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ÁGUAS EMENDADAS: O CORAÇÃO DO CERRADO AGONIZA

ÁGUAS EMENDADAS: O CORAÇÃO DO CERRADO AGONIZA

Águas emendadas: o coração do cerrado agoniza

As Águas Emendadas nascem no coração do Cerrado, o segundo maior bioma brasileiro. Estão localizadas em uma área de savana com grande variedade de fauna e flora, na região administrativa de Planaltina, no do Distrito Federal. 

Por Iolanda Rocha e Marcelo Benini

É ali, no meio de um emaranhado de pequenas águas que brota a nascente-mãe de uma vereda com cerca de 6 km, onde ocorre um fenômeno fabuloso e único: aquela mesma veia pulsante jorra água para direções opostas, para o Norte e para o Sul do Brasil, unindo duas grandes bacias hidrográficas do Brasil e da América do Sul, a Tocantins/Araguaia e a Platina. Rumo Norte, as águas seguem para a Bacia Tocantins/Araguaia, incorporando-se à Bacia Amazônica. Ao Sul, seguem pela Bacia do Rio Paraná até o Rio da Prata.  

Infelizmente, este incrível patrimônio da natureza, reconhecido internacionalmente – foi o sexto lugar do e o primeiro da América Latina a receber o Escudo Água e Patrimônio do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios, e também passou a integrar a Área Núcleo de Reserva da Biosfera do Cerrado, criada pela UNESCO – agoniza a olhos vistos. 

Por descuido e por descaso do poder público, o crescimento urbano desordenado, a produção da monocultura da e o uso indiscriminado de no entorno desta Unidade de Conservação, minam, a cada dia, a qualidade ambiental e a perspectiva de futuro das Águas Emendadas. 

ESTAÇÃO ECOLÓGICA DE ÁGUAS EMENDADAS

A Estação Ecológica de Águas Emendadas foi criada como Reserva Biológica no final dos anos 1960 e, mais tarde, na década de 1980, ganhou a denominação de Estação Ecológica de proteção integral, quando também a ela foi incorporada a área da Lagoa do Mestre D’Armas ou Lagoa Bonita, totalizando a área atual de 10.547 hectares, um paraíso de Cerrado muito bem preservado.

Embora seja evidente a importância da Estação Ecológica de Águas Emendadas e assegurada a sua preservação pela legislação federal e do Distrito Federal, estão ocorrendo diversos fatores que comprometem a sobrevivência da área, assim como da fauna e da flora. Nascentes, córregos e rios estão desaparecendo todos os anos no Cerrado. 

Animais como a anta, o veado campeiro, o tatu canastra, o lobo guará, a suçuarana, o e muitos outros estão ameaçados de extinção.  Devido à grande circulação de veículos, morrem todos os anos centenas de animais atropelados. Se a situação continuar como está, em futuro bem próximo as Águas Emendadas só existirão nos livros. 

Para completar, existe hoje uma discussão para a duplicação da rodovia DF-128, no trecho que liga Planaltina-DF a Planaltina-GO, exatamente ao lado da Estação Ecológica de Águas Emendadas. A demanda vem do município de Planaltina-GO, que só tem aquela saída para o Plano Piloto. 

Na visão de socioambientalistas, o governo precisa estudar novas alternativas viárias, pois a duplicação da DF-128 certamente irá comprometer a preservação da área, inclusive o abastecimento de água no DF. Estudos feitos por pesquisadores da Universidade de detectaram a presença de mercúrio nas águas da região. 

Tudo o que está acontecendo fora da Estação Ecológica já está impactando as Águas Emendadas. O rebaixamento do lençol freático fez com que o nível de água da Vereda Grande, núcleo do fenômeno de união das bacias do Norte e do Sul, diminuísse drasticamente nas últimas décadas, fato atestado pelos analistas ambientais que atuam no local. 

Vale lembrar que toda a região de Planaltina-DF e parte de Sobradinho-DF são abastecidas com a água que vem das Águas Emendadas. E o impacto continua na região de Planaltina de Goiás, que também é abastecida com as águas que saem de Águas Emendadas e seguem pelo Rio

Toda a área rural da região capta a água diretamente do lençol freático, através da perfuração de poços artesianos, e corre sério risco de ficar, em futuro bem próximo, sem abastecimento desse líquido vital e preciosíssimo. 

Há vários anos o Distrito Federal vem sofrendo com a falta de urbanístico, e várias áreas de preservação ambiental já foram sacrificadas para atenderem a urbanização desordenada e irresponsável, que na maioria das vezes são ocupadas irregularmente em área de recarga de aquíferos e outros comprometimentos que ameaçam a no bioma Cerrado.

Moradores da região, ativistas, artistas, produtores culturais, movimentos socioambientais estão alertando a população e os governantes para o grau de ameaças de destruição da ESECAE. Um grupo de ativistas reuniu-se e criou a GAE – Guardiães das Águas Emendadas – e através deste grupo algumas atividades já foram feitas para dar visibilidade à grave situação em que se encontra a Estação Ecológica de Água Emendadas. 

Por falta de fiscalização e manutenção adequada por parte do Estado, algumas áreas da reserva estão com a cerca danificada, deixando o local mais vulnerável.  Representantes da GAE têm participado de seminários, audiências públicas, manifestações para denunciar e cobrar urgência nas providências para salvar as Águas Emendadas da destruição.


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Iolanda Rocha Educadora. Socioambientalista. Conselheira da

 


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Marcelo Benini Ambientalista. Guardiães das Águas Emendadas -GAE. 

 


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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