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JUANA AZURDUY: MARISCAL, GENERALA, FLOR DO ALTO PERU

Juana Azurduy: Mariscal, Generala, Tenente-Coronela, Flor do Alto Peru

Juana Azurduy

Flor del Alto Perú

No hay outro capitán

Más valiente que tu (…)”

Mercedes Sosa

Por Iêda Vilas Bôas

Imaginem uma , dentro de uma gruta, com espada em punho, acuada e lutando contra dúzias de soldados para proteger duas pequenas meninas enrodilhadas em sua cintura. Essa valente mulher rompe o cerco e consegue garantir a sobrevivência de suas pequeninas e a sua própria. É sob a égide dessa extrema força e valentia que apresento a vocês essa heroína guerrilheira

Juana Azurduy Bermúdez nasceu em 12 de julho de 1780, num pequeno povoado da região de Potosí, pertencente ao vice-reinado do Alto Peru, que hoje passou a incorporar a Bolívia e pedaço da Argentina, Uruguai e Paraguai.

Era filha de um rico fazendeiro espanhol com uma nativa indígena. Juana teve uma infância feliz e livre, em contato com a materna. Por outro lado, o pai espanhol cuidou de educá-la em sua adolescência, de acordo com seus costumes e posses, enviando a jovenzinha para os melhores colégios de freiras.

Apesar dos papéis de gênero conservadores e católicos da sociedade colonial, seu pai Don Matías ensinou a mocinha a se tornar uma cavaleira habilidosa e exímia atiradora. Ela acompanhava o pai no de lavrar a ao lado de trabalhadores indígenas.

Era fluente em espanhol, em quíchua e aimará, as línguas dos povos indígenas locais. Ficou órfã na juventude e decidiu que se tornaria freira, mas a rebeldia nata e espírito livre que habitavam naquele de chola,de uma mestiça, fez com que, aos 17 anos, fosse expulsa do convento.

A moça viu-se só e enfrentou muitos preconceitos e problemas familiares. Uma tia sua tentava apropriar-se de sua herança. Venceu um a um, todos os desafios. Decidiu que seria para sempre solteira e iria cuidar da fazenda e dos bens que seu pai lhe deixara.

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Aos 25 anos de idade apaixonou-se pelo vizinho e amigo de infância, seu grande companheiro e Manuel Ascencio Padilha, e com ele se casou.

Manuel também possuía os mesmos ideais libertários e quando, em 1805, explodiu a revolução na região de Chuquisaca, local situado ao sul da Bolívia, os dois tomaram lado junto aos rebeldes e pegaram em armas dispostos a matar ou morrer.

Na ocasião, os rebeldes revolucionários foram vencidos e as cabeças de Juana e Manuel foram colocadas a prêmio. Destemidos e corajosos, continuaram na luta e seguiram para alistando-se no Exército Auxiliar do Norte para combater os realistas.

Juana já tinha quatro filhos e estava na luta armada.

O ano era 1811 quando o exército espanhol avançou pelo Peru.  Juana e seus filhos foram presos e seu esposo conseguiu fugir. Dias depois, Manuel, através de um plano estratégico conseguiu resgatar Juana e os filhos.

Em 1812 Manuel e Juana estavam integrados às tropas de Manuel Belgrano, herói da independência argentina (foi um economista, político, advogado e militar).

De imediato, o General Belgrano reconheceu a valentia e liderança de Juana e a destacou frente aos pelotões.Ela contava com mais dez mil companheiros sob sua ascendência. Foi sob o comando de Juana Azurduy que esse exército obteve vitória no ataque ao Cerro de Potosí em 1816.

A partir de então, foi elevada ao posto de Tenente-coronela. Essa mulher altaneira foi chamada de “Sol do Alto Peru” e conhecida por seu forte apoio e liderança militar aos povos indígenas do Alto Peru.

Ao todo teve seis filhos e cinco os perdeu nas batalhas pela liberdade. Duas das filhas nasceram no fragor da guerra por fome, sede e agruras mais. Apenas uma sobreviveu.

Na batalha de La Laguna, ela foi ferida gravemente e seu marido, na tentativa de resgatá-la, foi morto e sua cabeça decapitada exposta em praça pública. Através de um contra-ataque, Azurduy conseguiu recuperar a cabeça e o corpo de seu marido.

A Coronela Azurduy foi uma das maiores expressões da luta pela independência nos campos da Bolívia e da Argentina e morreu como indigente no dia 25 de maio de 1862, aos 80 anos de idade. Foi enterrada em uma vala comum e somente 100 anos mais tarde seus restos foram levados para um mausoléu erguido em sua na sua cidade de Sucre.

Ela passou muitos anos pedindo esmolas na cidade de Salta, seu patrimônio foi confiscado. Perdeu até mesmo a pensão que ganhava como coronela, que lhe foi tirada em 1857 pelo governo.

Ao encontrá-la em condição de miséria, em 1825, o grande libertador Simón Bolívar reconheceu que Juana era uma heroína da independência e concedeu-lhe o grau de coronela. E, ainda, bradou envergonhado:“Esse país não deveria chamar-se Bolívia em minha homenagem, mas sim Padilha ou Azurduy, porque foram eles que o fizeram livre”.Com a morte de Bolívar também foi enterrado o sonho da Pátria Grande.

Em homenagem póstuma, ela foi nomeada Heroína Nacional da Bolívia em 1962. A ex-presidenta da Argentina, Cristina Kirchner, no ano de 2009, outorgou a Juana o posto de Generala do exército argentino e expôs o famoso sabre com o qual Juana esgrimiu e enfrentou os inimigos da independência.

Em 2015, Evo Morales, presidente da Bolívia, deu de presente à Argentina uma gigantesca estátua, em bronze, da valente guerreira. Na Bolívia, Juana recebeu o título de Mariscala do Estado Plurinacional e foi declarada como Libertadora da Bolívia. Azurduy foi a primeira mulher a receber a patente de Marechal na América Latina.

Iêda Vilas-Bôas – Escritora, redatora, Presidente da ALANEG, revisora de textos, faleceu em 08/04/2022.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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