Procura
Fechar esta caixa de pesquisa.
A LENDA DO BARBA RUIVA DE PARNAGUÁ

A LENDA DO BARBA RUIVA DE PARNAGUÁ

A lenda do Barba Ruiva de Paranaguá

Aqui está a lagoa de Parnaguá [no Piauí], limpa como um espelho e bonita como noiva enfeitada.

Por Câmara Cascudo

Espraia-se em quinze quilômetros por cinco de largura, mas não era, antigo, assim grande, poderosa como um braço de mar. Cresceu por encanto, cobrindo mato e caminhos, por causa do pecado dos homens.

Nas Salinas, ponta leste do povoado de Parnaguá, vivia uma viúva com três filhas. O rio Fundo caía numa lagoa pequena, no meio da várzea.

Um dia, não se sabe como, a mais moça das filhas da viúva adoeceu e ninguém atinava com a moléstia. Ficou triste e pensativa.

Estava esperando menino e o namorado morrera sem ter ocasião de levar a moça ao altar.

Chegando o tempo, descansou a moça nos matos e, querendo esconder a vergonha, deitou o filhinho num tacho de cobre e sacudiu-o dentro da lagoa.

O tacho desceu e subiu logo, trazido por uma  Mãe- d`Água, tremendo de raiva na sua beleza feiticeira. Amaldiçoou a moça que chorava, e mergulhou.

As águas foram crescendo, subindo e correndo, numa enchente sem fim, dia e noite, alagando, encharcando, atolando, aumentando sem cessar, cumprindo uma ordem misteriosa. Tomou toda a várzea, passando por cima das carnaubeiras e buritis, dando onda como maré de enchente na lua.

Ficou a lagoa encantada, cheia de luzes e de vozes. Ninguém podia morar na beira porque, a noite inteira, subia do fundo d´água um choro de criança, como se chamasse a mãe para amamentar.

Ano vai e ano vem, o choro parou e, vez por outra, aparecia um homem moço, airoso, muito claro, menino de manhã, com barbas ruivas ao meio-dia e barbado de branco ao anoitecer. 

Muita gente o viu e tem visto. Foge dos homens e procura as mulheres que vão bater roupa. Agarra-as só para abraçar e beijar. Depois, corre e pula na lagoa, desaparecendo.

Nenhuma bate roupa e toma banho sozinha, com medo do Barba Ruiva.  Homem de respeito, doutor formado, tem encontrado o filho da Mãe d´Água, e perde o uso da razão, horas e horas.

Mas, o Barba Ruiva não ofende a ninguém. Corre sua sina nas águas da lagoa de Paranaguá, perseguindo mulheres e fugindo dos homens. 

Um dia descansará. Se uma mulher atirar na cabeça dele água benta e um rosário indulgenciado. Barba Ruiva é pagão, e deixa de ser encantado sendo cristão.

Mas não nasceu ainda essa mulher valente para desencantar o Barba Ruiva.

Por isso ele cumpre sua sina nas águas claras da lagoa de Parnaguá.

ANOTE AÍ:

O texto desta foi extraído na íntegra do livro: Brasileiras – Câmara Cascudo – Editora Ediouro – 2.000.  Infelizmente, a Lagoa de Parnaguá, grafada Paranaguá no texto original, fonte da lenda do Barba Ruiva, encontra-se em situação crítica de extinção, conforme vídeo a seguir.

A matéria a seguir, assinada por Por Rômulo Rocha,  publicada no  site  http://180graus.com  em 8 de junho de 2016, complementa a informação sobre esta tragédia.

Um brinde à mediocridade frente à 5ª maior lagoa do Brasil
Em decorrência do anúncio de que iria ser realizado no dia de hoje [8 de junho de 2016], no auditório da OAB, um seminário para “discutir sobre o no Estado do Piauí e suas potencialidades hídricas”, nada mais oportuno do que se utilizar essa data para se tornar público o descaso desse mesmo Estado do Piauí para com um dos seus , que agoniza sob o tapete da inércia, a quinta maior lagoa do País.

Em virtude disso, para não ficar apenas nas salas com ar-condicionado, como se estivessem realmente fazendo algo de concreto, e visando que ações reais saiam desses gabinetes frios do governo do Piauí, é que se denuncia e se torna público a falta de empatia por parte da SEMAR, do IBAMA e das demais autoridades que deveriam gerir o sustentável em solo piauiense.

Portanto, fórum melhor não há para que a SEMAR discuta sua mediocridade diante desse inaceitável acontecimento que se desenha no município de Parnaguá, localizado a cerca de 775 km da capital Teresina. O que se constatou nesse ecossistema, a Lagoa de Parnaguá, é desesperançoso se assim continuar, e põe em xeque a existência desse riquíssimo habitat natural, que ajuda a dar à região.

