Dizem por aí: Iêda foi plantar árvores no céu
Por Antonio Victor
Ela era uma criatura das letras.
Desde os mais primevos letramentos
à culminância da palavra acadêmica.
Não conhecia meios termos,
meias palavras
ou meias bocas.
Era menos oito ou mais que oitenta.
A menina ingênua. A mulher-intelecto.
A fêmea aguerrida. A frágil mãe.
O fundo do poço. O cavalgar das estrelas.
Conheceu o inferno. O seu inferno interior
que sempre lhe queimou o peito, revolveu entranhas,
insultou cicatrizes.
Mas também sabia inventar pedacinhos de céu,
retalhos de paraíso e pequenos oásis
em terras áridas e imensos desertos.
A filha da dona Odete e do seu Vico
não mandava recados.
Ia pessoalmente e resolvia a parada
tivesse o peso que tivesse.
Defendeu as mulheres, os povos das florestas,
os sem-vozes, os sem-rostos, os sem-nomes,
os oprimidos, a natureza.
Fundou academias e fundou a mão
na cara da sociedade hipócrita e corrompida
todas as vezes em que se sentiu aviltada.
Escreveu livros, declamou poemas, bebeu cerveja
e bebeu canções ao violão
em tantas noites de sagradas boemias.
Num momento de descompensação
– que ninguém é de ferro –
Iêda abandonou seu inferno,
sobrevoou Goiás,
deu um rasante no quintal de Cora Coralina,
desapareceu na imensidão e, dizem por aí:
Que foi plantar árvores no céu!