Buzu de Graça em Maricá
Em Maricá, cidade fluminense com 143 mil habitantes, acaba de ser instituído o passe livre pra todos, quebrando uma espécie de tabu que existe em torno do transporte público no Brasil. Até agora, mesmo quando esse serviço é prestado por empresa estatal, é cobrada uma tarifa dos usuários, ainda que haja isenções setoriais.
Por Jaime Sautchuk
O conceito em vigor é o de que o transporte gratuito é inviável. De modo geral, a maioria das prefeituras entrega a gestão do setor a empresas privadas e paga a elas pelo uso do serviço, seja por meio de valetransporte, seja em dinheiro vivo. Essas empresas calculam as tarifas, inclusive. Isso era o que ocorria em Maricá, segundo relata o prefeito, Washington Quaquá.
A contabilidade do transporte urbano é bastante complexa e varia entre as unidades da Federação. Mas em um aspecto os gestores desse serviço concordam: quem paga a conta é sempre o usuário. Quando governos estaduais ou municipais bancam alguma parte, entra dinheiro federal, de impostos locais, de fundos especiais, de taxas de pedágio, multas e estacionamento, tem de tudo, enfim.
O mais usado, no entanto, é o mecanismo do “subsídio cruzado”, pelo qual é dada gratuidade a uma categoria de usuários (idosos, por exemplo), mas é feita uma média ao se fixar a tarifa. Ou seja, a pessoa que não pagou é incluída no cômputo final, de modo que o valor que seria da sua passagem é dividido entre os demais usuários.
O prefeito de Maricá faz as contas e demonstra que fica mais barato dar transporte de graça a todos os cidadãos do que pagar por algumas isenções. A prefeitura de lá pagava R$ 400 mil por mês apenas pela locomoção de seus funcionários na rede de ônibus local, sem contar outros subsídios. Agora, com o passe livre, são gastos menos de 800 mil mensais com todo o sistema. Havia um ralo no caixa, portanto.
Pra implantar esse serviço, a prefeitura criou uma empresa pública de transportes. Esta comprou uma frota de ônibus e assumiu as linhas-tronco da cidade, numa primeira fase, deixando rotas alimentadoras com um sistema de vans particulares. Mas também essas vicinais serão atendidas por vans gratuitas, numa próxima fase.
O sistema implantado naquela cidade demonstra, portanto, que também o direito à mobilidade, previsto na Constituição Federal, pode ser assegurado de forma gratuita, como ocorre nos setores de educação e saúde, por exemplo.
Estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), corroborados por outros órgãos oficiais e ONGs, demonstram que a gratuidade é possível, mesmo com gestão privada do sistema. Basta, pra isso, que exista um rígido controle do governo local sobre a circulação dos veículos, vigiando horários e roteiros, principalmente. E aplicando fórmulas justas de remuneração, que são por demais conhecidas dos órgãos que regulam o setor.