O DESRESPEITO AO CÓDIGO AMBIENTAL POR PARTE DE AUTORIDADES

180 passou três dias no município, e no tocante à lagoa, ficou impressionado ao constatar que terras que margeiam as águas, e que pertenceriam a agentes públicos, estavam e estão sendo usadas para plantio, em total desrespeito ao Código Florestal, aprovado em 2012 pelo . E isso sem que a SEMAR e sem que o IBAMA nada façam.

ELES DIVIDIRAM A LAGOA DE PARNAGUÁ COM CERCAS

Ao se deparar com a Lagoa de Parnaguá no atual momento – um vasto mundo de água doce com dimensões aproximadas de 12 km de comprimento e 6 km de largura – é assustador saber que ela esteve seca por completo durante cerca de 5 anos, e só voltou a encher com as fortes chuvas que caíram no mês de janeiro, trazendo alegria à população ribeirinha e aos habitantes do município.

A lagoa, quando secou: o que era água virou sertão

A lagoa, quando voltou a encher: o milagre das águas

Mas houve quem, aproveitando a época de seca, reivindicasse as terras para si e pusesse cerca na lagoa – ou no que restara dela -, como demonstra registro fotográfico que permeia essa matéria-denúncia.

Ou seja, ao invés de encontrarem uma saída para que a Lagoa de Parnaguá nunca mais secasse, a alocação de cercas demonstrava justamente uma torcida para que a lagoa morresse de vez e as terras vingassem definitivamente.

E tudo por causa de terras… ganância.

DESMATAMENTO E PLANTAÇÃO NA MARGEM DA PARNAGUÁ

Para piorar a situação, terras que margeiam a lagoa estão sendo desmatadas para plantio de milho e feijão, em flagrante desrespeito às leis em vigor no país.

Em um dos trechos, as terras pertenceriam a um funcionário do IBAMA, que trabalharia no município de Corrente.

Em outra porção, as terras pertenceriam a um vereador do município, e acreditem, filiado ao PV, o Partido Verde – defensor das causas da .

Nem parecia que há pouco, e como um sinal dos tempos, a lagoa havia secado completamente, deixando muitos sem água e sem peixe.

No meio da lagoa, uma pequena ilha se desmancha. Ao menos uma especialista prometeu retornar para saber como evitar que a água faça sumir aquela parte importante para o município e que serve como turismo, por ser um ponto de visitações.

Querem saber se é um processo natural irreversível ou se é algo, que pelo menos aqui, o homem pode intervir de forma sustentável.

Mas não há respostas. As autoridades se mantêm inertes nesse sentido também.

MILHARES DE PATOS SELVAGENS: VÍTIMAS DAS REDES DE PESCADORES

Um homem, o secretário municipal do Meio Ambiente, Absalão Castro Dias, tem sido implacável com a falta de bom senso de inúmeros pescadores da região, que não estariam sendo bem orientados pela respectiva colônia.

Com isso, alguns dos mais de 100 pescadores, ao armar as armadilhas feitas com suas redes para pegar peixes, estão se aproximando demais dos ninhais de patos selvagens.

Esses patos vivem mergulhando na água da lagoa em busca de peixes para se alimentarem e alimentar seus filhotes, mas acabam morrendo ou se entrelaçando nas redes, servindo de alimentação para os pescadores ou sendo devorados pelos peixes.

Um desequilíbrio provocado de forma desordenada pelo próprio homem.

ARMAS NOS BARCOS

Absalão também relatou que é comum que pescadores sejam vistos portando espingardas em seus barcos para caçar os patos. Algo terminantemente proibido.

Ajuda de autoridades, como as da SEMAR e as do IBAMA? O secretário municipal não tem nenhuma. É uma voz quase que solitária em defesa da Lagoa de Parnaguá.

PEIXES SÃO PEGOS DE FORMA PREDATÓRIA E DESPEITOSA

Em virtude da pesca predatória, Absalão Dias chegou a enviar um ofício para o superintendente do IBAMA, Manoel Borges, relatando a prática, mas até agora não obteve respostas.

“Pescadores e outros estão matando os patos e pescando peixes sem o peso adquado, como os surubins que não estão chegando a 1 kg”, relatou.

“Sabendo que V. Excelência se preocupa com os problemas do nosso Estado e confiando no bom senso, aproveitamos para, adiantadamente, agradecer, na certeza de que tudo se resolverá com brevidade”, pontua.

Pedido feito em vão até agora. E isso porque há relatos de que um só pescador chega a tirar das águas, sem critério, 80 kg de peixe para comercializar em Corrente e na região de Parnaguá.

Com suas redes, usando um fio com espaçamento menor do que o permitido, pegam os peixes menores e não os devolvem à água, dificultando a reprodução das espécies ali existentes.

Deixe seu comentário

UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

PARCERIAS

CONTATO

posts relacionados

REVISTA

[instagram-feed]