Mulheres Munduruku: “Vamos seguir defendendo a casa dos nossos antepassados. Não trocamos e nem negociamos a vida do nosso povo!”

“Não aceitamos mudanças feitas sem consulta aos povos indígenas”, afirmam mulheres Munduruku

Em carta produzida no III Encontro de mulheres Munduruku do médio Tapajós, indígenas repudiam medidas do governo Bolsonaro

Por:  Verônica Holanda*/Cimi

De 30 de janeiro a 2 de fevereiro, ocorreu o III Encontro de mulheres Munduruku do médio Tapajós, na aldeia Sawré Muybu, dentro da terra indígena de mesmo nome. Como resultado, foi divulgada uma carta em sua página do Facebook solidarizando-se com os Pataxó Hã Hã Hãe, afetados pela poluição causada pelos rejeitos de mineração da barragem do Córrego do Feijão, em . Elas também reafirmam a resistência à política indigenista do governo Bolsonaro, criticando a de consulta acerca de medida que têm impacto direto sobre suas vidas.

“Nós também estamos ameaçados por empresa de mineração como a Rio Vermelho, que já está destruindo nossos locais sagrados e por muitas outras que tem requerimento no ANM [Agência Nacional de Mineração] pra explorar nossas terras”, relatam no texto. Elas afirmam também que que o Governo quer autorizar esse tipo de de dentro de terra indígena e que não vão aceitar tais ações.

“Não trocamos a dos nossos filhos pelas hidrelétricas, mineração, portos, concessão florestal, ferrovia e hidrovia”

Leia o texto na íntegra abaixo:

CARTA DO III ENCONTRO DE MULHERES MUNDURUKU DO MÉDIO TAPAJÓS

Nós mulheres Munduruku do médio e alto Tapajós fizemos o nosso III encontro de mulheres na aldeia Sawre Muybu (Território Daje Kapap Eipi) no período de 30 de janeiro a 02 de fevereiro 2019. Decidimos continuar resistindo, defendendo a vida dos nossos filhos, mostrando e ensinando o caminho sem ganância, sem , sem ameaças para nosso . Não trocamos a vida dos nossos filhos pelas hidrelétricas, mineração, portos, concessão florestal, ferrovia e hidrovia. O governo e as empresas continuam matando a nossa mãe terra. Já mataram a mãe dos nossos como Karobixexe e Dekoka’a. Agora, o novo governo não é diferente é o mesmo pariwat inimigo dos indígenas.

Estamos aqui mandando o recado: não trocamos e nem negociamos a vida do nosso povo! A cada dia, a cada minuto, o governo Bolsonaro quer acabar com o nosso direito, com nosso território, nossa educação, nossa saúde -querendo cumprir uma promessa antiga de municipalizar e desmontar toda a saúde indígena – e com isso, acabar com a vida dos nossos filhos.

O governo não respeita e nunca respeitou os nossos direitos de viver na terra, sempre está atrás do lucro. Nós repudiamos essa MP 870 e os decretos que completam os ataques contra os povos indígenas e que ameaçam nossas terras, passando a demarcação para o Ministério da Agricultura, para as mãos sujas de sangue indígena dos ruralistas, comedores de floresta e plantadores de cana e soja envenenadas. Será que agora vamos ter que fazer plantão no Ministério da Agricultura ou no Incra de Brasília para ter nossas terras demarcadas? Nós não aceitamos essas mudanças que vão impactar nossas vidas feitas sem consulta aos povos indígenas. O Governo está rasgando a Convenção 169 da OIT, o nosso Protocolo de Consulta e declarando guerra contra os povos indígenas.

Além de tudo, os políticos e empresários são surdos aos reclames da nossa Awaidip (floresta). Mas nós a escutamos e sabemos que a cada barragem construída, um dedo do tatu que sustenta o planeta é cortado. É por isso todo esse desequilíbrio, essas , essas tragédias. São provocadas pelo pariwat e todos nós sofremos. Nós nos solidarizamos com nossos parentes Pataxó Hãe Hãe Hãe e Krenak, que sofrem com a morte dos seus rios e com todos aqueles que foram vítimas desses crimes cometidos pelas mineradoras. Nós também estamos ameaçados por empresa de mineração como a Rio Vermelho, que já está destruindo nossos locais sagrados e por muitas outras que tem requerimento no ANM pra explorar nossas terras. E sabemos que o Governo quer autorizar esse tipo de projeto de morte dentro de terra indígena. Mas nós NÃO VAMOS ACEITAR!

Por isso, como nossos ancestrais, queremos a cabeça desses governantes! Vamos continuar fazendo a autodemarcação do nosso território, nossos encontros de mulheres, fortalecendo a nossa luta e a nossa autonomia junto com os pajés, guerreiros e caciques.

Vamos seguir defendendo a casa dos nossos antepassados, do nosso povo Munduruku para que as futuras gerações, nossos filhos e netos, tenham o território garantido, possam continuar existindo do nosso modo e cultivando nosso bem viver. SAWE.

ANOTE:

*Estagiária sob supervisão de Tiago Miotto

Fonte: https://cimi.org.br/2019/02/nao-aceitamos-mudancas-feitas-sem-consulta-aos-povos-indigenas-afirmam-mulheres-munduruku

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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