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Governo Lula cria Prêmio Luiz Gama de Direitos Humanos

O novo Prêmio Luiz Gama será concedido a cada dois anos a pessoas físicas ou jurídicas

O governo Lula revogou a Ordem do Mérito Princesa Isabel, assinada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em dezembro do ano passado, e criou o Prêmio Luiz Gama em seu lugar.

Por Pretas e Pretos no Poder

A Ordem do Mérito Princesa Isabel era utilizada para homenagear pessoas e entidades que tivessem prestado “notáveis serviços” relacionados à proteção e promoção dos . A princesa Isabel, responsável pela assinatura da Lei Áurea que aboliu a escravidão, é frequentemente lembrada como figura central desse processo.

No entanto, movimentos negros têm levantado questionamentos sobre o papel da monarca na libertação dos escravizados, uma vez que a Lei Áurea não estabeleceu de inclusão socioeconômica para as pessoas negras e indígenas que foram escravizadas. As vítimas da escravidão frequentemente não tinham acesso a terra ou documentos e muitas vezes foram obrigados a trabalhar sem remuneração adequada.

O novo Prêmio Luiz Gama será concedido a cada dois anos a pessoas físicas ou jurídicas de direito privado cujos trabalhos ou ações mereçam destaque especial nas áreas de promoção e defesa dos direitos humanos no país. A premiação será entregue pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.

Luiz Gama, patrono da abolição das escravidão no Brasil

Luiz Gama foi um dos principais ativistas pela abolição da escravidão no Brasil, tendo sido responsável pela libertação de pelo menos 500 escravos. Nascido em Salvador em 1830, filho de uma escrava liberta e um descendente de portugueses, foi vendido como escravo pelo próprio pai quando tinha apenas 10 anos.

Posteriormente, foi levado para , onde conseguiu sua alforria antes de completar 18 anos. Apesar de ter sido proibido de se matricular como estudante na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, que atualmente faz parte da USP, ele frequentou suas aulas como ouvinte.

Em 2015, 133 anos após a sua morte, foi reconhecido pela OAB como advogado e, em 2018, foi declarado por lei como patrono da abolição da escravidão no Brasil, além de ter o nome inscrito no Livro dos Heróis da Pátria.

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Em uma época em que ainda não havia defensoria pública, Luiz Gama possibilitou, com seu trabalho, o acesso de inúmeros negros à justiça – Reprodução/Nação

O abolicionista, que também foi jornalista e poeta, é tema do de Ligia Fonseca Ferreira, professora da Unifesp que pesquisa a vida e obra de Luiz Gama há cerca de 20 anos e publicou três livros sobre ele. O último, Lições de : Artigos de Luiz Gama na Imprensa de São Paulo e do Rio de Janeiro, foi lançado em 2020.

Em entrevista exclusiva à TV Brasil, em novembro de 2020, a pesquisadora fala sobre o papel importante de Luiz Gama no movimento abolicionista, de sua atuação relevante na imprensa e também no campo literário.

Confira o trecho da entrevista:

Neste livro, que traz 61 artigos de Luiz Gama, 42 deles inéditos, quais são as lições de resistência que o leitor vai encontrar?

Essas lições de resistência são, em primeiro lugar, a defesa dos escravizados, a defesa dos direitos humanos, sobretudo o direito dos escravos que já existiam, já estavam inclusive assegurados pelas nossas leis, mas que muitas vezes não eram respeitados. Ele conseguiu desenterrar leis que ficaram como letra morta, como a lei de 7 de novembro de 1831, que deveria garantir que os africanos que desembarcassem no Brasil a partir daquela data deveriam ser considerados livres e que os traficantes de escravos deveriam sofrer penalidades. Então de 1831 até 1888, quando houve a abolição, são 57 anos. Mas o Luiz Gama vai fazer com que essas leis possam ser aplicadas antes da abolição. Ele diz que a função dos juízes é de estudar e aplicar as leis e ele vai bater insistentemente nessa tecla, e é a partir disso portanto que ele alcança, como declara numa , a liberdade de cerca de 500 escravos.

Mesmo sem formação acadêmica, Luiz Gama demonstrava muito conhecimento jurídico e advogava de graça para libertar os escravizados?

Ele traz à tona essa condição muito singular de ser um homem de uma imensa cultura jurídica e de aplicá-la em benefício dos escravizados. Ele tinha uma autorização especial para advogar em primeira instância e fazia anúncios a serviço das causas da liberdade, tudo sem retribuição alguma. Ele abraça a causa abolicionista e também foi um dos primeiros brasileiros a abraçar a causa republicana. Para Luiz Gama, a luta abolicionista também se desdobrava na luta pelos ideais republicanos, no combate à monarquia, então a gente não pode se esquecer desse papel muito importante que ele vai ter nesse momento.

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Professora Ligia Fonseca Ferreira publicou três livros sobre Luiz Gama – Arquivo pessoal

Luiz Gama advogava de graça e tinha como ganha-pão o trabalho de jornalista. Inclusive fundou o primeiro jornal ilustrado de São Paulo, chamado Diabo Coxo. De que forma as facetas de abolicionista e jornalista se uniam?

O Luiz Gama é esse trabalhador incansável do jornalismo que nós também precisamos conhecer. Além do abolicionista, que se funde com esse homem que está olhando para o Brasil e mostrando um retrato a partir de uma perspectiva diferente, que a sua condição de homem negro lhe dava. No ano de 1871, quando Luiz Gama é acusado de promover insurreições escravas, ele vem a público através da imprensa, que era uma arma importante para ele, dizer que não estava promovendo insurreições, mas que, quando a justiça falhasse em garantir o direito dos escravos, ele fala que promoveria a resistência como virtude cívica.

E além de atuar como abolicionista e jornalista, Luiz Gama também foi poeta e lançou o primeiro livro apenas 12 anos depois de ser alfabetizado?

Estamos falando aqui do Século 19, em que pouquíssimos negros estiveram ligados ao mundo das letras, à produção literária, que é outro aspecto no qual ele se destaca. Ele lança as Primeiras Trovas Burlescas em 1859. É um conjunto de sátiras políticas, sociais e raciais, nas quais o Luiz Gama faz uma grande descrição do funcionamento da sociedade imperial da época. Se a gente ler a maneira como ele aponta o funcionamento da sociedade em vários níveis, a gente tem a impressão de que o Luiz Gama está fazendo um retrato da nossa sociedade de hoje. É isso que garante a sua extrema atualidade. E ele também escreve poemas líricos. É o primeiro poeta afro-brasileiro, porque ele era filho de uma africana, a ter louvado a negra, então ele já tem um papel bastante interessante dentro de uma produção que mais tarde a gente vai poder chamar de negra, trazendo essa temática.

Nesses 190 anos do nascimento de Luiz Gama, ainda falta reconhecimento para a obra dele?

Ele deveria estar presente na da literatura, do período romântico; na história do Brasil, especialmente das lutas abolicionistas e da campanha republicana; ele deveria estar na história das ideias jurídicas, e ele deveria estar na história da imprensa, pelo papel que desempenhou e que agora uma parte está reunida no livro Lições de Resistência, em artigos que tratam sobre escravidão, liberdade, república e direitos humanos.

Fonte: Mídia Ninja. Foto: Abolicionista Luiz Gama. Imagem: Biblioteca Nacional do Paraná. Este artigo não representa necessariamente a opinião da e é de responsabilidade de Pretas e Pretos no Poder


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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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