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Guarani-Kaiowá: Um lutar sem fim!

Guarani-Kaiowá: Um lutar sem fim! A 14 de junho do ano da graça de 2016, nas sagradas terras usurpadas dos Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, as balas assassinas do latifúndio tombaram por terra mais uma liderança  indígena. Sem pedir pra partir, e muito tendo ainda por fazer, o jovem Clodiodil de Souza, vinte e poucos anos, quase um menino, foi-se embora deste mundo.

No rastro da mesma pólvora aberta a tiro e trator contra uma comunidade indígena indefesa, pelo menos cinco outras pessoas ficaram feridas, incluindo uma criança de 12 anos. O município de Caarapó ganhou as páginas do noticiário nacional e internacional. Infelizmente por razões das quais jamais poderá se orgulhar. Com mais essa ação paramilitar, as milícias armadas do latifúndio fizeram de Caarapó terra arrasada aos olhos do mundo.

Ainda que parca, pobre e pouca – são 3,5 hectares para seis mil indígenas – o povo indígena Guarani-Kaiowá do tekohá Tey Jusu ocupou uma das fazendas situadas no território tradicional que chama de Toro Passo, na Terra Indígena (TI) Dourados-Amambaipegua, por considerar esse torrão de terra originariamente seu, e por saber que agora, também de direito, o Brasil lhe diz que de fato a terra é sua.

A 12 de maio, no mesmo dia do afastamento da presidenta Dilma Rousseff por um golpe midiático-parlamentar que levou ao poder o interino Michel Temer, o relatório de identificação da TI Dourados-Amambaipegua, foi finalmente publicado pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Não fosse a sangrenta gana do agrocrime, embora com décadas de atraso, um ínfimo quinhão de terras voltaria, pelas mãos do moroso Estado brasileiro, aos seus povos originários.

UMA LUTA QUE PARECE NÃO TER FIM

Não foi essa a primeira retomada de terras indígenas sob a chibata da violência na região da Reserva Indígena de Caarapó. Em 2013, tombou o jovem Denilson Barbosa, do tekohá de Pindo Roky. Em 2005, assassinaram Dorvalino Rocha. Em 2015, foi assassinado o líder Simeão Vilhalva, no tekohá Nhenderú Marangatu.

E, apenas nos últimos anos, há registro de pelos menos outros 25 ataques contra o povo Guarani-Kaiowá no estado de Mato Grosso do Sul, em uma luta que não vem de agora, que causou a morte do grande líder Marçal Tupã Guarani em 1983, e que se estende desde quando, no início do século XX, o povo Guarani-Kaiowá foi confinado pelo antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) em diminutas reservas indígenas.

Da política de integração da primeira metade do século, implantada pelo SPI para “educar e orientar os índios ao trabalho, para que progressivamente evoluíssem até a incorporação ao mundo ocidental,” que tentou transformar as aldeias em unidades administrativas, quando não produziu o aldeamento forçado e o desaldeamento de milhares de indígenas, ao desmatamento e usurpação das Terras Indígenas pelo agronegócio, sobretudo a partir dos anos 1970, aos Guarani-Kaiowá não sobrou outro caminho que não fosse o da luta e da resistência.

TERRITÓRIO DA PISTOLAGEM, TERRA DA IMPUNIDADE

O Brasil é o segundo país em concentração fundiária no mundo – perde apenas para a África do Sul. Ao mesmo tempo em qe concentra um dos maiores índices de concentração de terras do país, o estado de Mato Grosso do Sul também concentra também o segundo maior contingente de população índigena do Brasil, ficando atrás apenas para o estado do Amazonas.

Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), Mato Grosso do Sul é também o estado onde ocorre a correlação mais desfavorável entre a população indígena existente e a extensão das terras indígenas oficialmente reconhecidas. Na imensa maioria dos casos, assim como em Caarapó, os indígenas foram confinados em áreas diminutas, frente à sua população e à concentração fundiária local, controlada pelo agronegócio.

Como consequência, surgem os recorrentes conflitos e ações violentas contra povos indefesos, reconhecidos por entidades vinculadas à causa indígena e aos direitos humanos, e também de forma indireta pelos próprios organismos do governo brasileiro, como ações paramilitares, sustentadas pela certeza da mais completa impunidade. Ali, na Terras Indígenas do Mato Grosso do Sul, comete-se injustiça contra índio o tempo todo, mata-se índio à luz do dia, e nada passa.

No caso do ataque de 14 de junho, o Ministério da Justiça informa que orientou o caso para investigação e que enviou a Força Nacional à região. A Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, emitiu uma nota de pesar pelo assassinato, registrando que “o jovem agente foi morto covardemente”. E a Funai, órgão indigenista oficial do Estado brasileiro, também em nota pública expressa seu lamento. Aos índios sobra história e falta esperança para crer que dessa vez algo será diferente.

DEMARCAR AS TERRAS INDÍGENAS, SAÍDA URGENTE E ÚNICA

Os conflitos no Mato Grosso do Sul, e também nas outras áreas brasileiras onde ainda habitam comunidade indígenas sob ataque do latifúndio, só terminarão com a demarcação e a desocupação das Terras Indígenas. Para isso, torna-se fundamental a agilização dos processos demarcatórios pela Funai, e a aprovação no Congresso Nacional das peças de legislação que permitam ao povos indígenas viver em paz em suas terras originárias.

Torna-se, portanto, urgente a aprovação pela Câmara dos Deputados da Proposta de Emenda Constitucional 132/2015, já aprovada por unanimidade pelo Senado, que prevê indenização aos portadores e portadoras de títulos legítimos que incidam sobre as terras a serem demarcadas. Uma medida lógica, com ganho para todas as partes, portanto de fácil aprovação, poderia se pensar.

Infelizmente não é assim. Na prática, parlamentares da chamada bancada da bala tentam aprovar leis contrárias aos interesses dos povos indígenas, como a PEC 215 (que transfere a demarcação de terras para os estados) e, no âmbito das Comissões Parlamentares, insistem em CPIs como as do Cimi e da Funai/Incra. Dessa forma, inviabilizam a paz, aprofundam o ódio, e agravam as ações de violência contra os povos originários.

Enquanto: as Terras Indígenas não forem demarcadas; a legislação contra os povos indígenas não for barrada; o Estado não deixar de ser omisso e lento; e o Ministério da Justiça não tomar providências efetivas e de imediato para punir os assassinos de lideranças indígenas, a dor não cessará para o povo Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul e para todos os povos originários da pátria brasileira.

PARA MAIS NOTÍCIAS DA LUTA DOS GUARANI-KAIOWÁ E DOS POVOS INDÍGENAS BRASILEIROS, CONSULTE:
Conselho Indígena Missionário – Cimi www.cimi.org.br
Instituto Socioambiental – ISA  www.socioambiental.org
Fundação Nacional do Índio – Funai www.funai.gov.br/


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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