdão, Ághata. Perdão.
 
Ágatha Vitória Sales Félix, foi assassinada pela Polícia Militar do Rio de Janeiro, com um tiro nas costas, aos 8 anos de idade.
 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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