Memorando à tia Alice e aos tios de minha história

Memorando à tia Alice e aos tios de minha história

Por Padre Joacir S. d´Abadia

Sinto sua distância. Há muitos anos que aqui eu moro sem que você encontrasse um pouco do seu raro tempo pra me visitar. Gostaria muito de poder contar com todos os meus. Me parece que não significa tanto pra você a  nossa história,  logo você,  um viajante pelo da sabedoria. 
 
O único, um dos primeiros da família que não teve medo de enfrentar os desafios da e se dedicar aos estudos, que deu um título de bacharelado à sua família, que  depois seguiu dando a cada um com a pós-graduação, uma especialização que custou muitos quilômetros de distâncias de dificuldades.  O que seguiu para os 10 livros publicados.
 
Ora, pois! Você já leu algum desses livros? Fez homenagem ao seu pai com o livro “ de Barriga cheia”, resgatando uma história cheia da presença dos seus vizinhos. Quanta coisa bonita experimentávamos nos finais de semana onde se reuniam os primos e amigos para brincarmos de casinha, cozinhadinha, pique pega, pique esconde, caí no poço, bandeirinha, queimada, pulo de fogueira, salve latinha, bisteca, metadinha… “
 
Sim, era tudo muito maravilhoso! Tínhamos tempo para conviver.
 
Contudo, naquele nosso tempo para se fazer uma viagem de apenas 60 KM, por exemplo, nós precisávamos de dois dias. O tempo era nosso amigo.
 
Convivíamos com as pessoas nos pousos de Folia, nas rezas de promessas aos mais variados santos e “nossas senhoras”, novena da Quaresma, missas, nas marcas de serviços, nos forrós, nas limpas das roças.
 
Na minha época (tenho hoje, 03/03, 34 anos de idade) como é bem verdade que as pessoas eram mais pobres do que hoje… eu ainda continuo pobre! Ora, pois. Contudo, não eram paupérrimas! Como também não o sou! Destarte, fosse lá grande coisa ter riquezas.
 
Segue um pouco de minha memória:
 
 Como não recordar com emoção, como agora me lavo em lágrimas, da de tia Alice, temperada com sebo de vaca? Sua vida era de uma carência extremada como muito mais extremada era sua caridade: “dava o que não tinha”.
 
Porque deixar de falar de tio Jacó? Um homem exageradamente sensível a todas as pessoas, principalmente as crianças, no carinho demonstrado apenas na permissão para se andar dentro do seu carinho de ferro. Posso dizer-lhe que estou agora me desprendendo deste destemido pensar para me possibilitar outras .
 
Sigo, então, com o tio Brisdo. Seu destaque era as pequenas roças que fazia no canto de nossa grande roça. Plantava todos os tipos de sementes que encontrava. Seu plantio sempre nos causava uma “santa inveja”.
 
Outro homem que não quero que fique longe dos meus registro é o tio Joaquim Oba. Seu discurso de originalidade tinha na fala a experiência de ter vivido no tempo da Revolta. Dizia que os revoltosos chegavam nas fazendas e matavam os porcos gordos, faziam churrasco para se divertirem e expulsavam as pessoas de casa. Diante de sua história de vivência opressiva, ele nunca gostava de policiais. Imagina que ainda as pessoas o estavam. Esse mesmo pensamento assolou os remanescentes Kalunga da Chapada dos Veadeiros.
 
As pessoas pobres também são gente. Viva nós! Pobres, sim: ontem, hoje e sempre; jamais, paupérrimos.
 
Gostaria de dizer ainda que na nossa história não tinha esse “negócio” de “crente”. Somos marcados por uma religiosidade de fazer fogueira e rezar o terço.
 
O tempo foi passando! Que bom que aquela história hoje é lembrada em meio aos meus soluços, porém lhe reforço para lhe tirar do seu conforto de distanciamento dos seus irmãos, dos seus primos e, com pesar, até dos próprios pais.
 
“Somos sua família, conte conosco”, pode dizer alguém. Todavia, sua história não morre, mesmo que você se esqueça dela.
 
Faça por você, por sua vida, pela grandeza de seu pai, por tudo que seja sagrado em sua vida, faça sua história encurtar a distância sendo próximo dos seus.
 
 
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Padre Joacir d’Abadia – Filósofo. Escritor. Autor de uma dezena de livros. Pároco de Alto Paraíso de Goiás, na Chapada dos Veadeiros, onde leva uma vida simples. 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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