A Festa do Mundo
Por Honestino Monteiro Guimarães
– Eu espero a festa do mundo inteiro
a cantar a manhã que chegou
mais bela que as outras manhãs,
porque a noite que a precede é uma noite
mais negra que o comum das noites todas.
Eu espero a festa do mundo
mas também eu construo
anônimo entre todos, mas ligado a todos
porque a festa do mundo vai ter que chegar
é a festa da manhã geral.
Eu construo a festa do mundo
armado das minhas convicções
que são as verdades do mundo,
que são as verdades do homem.
Pois eu construo a festa
cantando e lutando por um mundo
liberto e igual,
pelo mundo que vai chegar
com a manhã mais bela que as
manhãs todas,
com a festa dos homens livres.
E eu luto pela festa do mundo.
Honestino Guimarães (27 de novembro de 1965).
HONESTINO MONTEIRO GUIMARÃES
Honestino Monteiro Guimarães nasceu em 28 de março de 1947 em Itaberaí, pequena cidade de Goiás. Sua infância foi igual à de muitos outros garotos do interior do Brasil, mas desde muito pequeno revelou uma inteligência incomum e paixão pelos estudos e pela leitura.
Entre brincadeiras, livros e castigos das professoras, o menino levado e estudioso crescia sob o olhar atento de seus pais. Convivia com muitas primas e primos, fazia piqueniques à beira do rio das Pedras, nadava e jogava futebol com garotos de sua idade.
Em 1960 a família mudou-se para Brasília, atraída pelas oportunidades que a nova capital oferecia. Moraram na W3 Sul e depois na superquadra 405/406 Norte. Honestino, adolescente, era fanático por leitura e namorador.
Terminou o curso ginasial e começou o científico no Centro de Ensino Médio (Elefante Branco). Em 1964 transferiu-se para o Centro Integrado de Ensino Médio (Ciem), experiência pedagógica inovadora em Brasília. Já participava da política estudantil e ingressou na Ação Popular (AP), organização política clandestina de grande penetração no meio estudantil.
Em 1965, antes de completar 18 anos, foi o primeiro colocado no vestibular, em toda a Universidade de Brasília. Na política estudantil, sua liderança logo se revelou. Era muito querido e respeitado pelos estudantes da UnB.
Mas ações como pichar muros, participar de manifestações e distribuir panfletos contra o governo resultaram em prisões – a primeira em fevereiro de 1966, durante uma greve; em fevereiro de 1967 fazendo pichações; em abril de 1967, durante manifestação na Biblioteca Central da UnB. Em agosto de 1967, na prisão pela quarta vez, foi eleito presidente da Federação dos Estudantes da Universidade de Brasília (Feub).
Por sua atuação no movimento estudantil, Honestino passou a ser perseguido pelos órgãos de repressão política. Seu pai representou-o por procuração no casamento com Isaura Botelho, militante estudantil. Em 29 agosto de 1968, vinte dias depois do casamento, a UnB foi invadida para que se cumprisse um mandado de prisão contra ele e outras lideranças estudantis.
Honestino foi preso. Em setembro, dois meses antes de concluir o curso de geólogo, foi excluído da universidade. Foi libertado em novembro. No dia 16 de dezembro de 1968, três dias depois da edição do AI-5, seu pai faleceu em um acidente de carro. Sem respeitar o luto e a dor da família, policiais ocuparam o cemitério com viaturas e ele não pôde ir ao funeral.
Com o AI-5, os habeas corpus não tinham mais valor e Honestino e Isaura passaram a viver como clandestinos em São Paulo, onde, em 1970, nasceu a filha Juliana. Em outubro de 1971 separaram-se e mudaram-se para o Rio de Janeiro, onde no ano seguinte ele passou a viver com sua nova companheira.
Foi eleito vice-presidente da UNE em 1969, na gestão de Jean-Marc von der Weid e em 1971 foi eleito presidente. Cumpria, na clandestinidade, suas tarefas na UNE e militava na Ação Popular Marxista-Leninista. Acreditava que a transformação social brasileira só poderia ocorrer pela ação dos trabalhadores organizados e todo o seu esforço dentro da organização política tinha esse objetivo.
Honestino nunca participou de ações armadas, para ele iniciativas dissociadas das massas trabalhadoras. Estudava economia e política incansavelmente. Mas seus escritos, acumulados em vários cadernos e entregues por sua companheira a um militante da Ação Popular, infelizmente perderam-se em uma enchente.
Apesar da perseguição policial, mandava cartas para parentes e amigos, mantinha contato com a mãe e os irmãos e visitava a filhinha com frequência. Com os cabelos pintados de preto para disfarçar-se, ia à praia, ao cinema, ao futebol no Maracanã, ao desfile de Escolas de Samba no carnaval, tomava chope com amigos e até jogava peladas no Aterro do Flamengo.
Mas a repressão nunca descobriu seu endereço no Cosme Velho, onde morava com sua companheira. Há indícios de que a última prisão deveu-se à delação de um companheiro de partido, que apavorado diante das ameaças e da perspectiva de tortura, tornou-se informante da polícia.
Os órgãos de repressão admitiram ter prendido Honestino, mas ele nunca foi visto por outros presos. Mesmo depois de longos anos de incansável busca, sua família não conseguiu saber o que aconteceu com ele, que passou a fazer parte da lista de desaparecidos da ditadura de 1964.
OUTROS DADOS DA BIOGRAFIA DE HONESTINO
O líder estudantil Honestino Monteiro Guimarães foi estudante de Geologia e presidente da Federação dos Estudantes da Universidade de Brasília (FEUB). Em razão de sua militância no movimento estudantil foi preso por quatro vezes.
Depois de sua quarta prisão, no ano de 1973, nunca mais retornou. Seu atestado de óbito, datado de 10 de outubro de 1973 só foi entregue a família, incompleto, sem a causa da morte, em 1996, vinte e três anos depois.
Em 20 de setembro de 2013 foi oficialmente anistiado e teve atestado de óbito completado, com a causa de sua morte esclarecida: Honestino morreu em razão de atos de violência sofridos quando estava sob custódia do Estado brasileiro.
O caso de Honestino foi objeto de investigação pela Comissão da Verdade, que apura mortes e desaparecimentos ocorridos durante a ditadura militar brasileira, que durou de 1964 a 1985.
Placa em homenagem a Honestino Guimarães na UnB
Em 28 de agosto de 2015 uma das pontes ao sul do Lago Paranoá, a Ponte Costa e Silva, cujo nome homenageava o ex-presidente da República e General do exército, Arthur da Costa e Silva, teve seu nome trocado para Ponte Honestino Guimarães.
A mudança já havia sido proposta em 2015, pelo ex-deputado distrital Ricardo Vale (PT), e chegou a ser sancionada, mas, em 2018, a Justiça determinou a volta do nome do general. O Projeto de Lei aprovado recentemente foi apresentado pelo ex-deputado distrital Leandro Grass (PV).
A mudança da placa não foi imediata. Em 23 de dezembro de 2022, por conta própria, moradores do DF trocaram simbolicamente a inscrição na placa que fica em frente à ponte.
Em 13 de dezembro de 2022, a Câmara Legislativa do DF (CLDF) derrubou o veto do governador Ibaneis Rocha (MDB) para a troca do nome na ponte, que faz a ligação entre a QI 10 do Lago Sul e a via L4 Sul. O veto ocorreu no fim de 2021.
Em fevereiro de 2023, a Ponte Honestino Guimarães, recebeu, enfim, sua placa definitiva.
