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Intervenção extraterrestre

Intervenção extraterrestre

Causa estranheza o silêncio sepulcral de Jair Bolsonaro há mais de três semanas, desde que foi derrotado no segundo turno das eleições presidenciais. Por pressão, balbuciou algumas palavras para se isentar de responsabilidades em relação aos atos criminosos de alguns dos seus apoiadores, que bloqueiam estradas para prejudicar o direito de ir e vir da população, cuja maioria decidiu eleger Lula da Silva o novo presidente do Brasil…

Por Márcio Santilli/via Mídia Ninja

(Brasília – DF, 09/12/2021) Cúpula pela Democracia (videoconferência). Foto: Clauber Cleber Caetano/PR

Foram suspensas as agressões diárias disparadas contra os desafetos, as lives de quinta-feira e até as entrevistas que concedia no cercadinho, diante do Palácio da Alvorada, com grupos de bajuladores contratados para contracenarem. Bolsonaro trancou-se no palácio e a claque transferiu-se para o acampamento golpista montado diante do quartel-general do Exército.

Bolsonaro fez de tudo para se reeleger. Esteve em campanha nos quatro anos de mandato. Montou um poderoso esquema de caixa dois entre empresários de direita, que promove e dissemina informações falsas, banca motociatas e manifestações antidemocráticas, alimentando uma militância, devidamente alienada, para sempre defender o que for do seu interesse.

Em plena campanha, avançou sobre o orçamento para privilegiar corporações específicas, quadrilhas de supostos pastores evangélicos e segmentos do “ogronegócio”. Para não falar do auxílio emergencial, restaurado para o período eleitoral, e do orçamento paralelo, que carreou bilhões em obras e serviços que beneficiaram os seus aliados.

Entre o primeiro e o segundo turno, Bolsonaro mobilizou um enorme esquema paralelo para reduzir a abstenção eleitoral nos seus redutos e aumentá-la nos de Lula, valendo-se dessa rede de empresários e de falsos pastores para constranger funcionários e fiéis, e usando até mesmo a Polícia Rodoviária Federal para bloquear estradas e dificultar o acesso dos eleitores às urnas.

Com tudo isso, Bolsonaro conseguiu reduzir de seis para dois milhões a vantagem de Lula, mas não impediu a derrota. Ele é o primeiro presidente a perder uma reeleição, mesmo estando com o poder na mão. É compreensível a sua decepção.

Mito micado

Mas Bolsonaro não aceita a derrota e, mesmo em silêncio, esperneia e ainda deseja barulho. Move a engrenagem para bancar manifestações golpistas, embora tema ser preso, se comparecer a elas. Pressiona e divide seus generais, para que impeçam a posse do Lula. Exige que o PL peça a anulação da eleição. Dizem que, isolado no palácio, trata de uma erisipela, infecção cutânea que o impede de vestir calças e aparecer em público. Mas que não o impede de falar.

O problema é que mito que é mito não perde eleição, não fica em segundo lugar, não subsiste diante de outro ente maior. A farsa de que Bolsonaro seria um enviado de Deus também não combina com derrota nas urnas. E nisto se funda a fraude política de que só a fraude eleitoral poderia explicar a derrota nas urnas.

O “patriota do caminhão” | Reprodução Redes Sociais

O silêncio do derrotado é o sinal para a sua rede promover bloqueios de estradas e acampamentos diante dos quartéis. Os bloqueios são uma iditoce política, pois penalizam mais a população de regiões em que Bolsonaro venceu, como Mato Grosso e Santa Catarina. Os “patriotas” acampados tentam forjar a falsa ideia de que há apoio popular para um golpe militar.

Mas o tempo está passando e a estratégia de pressão sobre os quartéis não produziu os efeitos desejados. Tanto que o “gabinete do ódio”, dedicado a desconstruir a reputação dos seus desafetos, abriu fogo contra seis dos 14 generais do Alto Comando, que estariam se opondo à intervenção militar para impedir a posse do Lula, e, por isso, seriam “generais-melancia”, patriotas por fora e comunistas por dentro.

Melancias aguadas

Protesto bolsonarista em frente ao quartel-general do Exército em Brasília é alagado pela chuva | Reprodução Redes Sociais

O ataque direto aos generais obrigou os comandantes militares (exclusive o ministro da Defesa), a publicar uma nota de repúdio. Afinal, os 14 foram atingidos, pois os outros oito, não sendo “melancias”, só poderiam ser golpistas. A reação tornou ainda mais remota a hipótese de uma ruptura institucional.

Os “patriotas” têm produzido inúmeras cenas patéticas nas estradas e quartéis. A sublime resistência do cara agarrado à parte externa da carroceria de um caminhão viralizou. Assim como a saudação nazista de uma pequena multidão em Santa Catarina. Ou as imagens das pastoras do apocalipse, orando em meio à tempestade que se abateu sobre o quartel-general de Brasília, com a ventania arrancando barracas e as pessoas com a água pelo joelho.

Com Bolsonaro eclipsado e silenciado por seu problema de saúde e com os generais batendo em retirada, grupos de “patriotas” depositam as suas últimas esperanças golpistas em seres extraterrestres. É que pilotos de aviões observaram no céu de Porto Alegre, na madrugada de terça-feira (15), luzes misteriosas, que piscavam e se deslocavam rapidamente no firmamento, como se fossem naves alienígenas. Logo circulou nos acampamentos a notícia de que que ETs já estavam chegando para impedir a posse do Lula.

Socorro do além

Bolsonaristas sinalizam com celulares para o céu, em Porto Alegre | Reprodução Redes Sociais

É incrível imaginar que há quem possa imaginar que os ETs, se efetivamente chegassem aqui, teriam como missão depor o Lula e ressuscitar o Bolsonaro, ou impor uma ditadura alienígena para “salvar” o Brasil do “comunismo”. Circularam nas redes sociais cenas impressionantes, com “patriotas” expondo celulares na testa, para chamar a atenção dos ETs. Além de versões extravagantes, como a de que “tudo” já estaria “resolvido”, pois um dos ETs já estaria encarnado no Lula, para melhor nos governar.

Talvez tenhamos aqui, de forma objetiva, um ponto de encontro entre a extrema loucura dos “patriotas” e a esperança de mudança da maioria dos brasileiros, que votou no Lula.

http://xapuri.info/lburdia-gabriel-aprovado-em-medicina-na-usp-fazia-faxina-para-pagar-cursinho/

Block

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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