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Mulheres Negras: Quem são as pioneiras que transformaram o país mas foram esquecidas pela História oficial

Quem são as mulheres negras que transformaram o país mas foram esquecidas pela História oficial

Por: Ana Paula Blower no O Globo

Quem foram Dandara, Tia Ciata, Esperança Garcia, Luíza Mahin, Maria Felipa?

Há pouca documentação sobre essas e outras mulheres negras que protagonizaram a História do Brasil ao longo dos séculos. Suas trajetórias persistem apoiadas em registros orais, e muitas delas tiveram seus papéis atrelados às lutas masculinas. Mas esse cenário está em transformação.

Para historiadores, a morte da vereadora carioca Marielle Franco, que completa um ano hoje, e a projeção mundial de seu nome revelam como, nos últimos anos, “uma série de grupos e movimentos sociais silenciados historicamente ganharam mais força e visibilidade”, nas palavras de Ynaê Santos, professora do CPDOC da FGV.

Marielle, diz Santos, não será lembrada apenas pela “barbárie de seu assassinato”, mas por seu papel social:

— Uma mulher negra, nascida na favela e defensora dos Direitos Humanos, sobretudo das causas LGBT e das mulheres negras.

Contribuem para a crescente visibilidade desses grupos as redes sociais e a maior organização dos movimentos negro e feminista. O que também propõe uma revisita ao passado, com um olhar “plural e diverso”, como sugere a historiadora:

— Um olhar que permita conhecer personagens que foram fundamentais e que, por uma série de escolhas, inclusive políticas, não receberam a devida importância.

Nomes como Dandara e Tereza de Benguela, mulheres de origem africana que foram escravizadas, explica Santos, e se engajaram na luta pela liberdade, fazendo parte de dois quilombos do período colonial, nos séculos XVII e XVIII, respectivamente. No século XIX, a historiadora destaca Maria Firmina dos Reis, autora do primeiro romance abolicionista da América Latina, “Úrsula” (1859).

— A invisibilidade da negra é fruto do racismo e do machismo que estruturam a sociedade brasileira e fazem com que essa mulher ocupe o lugar de subalternidade, exploração, mesmo compondo a maior parte da população. São várias camadas de violência, inclusive simbólica, que fazem parecer que a história dessas mulheres não importa, pois elas apenas comporiam a massa de anônimos — conclui Santos.

Construção dos sonhos

A jornalista e colunista do GLOBO Flávia Oliveira conta que, quando estava na escola, nos anos 1970, e na universidade, na década seguinte, não aprendeu sobre mulheres negras como referência ou percebeu destaque à pele negra de protagonistas da História. Essa ausência, diz, ainda ecoa na questão atual da representatividade e se reflete na construção de sonhos e na mobilidade social.

— É como se determinados papéis, como postos de poder e posições de relevância, estivessem reservados aos brancos, sobretudo homens brancos. De modo geral, negros são apresentados nos territórios das carências, em posições subalternas. O reconhecimento do protagonismo das mulheres negras na luta por direitos e na construção de saberes e tradições no Brasil nos fez muita falta, e isso está sendo corrigido agora, com o resgate dessas personagens históricas e com a construção de biografias relevantes, como a da sambista Dona Ivone Lara, a da líder religiosa Mãe Stella de Oxóssi, a da escritora Conceição Evaristo.

Além de contar as histórias dessas mulheres, é importante pensar em como apresentá-las, indo além de suas relações com um homem, como mãe ou companheira, e ressaltando suas produções intelectuais, inteligência e estratégia, destaca a historiadora Giovana Xavier:

— Dandara é uma figura narrada como mulher de Zumbi. Mas devemos pensá-la para além disso. Há várias referências do protagonismo das mulheres nas funções do quilombo, como na costura dos utensílios, vigilância das fronteiras. Por que a apresentamos como esposa, e não como quem ela foi, independentemente de Zumbi? — questiona a professora da UFRJ.

Registro oral

Uma das dificuldades para que se faça justiça a essas personagens é a carência de registros de suas existências. A cientista política Débora Thomé, autora do livro “50 brasileiras incríveis para conhecer antes de crescer”, aponta que a história das mulheres negras é, em vários momentos, registrada apenas pela tradição oral, “que se mantém de outra forma, mas é mais difícil e, às vezes, menos aceita”. A falta de documentação pode fazer com que haja “perda de nomes que nem sequer chegam até nós”.

A historiadora Patricia Macêdo, arquivista e docente da UniRio, concorda. Para ela, a literatura oficial dos séculos XVII a XIX dificulta a identificação da atuação de mulheres no período. Se as brancas eram pouco faladas, as negras, menos ainda:

— A documentação procurava escondê-las. Quando havia a presença delas, o movimento perdia força política. E eram retratadas como ‘emotivas’.

Protagonistas de seu tempo

Esperança Garcia

A escrava piauiense escreveu, em 1770, uma das mais antigas cartas de denúncia de maus-tratos contra negros, entregue ao governador da então província de São José do Piauí. Em 2017, recebeu o título de primeira mulher advogada do Piauí pela OAB do estado.

Tia Ciata

Hilária Batista de Almeida nasceu em 1854, em Santo Amaro, Bahia. É considerada uma das figuras mais influentes da origem do samba. No início do século XX, a mãe de santo promovia rituais religiosos e famosas rodas de partido-alto na Praça Onze.

Carolina Maria de Jesus

Nascida em 1914, em Sacramento, Minas Gerais, foi uma importante escritora brasileira. Em seus cadernos, descrevia sua vida na favela e seu dia a dia em São Paulo. Um deles deu origem ao seu mais famoso, “Quarto de despejo”, publicado em 1960.

Fonte: https://www.geledes.org.br/quem-sao-as-mulheres-negras-que-transformaram-o-pais-mas-foram-esquecidas-pela-historia-oficial/

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

P.S. Você que nos lê pode fortalecer nossa Revista fazendo uma assinatura: www.xapuri.info/assine ou doando qualquer valor pelo PIX: contato@xapuri.info. Gratidão!

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