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JOSÉ CARLOS RUY E O DICIONÁRIO DE MACHADO DE ASSIS

José Carlos Ruy e o  Dicionário Machado de Assis

Uma ao de José Carlos Ruy e seu Dicionário Machado de Assis, uma obra fundamental que ilumina as páginas do icônico escritor brasileiro

Por Urariano Mota/Portal Vermelho

Uma das razões de viver de um intelectual é a sua obra, os seus livros, o seu . Ou melhor, corrijo: é a maior razão da sua vida. É o seu , a sua paixão, a sua dor, a sua alegria, a sua honra. Numa palavra, é a sua felicidade.

E quando esse intelectual é também um militante comunista, essas hora e honra se tornam uma práxis, e de tal que vemos um e outro em uma só pessoa. E se esse intelectual comunista se chama José Carlos Ruy, mais próximos estamos de ver em sua obra um salto teórico do que ele viveu, militou, trabalhou, estudou e refletiu. Eu me refiro a seu Dicionário Machado de Assis.

Lembro perfeitamente. Em 2 de fevereiro de 2021 nós perdemos José Carlos Ruy. Desse modo perdemos também a sua palavra amiga, o estímulo companheiro, a compreensão generosa que só desejava abraçar a de tudo e de todos nós. Mas na sua inesperada partida, como uma fecunda herança, ele nos deixou o Dicionário Machado de Assis. Uma herança fecunda e necessária. Se pensam que exagero, o que podemos dizer de páginas de Machado de Assis onde Ruy nos ilumina? Se não, olhem um dos trechos, como aqui:

“Camila – É daquela casta de mulheres que riem da idade. É bonita e deixa às outras o trabalho de envelhecer. Tem cabelo negro e olhos castanhos; as espáduas e o colo feitos de encomenda para os vestidos decotados. E um certo instinto que a beleza possui, junto com o talento e o gênio. É casada com um viúvo, honesta não por temperamento, mas por princípio, amor ao marido e um pouco por orgulho.

Vive principalmente com os olhos na opinião. Entrou na casa dos 30 anos de idade e não lhe custou passar adiante. Duas ou três amigas dizem que ela perdeu a conta dos anos, sem perceber que a era cúmplice, e que aos 40 anos Camila mantém um ar de 30 e poucos. Quando surgiu um pretendente para a filha, ficou prostrada: viu iminente o primeiro neto, e determinou-se a adiar o casamento da filha. (Do conto Uma Senhora, de 1884)”

Em 16 de março de 2021, quando terminei a revisão do livro de José Carlos Ruy, confessei em email coletivo: “O trabalho foi altamente compensado pelo que aprendi, guiado pelas mãos de Ruy. Não poucas vezes ri, gargalhei. A lição que fica do trabalho que tive é esta: o pior ignorante é aquele que pensa que sabe. Eu pensava que sabia sobre Machado de Assis. Sabia nada. Hoje sei muito”. Isso faz mais de três anos!

Nas palavras de Ruy, que me falou dessa obra meses antes de falecer: “além de uma apresentação do Machado, reuni opiniões dele sobretudo, e a descrição dos 1065 personagens da sua obra”. Mas ele realizou bem mais. José Carlos Ruy escreveu um livro fundamental, uma orientação de estudos sobre Machado para estudantes universitários e colegiais, além de fonte de pesquisa para doutores de nossas universidades. Para todo o .

É necessária, mais que antes, a publicação do Dicionário Machado de Assis. José Carlos Ruy, um dos maiores intelectuais comunistas do , merece que toda a gente saiba desse livro. E todos os intelectuais, escritores, estudantes, todo o povo enfim, bem que merecemos este dicionário. Urgente.

Por enquanto, o destino do livro de Ruy está nas mãos da Editora Garibaldi. Revisado, diagramado, com prefácio, apresentação, mais imagens raras do nosso maior escritor. Rodem e avisem, por favor, que o Dicionário Machado de Assis de José Carlos Ruy está no mundo.

Fonte: Portal Vermelho Capa: Reprodução

JOSÉ CARLOS RUY E O DICIONÁRIO DE MACHADO DE ASSIS
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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