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Novembro, O Mês Da Resistência Negra!

Novembro, O Mês Da Negra!

Marcelo Gentil*

“Salve o almirante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais”.

Muitos conhecem o composto em parceria por Aldir Blanc e João Bosco,
intitulado “O Mestre Sala dos Mares”. O que poucos sabem é que a composição foi censurada
pelo regime militar e, Aldir, o autor da letra, foi obrigado a alterar vários trechos da mesma,
inclusive, tendo que substituir o termo “Almirante Negro” por “navegante negro”. Afinal, como
esbravejou incomodado o censor, “na nossa gloriosa marinha não existe nenhum almirante
negro”. Ao menos, a palavra negro foi mantida depois de muitas justificativas e desculpas
junto aos censores.
Novembro, o mês da Consciência Negra tem uma importância ímpar para os
movimentos negros brasileiros, pelo fato de ser um mês rico em datas simbólicas para a nossa
causa, tanto no , como no .
Foi em novembro que foi criado o primeiro bloco afro brasileiro, o Ilê Aiyê; que morreu
Lima Barreto, um dos nossos maiores escritores, cujo estilo literário transitava entre o
Realismo e o Modernismo; que Angola, a pátria mãe de milhões de brasileiros tornou-se
independente de Portugal e, que o Zimbabwe (antiga Rodésia do Sul) também conquistou a
sua independência.
É no mês de novembro quecelebramos, também, a Revolta da Chibata – o levante dos
marinheiros negros no Rio de Janeiro -, que se rebelaram contra os castigos corporais
(chibatadas) que sofriam dos seus superiores, contra a péssima a que recebiam e
contra a impossibilidade de se desligarem da marinha de guerra por vontade própria.
João Cândido, a quem Aldir e João Bosco dedicaram a “O Mestre Sala dos
Mares”, juntamente com o marinheiro Francisco Dias Martins, que se auto-intitulava de Mão
Negra e toda a tropa rasa, depois de verem negados todos os pedidos para a revogação dos
castigos corporais e demais constrangimentos, deflagraram a Revolta da Chibata e colocaram
“de joelhos” a capital da república à época, o Rio de Janeiro e, só assim com o uso da força, da
organização e da mobilização social e política, conseguiram conquistar os direitos que são
vivenciados por todos os marujos nos nossos dias.

“Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo feiticeiro
A quem a história não esqueceu”

Se a história oficial tentou esconder a história de João Cândido e, por conseguinte da
Revolta da Chibata, aqueles que muitos anos depois, tiveram as vidas mudadas por aquele ato
de coragem em 22 de novembro de 1910, jamais esqueceram. Como exemplo, cito que um
jovem marinheiro, ao discursar no velório de Dolores Vidal, esposa de João Cândido,
proferiu a seguinte frase olhando nos olhos do Almirante Negro: “Se hoje não apanhamos,
recebemos salário e temos uma boa alimentação na marinha, devemos isso ao senhor”.

Para que a nossa juventude possa conhecer e jamais esquecer o de João
Cândido, a Olodum lançou em 2010, com ilustração do cartunista Maurício Pestana, a
cartilha REVOLTA DA CHIBATA – A revolta cidadã dos marinheiros negros, visando também,
contribuir com a socialização de material didático voltado para a aplicação da Lei 10.639/03. A
cartilha veio acompanhada de um CD com a regravação da música de Bosco e Aldir e outras
músicas alusivas ao tema, todas gravadas pelos jovens da Escola, cujo endereço do vídeo de
uma delas encontra-se aqui: (https://youtu.be/ACQiTIbbgF8?t=12).
“Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história não esquecemos jamais

Salve o navegante negro

Que tem por monumento as pedras pisadas do cais”

Por tudo isso, em novembro também rendemos todas as nossas homenagens ao
homem que, com mais de 60 anos, àquela época, e tanto tempo após a Revolta da Chibata,
continuava antenado com os problemas vividos pelo negro brasileiro e que, ao ser
questionado por um entrevistador a respeito da morte afirmou: “Seu moço, depois de morto,
eu gostaria de voltar somente para lutar ao lado dos meus irmãos negros contra o .
Pois este é o pior inimigo do Brasil”.
“Mas faz muito tempo…!”

*É vice-presidente do bloco afro Olodum

 

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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