Corais brasileiros entram no mapa das espécies ameaçadas

Corais brasileiros entram no mapa das espécies ameaçadas

Pela primeira vez, de regiões brasileiras estão entre os mais afetados pelo aumento da temperatura da água provocado pelo

Quando se fala no processo de branqueamento de corais, a maioria das pessoas pensa na distante Grande Barreira, na Austrália. Mas o problema está bem perto de nós, brasileiros. No verão 2018-2019, o El Niño provocou a elevação da temperatura da água em até 2°C, o que afetou esses animais – sim, corais são animais – em grande escala por diferentes pontos da costa brasileira.  As primeiras análises do projeto Coral Vivo, que conta com a colaboração de 14 universidades e institutos de pesquisa, apontam que os efeitos do fenômeno foram tão intensos que colocam, pela primeira vez, o Brasil entre as regiões mais afetadas pelo aquecimento global no que se refere a esse ecossistema.

A espécie mais afetada, de acordo com dados da pesquisa, foi a coral-de- (Millepora alcicornis), que alcançou mortalidade de 90%. Até então acreditava-se que esse tipo era dos mais protegidos por se beneficiar das águas turvas, que minimizam a radiação solar.

“Mesmo no caso da espécie coral-de-fogo, cujo crescimento rápido favorece seu processo de recuperação, percebemos que existe um risco maior para a dos recifes da região”

Carlos Henrique Lacerda
Pesquisador do Projeto Coral Vivo

Esses são os primeiros resultados do monitoramento feito pelo time de pesquisadores do projeto em três recifes de corais do sul da Bahia durante o verão 2018-2019, período em que ocorreu o El Niño. As consequências do fenômeno foram mais intensas nessa região, conhecida como Costa do Descobrimento, uma das mais importantes do Atlântico Sul por sua biodiversidade marinha, mas também foram afetados o litoral norte de São Paulo, ilhas oceânicas – Fernando de Noronha, Atol das Rocas e Ilha da Trindade – e algumas praias de Arraial do Cabo e Búzios, na Região dos Lagos do Estado do Rio.

Dez anos para recuperação

Coordenador regional de pesquisas do projeto Coral Vivo, o zootecnista Carlos Henrique Lacerda ressalta que os corais brasileiros entraram no mapa daqueles que estarão sob ameaça se o El Niño passar a acontecer de forma regular e com a mesma intensidade, o que é uma consequência da crise climática. “Mesmo no caso da espécie coral-de-fogo, cujo crescimento rápido favorece seu processo de recuperação, percebemos que existe um risco maior para a biodiversidade dos recifes da região”, observa.

O zootecnista acredita que os recifes de corais poderão até se recuperar de forma natural, mas serão necessários no mínimo 10 anos para que esse processo se complete totalmente. “Ficamos chocados, tudo aponta para a alta temperatura da água, fazemos um monitoramento constante e percebemos que o ocorrido este ano foi diferente. Tivemos um verão estendido, a temperatura da água só baixou em junho. Foi muito ”.

Ainda de acordo com Lacerda, o fenômeno do branqueamento não terminou. Alguns corais continuam sem cor em pleno inverno, o que é atípico. “Estamos preocupados se os corais vão conseguir se recuperar para o próximo verão e em que condições chegarão até lá. Ainda existem muitas espécies sob os efeitos desse trauma”.

O monitoramento continua a ser feito em três recifes de corais. Dois deles estão em áreas de conservação – Parque de Recife de Fora e Parque da Coroa Alta – e o terceiro num local mais costeiro, bem próximo da região de pesquisa do projeto, em Arraial d’Ajuda. O objetivo é formar um banco de dados robusto para acompanhar atentamente tudo que vem ocorrendo naquele ecossistema marinho.

Foram avaliados, entre outros dados, qualidade e temperatura da água, variação solar, nutrientes, oxigênio, salinidade e PH. As primeiras análises demonstram que os alertas projetados para o futuro se tornaram realidade muito antes do esperado. Pesquisadores são unânimes em dizer que, mais uma vez, o aquecimento global foi o grande vilão do desequilíbrio ambiental ocorrido neste verão.

“O aquecimento global está diretamente ligado ao branqueamento de corais. A gente tem algumas previsões de aumento de temperatura de acordo com as diferentes taxas de emissão de CO2 daqui para frente. Os cenários variam de aumentos a partir de 2°C na temperatura média mundial em relação ao período pré-industrial. Tudo dependerá de como vamos lidar com o problema. Se as emissões não diminuírem, chegaremos ao pior cenário”, afirma Amana Garrido, que é doutoranda do Instituto de Biologia da UFRJ.

 

Mortandade também na Região dos Lagos

Disposta a descobrir mecanismos que possam contribuir para a preservação dos corais, a pesquisadora está à frente de um do Laboratório de Biodiversidade da Cnidaria no Instituto de Biodiversidade e do NUPEM-UFRJ, em Macaé, Estado do Rio. O objetivo da pesquisa é entender todos os ciclos que levam ao branqueamento e à recuperação da espécie coral-de-fogo, encontrada do Rio de Janeiro até a Flórida. No Brasil estão localizados os únicos recifes de coral do Atlântico Sul.

Amana realiza a pesquisa nas praias dos Anjos (Arraial do Cabo) e Tartaruga (Búzios), conhecidas como “oásis coralíneo” pela de seu ambiente marinho. Na região foi feito o primeiro alerta de mortalidade devido a branqueamento, e 15% dos corais não resistiram.

Para conhecer melhor o fenômeno do branqueamento, a pesquisadora precisa entender como as zooxantelas, microalgas unicelulares que vivem dentro dos tecidos dos corais, se comportam durante esses eventos climáticos. Encontrar essas respostas não é uma tarefa simples. É que existem várias espécies de zooxantelas, algumas são mais sensíveis a temperaturas altas e outras são mais resistentes.

Fenômeno de elevação da temperatura, como o que ocorreu este ano, rompem a simbiose dos corais com as pequenas algas. Quando os corais perdem as microalgas, perdem também sua cor, deixando o esqueleto calcário exposto, por isso o fenômeno é chamado de branqueamento. O coral branqueado não está morto. Dependendo da duração e da intensidade desse estresse, o coral pode conseguir recuperar as microalgas e sobreviver. Porém, se for muito severo, parte desses corais não se recupera e morre.

A pesquisadora ressalta que ainda existe muito a ser esclarecido. A cada lote de amostra observado, ela encontra muitas espécies novas de zooxantelas. E, como são diferentes, respondem de forma distinta ao branqueamento. Descobrir quais são mais importantes no processo de branqueamento e identificar onde estão será fundamental para saber que regiões serão prioritárias para serem escolhidas como futuras áreas de preservação.

E este é o ponto alto da pesquisa. É que, ao se tornarem modelos, algumas áreas poderão ajudar outras regiões de recifes de corais que são muito problemáticas e que sofrem com eventos adversos ao meio ambiente marinho. Mas o resultado de todo o só será conhecido no ano que vem, previsto para a pesquisadora identificar todas as espécies que estão sendo observadas em laboratório e seus estudos.

A pesquisa desenvolvida por Amana tem o apoio do Programa Bolsas FUNBIO – Conservando o Futuro, do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO), em parceria com o Instituto Humanize. Lançado em 2018, o programa destina anualmente R$ 1 milhão a pesquisas de campo de mestrandos e doutorandos em todo o Brasil.

Fonte: Projeto Colabora

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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