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Não é um número: São 100 mil pessoas, 100 mil seres humanos

Não é um número: São 100 mil pessoas, 100 mil seres humanos

 

Na semana que vem, tudo indica, chegaremos aos 100 mil mortos.

Não é um número. São 100 mil pessoas, 100 mil seres humanos, com suas trajetórias, seus afetos, seus projetos.
Não há, na do , evento singular que tenha – nem de perto – causado tamanha mortandade. Nem a do Paraguai, nem o massacre de Canudos, nem a gripe espanhola.
 
Nada é feito para evitar ou minimizar a tragédia. O governo federal se ocupa em disseminar notícias falsas, aproveitar o caos para passar suas boiadas e boicotar as medidas – sanitárias e econômicas – necessárias ao enfrentamento da pandemia.
 
Governadores e prefeitos, salvo raras exceções, se apressam a declarar a “volta à normalidade”, apesar das curvas de contaminação descontroladas e dos hospitais lotados. A nova meta é retomar as aulas – embora o ambiente escolar seja particularmente propício à proliferação da doença, colocando em grave risco estudantes, professores e suas famílias.
 
Em suma: estamos ao deus-dará. Quem se preocupa consigo e com os outros mantém, por decisão individual, o isolamento social que pode – desde que, é claro, tenha como se sustentar e não tenha um patrão que o obrigue a sair de casa. Mas como , como orientação coletiva, não temos nada.
 
Ninguém tem dúvida de que chegaremos ao final do ano na mesma situação. , Natal, Réveillon, férias de verão, : a pandemia estará conosco em cada um desses momentos.
 
Em outros países, com dificuldades, com idas e vindas, se ensaiam formas de retomar atividades com alguma segurança. Aqui, só resta sonhar com a vacina: a vacina que será liberada para uso, na melhor das hipóteses, no final do primeiro trimestre – e a partir daí é preciso, no mundo todo, produzir os bilhões de doses e levá-la aos bilhões de pessoas, também para vários meses.
 
Ou podemos esperar pela tal imunidade de rebanho, ao custo talvez de 5 ou 10 milhões de .
Se bem que, para ser sincero, nossa verdadeira arma contra a covid é outra.
 
Nossa arma é a indiferença. O país parece anestesiado diante do sofrimento e da morte, assim como parece anestesiado diante do governo de genocidas e energúmenos que ele mesmo elegeu.
 
A crise tem revelado o pior de nossos governantes e empresários – mesquinhos, ávidos, incapazes de generosidade e de espírito público, corruptos, obtusos. Mas tem mostrado também, e isso me parece muito mais sério, como nós todos, como nação, estamos incapazes de reagir.
 
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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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