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Em cima da dor, começamos a cultivar a flor…

Em cima da dor, começamos a cultivar a flor…

Há muito tempo só havia o escuro.

Os caminhos sempre foram perigosos.

Às vezes os igarapés alagavam.

Às vezes faltava o peixe. 

Às vezes comíamos bem.

Às vezes só tinha farinha.

Notícias, só de vez em quando nos rádios dos barracões,

ou dos regatões.

A dívida consumia nosso trabalho.

Escola era palavra proibida.

Saúde só pros patrões.

O futuro era alguma coisa que parecia que não chegaria.

Aí, em cima da dor, da terra espinhosa, começamos a cultivar a flor.

A luz passou a ser construída.

A nossa união passou a ser a poronga acesa

que alumia o caminho e nossa luta,

mesmo com sangue derramado do nosso lado,

cresceu, e começamos a construir nosso futuro sem patrão,

sem exploração e sem violência.

Hoje nossos filhos começam a sentir que vale a pena a vida,

com a nossa proposta de Reserva Extrativista.

E o índio é nosso companheiro nesta caminhada…

Da qual estamos dando hoje mais um passo

com o I Encontro dos Povos da Floresta.

Carta do I Encontro dos Povos da Floresta – Lida por Julio Barbosa de Aquino, hoje presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), na abertura do I Encontro dos Povos da Floresta, de 25 a 31 de março de 1989, em Rio Branco, Acre, Brasil. O I Encontro ocorreu poucos meses depois do assassinato de Chico Mendes, em 22 de dezembro de 1988. Foto: Arquivo/ Documentário “Genésio”.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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