Gercina do MST dá nome a fungo que fortalece a terra

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Gercina do MST dá nome a fungo que fortalece a terra

Penicillium gercinae é um fungo importantes no processo de decomposição da matéria orgânica presente no solo

Mora no assentamento Chico Mendes – Três… é a vida se reproduzindo e mostrando que quem atirou em Chico Mendes errou o alvo, perdeu o tiro. Quem pensa que o matou, na verdade, tornou-o IMORTAL! – Gomercindo Rodrigues.

Lucila Bezerra/brasildefato
 
“Eu não conhecia nada de fungos e hoje eu já sei o que é a defesa das plantas”
 
Dona Gercina nem imaginava que o próprio quintal seria palco de uma importante descoberta científica. Agricultora familiar, ela faz parte do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e mora no assentamento Chico Mendes – Três, em Paudalho, no estado de Pernambuco, há 18 anos.  

“Isso, pra mim, foi muita alegria. Dentro dessa conjuntura, dela ter descoberto um fungo. E ter esse carinho, imagina. Só mãe e filha, né? E botar esse nome tão, assim, pra me homenagear.

As pessoas têm o costume de homenagear as pessoas depois que morrem e eu estou tendo esse privilégio de estar aqui, viva, contando a história. E estou sendo homenageada”, conta Gercina. 

A pesquisa que identificou no solo o fungo do tipo Penicillium foi feita numa parceria entre a Universidade Federal de Pernambuco e o assentamento rural. O nome científico que homenageia dona Gercina ficou assim: Penicillium gercinae. 

O fungo foi detectado na análise de solos feita pela doutoranda Amanda Lúcia Alves. A orientadora dela, a bióloga Patrícia Vieira Tiago, professora da Universidade Federal de Pernambuco, destaca a importância científica do feito. 

“Esse Penicillium faz parte de um grupo que ainda se conhece poucas espécies dentro do grupo. Então, foi sim uma informação bastante interessante e que são fungos bastante importantes nesse processo de decomposição da matéria orgânica presente no solo.

Esses fungos vão estar facilitando nesse processo de incorporação desses nutrientes no solo e, consequentemente, nutrindo as plantas. Então, garantindo o equilíbrio ali no sistema”, explica. 

A pesquisa teve início em 2009, como um projeto de extensão da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFPE). Em 2013, o estudo foi incorporado pela UFPE através de um projeto que acompanha a transição da monocultura de cana de açúcar para o sistema agroflorestal, técnica que utiliza diferentes tipos de plantas numa mesma área, e que foi implantada a partir da ocupação pelos assentados. 

“Nesse projeto, a ideia é monitorar os microrganismos que ocorrem dentro das propriedades desses agricultores que adotaram esse processo de transição agroecológica, onde eles estão diversificando as culturas.

Então, a propriedade da dona Gercina é uma que a gente acompanha desde 2013. A gente pegou praticamente o início do processo de plantio dessas mudas do sistema agroflorestal dela, que foi o modelo que ela adotou para ter na propriedade”, relata Patrícia. 

A inclusão dos assentados no processo de pesquisa foi fundamental para os resultados. E possibilitou a troca de saberes entre a agricultura familiar e a universidade. Para dona Gercina, esse intercâmbio é motivo de orgulho. 

“O cuidado que ela teve de fazer o estudo dela com os fungos e trazer o resultado tudo pra me mostrar. Isso sempre eu digo pros visitantes que vêm me visitar, que eu não conhecia nada de fungos e hoje eu já sei o que é a defesa das plantas.

Eu fico satisfeita pelo trabalho dela e dos professores da universidade que estão tendo esse cuidado de mandar os estudantes pra cá para estudar com nós e a gente ver o resultado da terra, o quanto é bom a gente cuidar da mãe-terra”, conclui, emotiva.

Edição: Rodrigo Gomes


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Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação. 

Resolvemos fundar o nosso.  Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário.

Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também. Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, ele escolheu (eu queria verde-floresta).

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Já voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir.

Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. A próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar cada conselheiro/a pessoalmente (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Outras 19 edições e cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você queria, Jaiminho, carcamos porva e,  enfim, chegamos à nossa edição número 100. Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapui.info. Gratidão!