Carta ao Lula: Sem despedidas – Tem uma gigante na prisão de Curitiba!
Itapeva – SP, 21 de abril de 2019
Hoje faz um mês que Chastalo me chamou para subir.
Subimos.
Aberta a porta, vi sentado em uma cadeira, atrás de uma pequena mesa quadrada, o homem que mais desperta amor e ódio nesse país, que dedicou sua vida ao povo, que lutou contra todas as adversidades possíveis, que se fez presidente, matou fome, sede e ignorância.
Caminhei em sua direção, ele se levantou, dei-lhe um forte abraço.
Sentamos.
Contida a emoção, mirei naqueles olhos pequenos que olhavam na direção dos advogados sentados à mesa.
A voz rouca, o queixo erguido, o discurso sólido.
Ele quis saber de onde eu vinha. Falei.
Nada demovia seu olhar sereno e firme e seus lábios cerrados, até que eu disse que era filho de baiano.
Foi o primeiro sorriso. Filho de baiano, nascido na década de 40, que migrou para São Paulo nos anos 60 para ser operário. Sorriso largo.
Aquele sorriso revelava a compreensão do que me levara ali.
Em tom paternal, me disse: – Respeite-se, senão ninguém vai te respeitar. Respeite a instituição a que você pertence, pois sem as instituições não há democracia.
Falamos de política, economia e justiça.
Deu a hora e os advogados tiveram que ir. Ficamos eu e ele. Meia hora de conversa.
E como lhe dissera no início da prosa não entender de política, apanhando uma caneta e rabiscando num papel, deu-me uma lição básica.
Depois, ofereceu-me café: – Eu faço o meu café, porque sou bom nisso, disse.
Passado o café, com o copo estendido em minha direção: – açúcar ou adoçante?
– Açúcar, presidente.
– Não tem.
Rimos.
Sentamos e bebemos o café.
Foi-se a meia hora.
Chastalo entrou.
Entreguei as cartas e as fotografias.
Mostrei a sacola de cartas da rodoviária de Brasília, seus olhos brilharam. Um novo sorriso.
Em tom de bronca: – Por que você não tirou uma foto disso, pô?
Autografadas as camisetas e bandeiras, nos despedimos.
A cena de despedida desapareceu completamente das minhas reminiscências. E se digo que houve, é por que era o que havia de acontecer.
Desci e encontrei meus amigos que aguardavam no saguão: as juízas Germana de Morelo, Raquel Braga, Magda Biavaschi e Lucy Lago; e os juízes André Machado, Maurício Brasil, Mario Sergio Pinheiro, José Augusto Neto, José Antônio Correa Francisco, Leador Machado e Rui Portanova.
Lucy esteve presente em seu espírito de luta, já que um problema de última hora a impediu de estar fisicamente conosco.
Lenice Parreira, minha eterna companheira, Zisélia da Costa, que está na vigília desde que ela começou, e Sebastião Aranha, guerreiro valoroso, estavam ali, ansiosos.
Gente que compartilha o mesmo amor pela Constituição, pela democracia e pelo Brasil, que da justiça ergue a clava forte, não foge à luta e não teme o mal, nem os que o adoram.
Tem uma gigante na prisão de Curitiba! Gigante pela própria natureza, um homem forte, honesto, sensível e corajoso.
Até breve, Presidente Lula!
Edevaldo de Medeiros – Juiz Federal
Fonte: As cartas que Lula não recebeu, p 242, Coletânea organizada por Cleusa Slaviero e Fernando Tolentino
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