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NetFlix e os Mecanismos da Intolerância

Por Aloizio Mercadante 

Com um aporte publicitário poucas vezes visto em produções nacionais, ocupando a contracapa das revistas e grande espaço nos jornais de maior circulação, no fim de semana, a série se presta a fazer um ataque político, maniqueísta e desqualificado contra os governos democráticos dos últimos anos, notadamente os do PT. As fontes de financiamento desta campanha e série milionária permanecem desconhecidas. Caracteriza-se, ainda, como uma tentativa de desconstruir, no país e internacionalmente, a partir de manipulações grosseiras e ideologizadas, a imagem de dois ex-presidentes, Lula e Dilma, em uma plataforma de distribuição global de conteúdos.

Ainda que ficcional, a série seria inadequada. Ao se autointitular como “baseada em fatos reais”, é inaceitável, porque procura reconstruir de forma nefasta uma narrativa histórica, contribuindo para a aprofundamento da intolerância e do ódio, em nossa sociedade. Se tal manipulação política grosseira ocorresse em uma campanha eleitoral, certamente, os órgãos de controle, como os tribunais eleitorais, por exemplo, assegurariam o direito de resposta aos prejudicados. Agora, como ficam os direitos de defesa e ao contraditório e a reparação de danos contra calúnias e difamações, neste caso?

Até mesmo o grau de truculência e o ataque pessoal contra a presidenta Dilma, feitos pelo referido cineasta em resposta a nota lançada pela presidenta, que denuncia as distorções da realidade presentes em “O Mecanismo”, são incompatíveis com o ambiente democrático, que pressupõe a liberdade de pensamentos e de opiniões, mas também o respeito e a convivência com a diferença. Como nenhum crítico importante se apresentou publicamente para defender a série, o diretor tenta justificar o injustificável a partir de novos e rebaixados ataques.

Não podemos deixar de mencionar, no contexto da discussão da democratização e da regulação dos meios, a recente fraude da Cambridge Analytica, que obteve de forma irregular dados sigilosos de cerca 50 milhões de usuários do Facebook. A partir desses dados, a empresa atuou para moldar comportamentos, influenciar decisões e prever a escolha dos eleitores, atuando a favor da campanha de Donald Trump, na corrida presidencial norte-americana de 2016, além do Brexit e várias outras campanhas eleitorais relevantes.

Ao que consta, essa mesma empresa pretendia se instalar no Brasil para atuar na campanha presidencial deste ano, a favor do PSDB, e, também, em outros três estados, em mais uma ação de manipulação potencial do processo eleitoral.

Vivemos, ainda, um ambiente de ampla circulação de notícias falsas, as chamadas fake news, que agridem e atacam reputações. Pesquisa DataFolha, divulgada no último final de semana, apontou que 60% dos moradores da cidade do Rio de Janeiro receberam fake news a respeito da vereadora , assassinada de forma covarde no dia 14 de março.

O mais impactante é que 10% das pessoas que receberam as notícias falsas acreditaram que elas eram verdadeiras e outros 15% não souberam distinguir se as fake news sobre Marielle eram falsas ou verdadeiras. Ficou provado, ainda, que portais difamatórios, ligados a grupos de extrema e de inclinações fascistas, atuaram coordenadamente nesse processo difamatório, covarde e criminoso.

Além disso, essa grave manipulação cinematográfica, vem dentro de um cenário de escalada do ódio, da intolerância e do aumento dos casos de agressões, igualmente inaceitáveis, para a nossa democracia. É inegável que as fake news, a violação de dados pessoais na internet, o jornalismo de guerra e, agora, a produção cinematográfica de guerra têm contribuído e muito para fomentar esse ambiente, que pode ter desdobramentos imprevisíveis para a sociedade como um todo.

A caravana de Lula pelo sul do país foi vítima de agressões e intolerâncias inadmissíveis, inclusive com ataques físicos, como a arremesso de pedras contra o ônibus do presidente. Onde estão as lideranças dos campos ditos como social democrático e democrático, que não condenaram ou sequer se manifestaram a respeito dos ataques e agressões físicas contra militantes e a caravana de Lula?

Em 2010, a grande mídia tratou o chamado caso da “bolinha de papel”, que atingiu o então candidato José Serra, como um caso gravíssimo de ataque contra a democracia. Agora, quando Lula é alvo de pedradas e agressões físicas contamos com o silêncio, com a cumplicidade e uma quase celebração velada da mídia tradicional sobre o caso.

Como sempre, volto a defender que a internet, a imprensa e a produção cultural devem ser ambientes livres de qualquer tipo de censura. Entretanto, não podemos deixar de apontar para a urgência de uma normativa que assegure a realização de uma eleição livre e equilibrada.

A democracia só será fortalecida com a ampliação e o respeito integral a toda e qualquer corrente política e a pluralidade de pensamentos e de opiniões, em um ambiente em que sejam assegurados os direitos de defesa, de resposta e ao contraditório. A Netflix deve providências imediatas contra esta tentativa rebaixada de manipulação política. Mais que isso, a Netflix deve um pedido de desculpas ao povo brasileiro.

Netflix aloizio

Netflix e os mecanismos da intolerância

Brasil 247 


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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