Formosa: Sesmarias do Sertão do Campo Aberto

O Brasil do século XVIII seguia a lógica da ocupação por sesmarias. Segundo o historiador Paulo Bertran, em História da e do Homem no (Editora UnB, 4a Edição, 2004), a região onde hoje se encontra o município de teria feito parte das Sesmarias do Sertão do Campo Aberto. Vejam o relato:

De Planaltina até o Rio Preto, no ângulo de nordeste do Distrito Federal, havia as sesmarias de Júlio de Brito Peixoto (1777), de Domingos Viegas de Ataíde – que também era sesmeiro no ribeirão Saia Velha, não longe de Santa Luzia – e, finalmente, as sesmarias dos Rocha Couto, José e João.

Esses Rocha Couto – hoje ou bem extintos ou de sobrenome trocado – encontram-se entre os mais antigos povoadores da região de Formosa,  já citados em 1741. Sesmeiro no ribeirão de Santa Rita desde aquela época, em 1772 assenta-se João da Rocha Couto também no ribeirão Jacaré, na atual fazenda do Retiro do Meio.

A mais antiga sesmaria de João da Rocha Couto, empreendia o sítio atual de Formosa.

[Essas] sesmarias eram enormes. da ordem de três léguas de comprimento por uma de largo, vale dizer 108 quilômetros quadrados, treze vezes e meia a área residencial das duas asas do Plano Piloto [em Brasília]. Sesmarias de sertão, dimensionadas tanto para a criação extensiva do gado vacum e cavalar como para a em geral.

Inexistindo as atuais cercas de arame, o gado era criado à larga, misturado, identificado apenas pela marca do proprietário, “costeado” apenas uma vez por ano e servido de sal nas águas, pois durante a os campos queimados forneciam os sais minerais necessários.

(…) Nas secas, que sempre foram um problema sério do Planalto, o gado, cheirando a umidade do ar, migrava espontaneamente para as lagoas e veredas de buritis da região.

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Buraco das Araras – Foto Setur  – Formosa

SESMARIAS DA REGIÃO DE FORMOSA (segundo listagem de Paulo Bertran):

1749 – Antonio Alvares de Araujo – morador no sertão da da capitania de Goyazes, que ele povoou com gados de criar… logradouros na cabeceira do rio Preto (…) fazendo extrema … de cima com a lagoa Formosa…

1763 – Manoel da Costa Barroso – meia légua na paragem de Santo Inácio…

1766Damião Pereira do Lago – (…) morador entre a ribeira do Paranã e o Santa Rita…

1768 – Francisco Dias – meia légua no Barreiro Grande …

1768 – Joaquim Pereira de  Castro – Fazenda Bom Sucesso, distrito do

1768 – Manoel de Espínola de Ataíde – morador no arraial da chapada dos Couros – sítio da mesma chapada chamada Santa Inácio no ribeirão dos Macacos…

1770 – Manoel Domingos de Azevedo – morador no distrito de Couros, possuidor de uma fazenda chamada Santa Tereza sita no ribeirão do Salobro…

1770 – Raimundo de Meyreles Freyre –  morador da ribeira do Paranã, distrito de Couros, tem muito gado sem parte certa para criar… [usa] uma paragem devoluta dita “O Mozundó”, ou Ilha.

1770 – Antonio Pinheiro Lima – morador no Arraial de Couros, [tem] sítio no Barreiro Grande, no córrego de Santa Rita, confrontando com o sítio da Bandeirinha…

1772 – João da Rocha Couto – na paragem do Barreiro Grande, no córrego Santa Rita, entre a Lagoa Feia e o ribeirão da Forquilha…

1773 – José Pedro de Novaes Pereira – morador no sertão do Paranã…

1777 – José Gonçalves – meia légua na Lagoa Feia…

1785 – Leonardo da Silva Mello – meia légua na Lagoa Feia…

1804 – Gomes Baptista – viúva – 3 léguas x 1 légua na fazenda chamada Santo Inácio…

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Lagoa Feia hoje – Foto jornalismo.iesb.br

ANOTE AÍ:

Campo Aberto: Por Campo Aberto compreendia-se no século XVIII a generalidade das terras que medeiam entre o rio São Bartolomeu e o rio Preto, incluindo a região de Formosa e Planaltina.

Sesmarias: O de  Miriam Ilza Santana, publicado no site www.infoescola.com resume a história das sesmarias:   No Brasil de 1536 foi instituído, pelo rei de Portugal, Dom João III, as capitanias hereditárias. No total foram instituídos 14 distritos, que foram partilhados em 15 lotes e repartidos entre 12 donatários, indivíduos que receberam as terras como doação do governo português e em contrapartida tornaram-se pessoas de confiança da realeza portuguesa.

Os donatários, no entanto, não foram isentados de pagar impostos à monarquia. A partir da instituição das capitanias foi inserido o sistema de sesmarias – pedaço de terra devolvido ou abandonado, prática comum durante o Brasil-Colônia. Cabia a estes donatários permitirem que os colonos cultivassem estes nacos de terra e os tornassem novamente produtivos, objetivando o progresso da agricultura.

Em 1375 foi estabelecida, em Portugal, a Lei das Sesmarias, seu objetivo era ajudar no avanço da agricultura que se encontrava abandonada em virtude das batalhas internas e da peste negra. Essa lei mais tarde foi adaptada para funcionar no Brasil.

Segundo a Lei das Sesmarias, se o proprietário não fertilizasse a terra para a produção e a semeasse, esta seria repassada a outro agricultor que tivesse interesse em cultivá-la.

Somente aqueles que tivessem algum laço com a classe dos nobres portugueses em Portugal, os militares ou os que se dedicassem à navegação e tivessem obtido honrarias que lhes garantissem o mérito de ganhar uma sesmaria, tinham o direito de recebê-la. Cada colono receptor de um pedaço de terra tinha um registro feito pelas autoridades competentes, denominado cartas de sesmaria – por meio destas, várias informações importantes a respeito desses colonos eram checadas, tais como: o local de moradia dos indivíduos, informações de caráter pessoal e familiar, se a propriedade adquirida pelo colono era herdada, doada ou ocupada e seus limites, se haviam trabalhadores e que tipo de mão-de-obra era utilizada, o local da propriedade, entre outros dados.

As sesmarias adquiridas, sem exceção, foram validadas em registros públicos efetivados junto às paróquias locais, unidas nesta época ao em caráter oficial. Assim sendo, quem subscrevia os registros de terras ou certidões – nascimento, casamento, entre outras – eram os vigários ou párocos das igrejas.

Nem tudo era perfeito, havia vários problemas a serem sanados, entre eles pode-se citar a atitude dos sesmeiros diante da obrigatoriedade de se cultivar a terra, isso levou muitos deles a locar suas terras a pequenos lavradores – dando aos posseiros. Estes cultivavam as terras, porém não tinham direitos sobre elas, eram “donos” de terra adquirida de forma ilegal, muitas vezes pagando para ficar com elas e cultivá-las, prática ilegal no sistema de doação de sesmarias.

Em virtude das inúmeras irregularidades, em 1822 foram suspensas as concessões de sesmarias, só permanecendo aquelas anteriormente reconhecidas. Quem se beneficiou de tal medida foram os posseiros, que ascenderam socialmente e se firmaram como únicos proprietários de terras a partir de então, com escritura de propriedade registrada em cartório.

 

 

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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