Atanagildo de Deus Matos (Gatão): presidente do CNS (1995–1998)
Atanagildo de Deus Matos, o grande líder extrativista conhecido como Gatão, nasceu na comunidade Castanheiro, no alto rio Oeiras, município de Oeiras do Pará (hoje essa localidade fica dentro da Reserva Extrativista Arióca/Pruanã), em uma área onde a família sempre viveu do extrativismo florestal e da agricultura de subsistência.
Por Marcos Jorge Dias
Gatão começou suas atividades políticas em 1968, com a organização das comunidades de base incentivadas pela igreja católica, quando reunia as famílias para reivindicar: escolas, saúde, documentação pessoal, defesa das terras etc.
Em 1973, foi eleito diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Oeiras do Pará e, a partir daí, sua trajetória política foi ampliada para todos os municípios, sempre com a função de esclarecer as pessoas e de incentivar os trabalhadores rurais a lutarem por seus direitos.
Na segunda metade da década de 1970, quando o governo federal criou para a Amazônia a campanha com o slogan: “terra sem homem, para homem sem terra”, Gatão percebeu a necessidade de articular trabalhadores rurais de outros municípios do estado do Pará, com a finalidade de resistir contra a grilagem de terra, a derrubada de floresta e a violência no campo.
“Era uma luta desigual. Poucos dirigentes tinham coragem de se expor (Oeiras do Pará, Baião, Paragominas e Maracanã), na época o governo era militar, não havia apoio, a não ser alguns setores da igreja católica e a Contag, muito discretamente”, conta Gatão.
Em entrevista à educadora Cristina da Silva, relatou:
Resistir contra o desmatamento, à época, não era bem visto, a ordem do governo da ditadura militar era “desbravar” a Amazônia, trazer desenvolvimento, eliminar os “preguiçosos”, integrar ao resto do país aquela grande área ociosa. Mas nós não nos intimidamos, continuamos ampliando nosso trabalho de informar e esclarecer a importância dos moradores, da floresta, dos rios e da fauna. Foi assim que organizamos o primeiro encontro dos trabalhadores rurais de área de conflito de terra na Contag, em Brasília, Chico Mendes também estava presente.
Esse processo de articulação se ampliou para a região amazônica em outubro de 1985, quando foi criado o CNS, com a finalidade de lutar em defesa dos trabalhadores extrativistas da Amazônia, segmento de trabalhadores rurais que extrai da floresta produtos que geram a renda principal para o sustento de suas famílias sem prejudicar o meio ambiente.
“Naquela época, a grande maioria dos dirigentes de sindicatos da Amazônia não incluíam em seus planos de ação a defesa da floresta, e a economia extrativista era secundária para eles. Foram esses motivos que nos levaram a criar o Conselho Nacional dos Seringueiros”, relembra Gatão.
Durante os anos 1980, foram consideráveis os avanços no reconhecimento da existência das populações extrativistas da Amazônia. O Movimento conseguiu que o Incra criasse os primeiros projetos de assentamento extrativista, no Acre, no Amazonas e no Amapá, na luta em defesa da floresta.
Participei ativamente da reorganização do sindicalismo na região, contribuímos no processo de criação da CUT, assim como na luta pelo fim do governo militar e por eleições diretas em todos os níveis. Nesse período, perdemos companheiros valiosos, dos quais destaco de maior repercussão: Wilson Pinheiro e Chico Mendes, no Acre; Raimundo Gingo, Benezinho, Zé Pião, João Canuto, Gabriel Pimenta e Paulo Fontelle, no Pará. Todos assassinados por pistoleiros.
Isso mostra a forma de ação dos grileiros, madeireiros e latifundiários em relação às populações que há centenas de anos habitam a região. Esse processo nos fez compreender que a luta em defesa da floresta e das populações que nela habitam não pode ser só localizada, mas que necessita de apoio de outras pessoas, de dentro e de fora do país.
Atanagildo de Deus Matos é um dos fundadores do CNS. No Pará, principalmente, desenvolveu uma grande rede de organização comunitária, foi um dos articuladores da criação de Reservas Extrativistas (Resex) e de Projetos de Assentamento Extrativista (PAE) na Amazônia Legal.
Desde antes da criação do CNS até os dias de hoje, Gatão é um dos grandes líderes do movimento extrativista, que segue em seu trabalho incansável de articular políticas públicas para a Amazônia.
Marcos Jorge Dias – Escritor. Estudante de Jornalismo. Conselheiro da Revista Xapuri. Perfil produzido com base em entrevista de Gatão à educadora Fátima Cristina da Silva. Foto: Divulgação/ Miguel Chikaoka.