Partiu mais cedo o Ely Macuxi

Partiu mais cedo o Ely Macuxi

    “Mergulho para sentir a areia fria no fundo do rio. Se eu não realizar uma caminhada na floresta, não consigo encontrar o equilíbrio. Para nós, indígenas, fé, crença, religiosidade é tudo e está em todos os lugares.”  – Ely  

Partiu mais cedo o Ely Macuxi, que Nhanderu o receba com festas. Escritor indígena amazonense, Ely Macuxi, morre vítima da . Ely Macuxi, parente do povo Macuxi, da Terra Indígena Raposa da Serra do Sol (RR), era professor, escritor e assessor do Conselho de Educação Escolar Indígena do Amazonas (CEEI/AM). Ely foi um defensor incansável da educação escolar indígena de qualidade, respeitando a e saberes tradicionais.

Seus estudos e escritos sempre estiveram acompanhados de um firme compromisso com as lutas sociais, especialmente junto ao movimento indígena. Ele, Ely, é o cara, porque sua experiência profissional, seus estudos e seus escritos vêm acompanhados de um compromisso inarredável com as lutas sociais.

A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) emitiu nota de pesar. “Estendemos nossos mais sinceros sentimentos a todo povo Macuxi, seus familiares, alunos e amigos.”
Apresentamos, em forma de homenagem, uma bela crônica sobre o Ely Macuxi, escrita pelo jornalista Ribamar Bessa, publicada no site Taquiprati  em 19 de Setembro de 2010.

ELE, ELY, É (era) O CARA

Por José Ribamar Bessa Freire

Prezado leitor (a), me responde rapidinho:

– Do you know mister Ely?
Hein? Essa não é a usada no Brasil? Estou falando língua de gringo? Oh, my god, why do you sempre me phode? Tudo bem! Então vou facilitar, traduzindo para um idioma nosso, do tronco tupi, falado, cantado e rezado há mais de dois mil anos aqui nesse chão que nós pisamos. Ai vai a mesma frase em língua guarani:
– Reikuaa pa Ely?
E agora? Se você não entendeu bulhufas, então tem alguma coisa errada. Afinal, o guarani é uma língua enraizada no Brasil profundo. Hoje, essa pergunta seria entendida em mais de cem municípios de dez estados do nosso país, onde vivem milhares de falantes dessa língua, mas também dentro da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), que na última quarta-feira iniciou um curso de língua guarani ministrado pelo professor indígena Alberto Tupara’y e pela linguista Ruth Monserrat. Lá falamos e cantamos em guarani.
O que acontece se eu formular a mesma questão em macuxi:
– Ely epuinen amîrî?
Deu pra compreender? Essa frase, que para nós é grego, pode ser facilmente entendida por milhares de pessoas que vivem em Roraima e que falam macuxi, uma língua do tronco Karib. Parece estranho encontrar no Brasil gente que entende inglês – uma planta estranha ao país – e que não reconhece frases em pelo menos uma ou duas das atuais 188 línguas indígenas – nativas do nosso solo.
No entanto, todo entende o português que, embora seja uma língua neolatina transplantada da Europa, criou raízes históricas aqui, nos últimos cinco séculos, incorporando marcas indeléveis das línguas indígenas com as quais manteve contato. Que o diga o carioca de Ipanema ou de Irajá – três palavras de origem tupi. Sendo assim, reformulo a pergunta na língua nacional que é, em certa medida, a língua de Camões, do Lula, da Marina Silva, do Saramago, do Joel Santana e do caspento Cristiano Ronaldo.
– Você conhece o Ely?
Um guarani responderia: Ha’e xeirŨ porã ete. Um Macuxi não hesitaria em confirmar a mesma coisa em sua língua: Morî pu’kuru mîîkîrî pemonkon. O que eles querem dizer? Mistério que só revelo depois de apresentar o Ely.
Não sabia voar
Ele é o Ely. Ely Macuxi. Ely Ribeiro de Souza, índio macuxi., professor concursado de História da rede pública de ensino em Manaus, ex-gerente de Educação Escolar Indígena na Secretaria Municipal de Educação, docente de antropologia na UNINTER e assessor de diversas organizações indígenas no Amazonas: Coiab, Copiam, CEEEI, Amarn, Wotchimaucu.
Estive em vários encontros de escritores indígenas com Daniel Munduruku, Eliane Potiguara, Álvaro Tukano, Cristino Wapixana, Rosi Waikhon e tantos outros, onde Ely mostrou os contos que escreveu: Ypaty, o curumim da selva; o passarinho que não sabia voar; a menina e o purupuru. Ele, Ely, escreve muito bem. Concluiu seu curso de graduação em Filosofia e partiu para a pós-graduação. Fez o Mestrado em e Cultura na Amazônia e especialização em Gestão e Etnodesenvolvimento, ambos na UFAM – Universidade Federal do Amazonas. O cara é bem preparado.
Ele, Ely, é o cara, porque sua experiência profissional, seus estudos e seus escritos vêm acompanhados de um compromisso inarredável com as lutas sociais. Ele, Ely, é líder comunitário no bairro de Santa Luzia, onde coordenou atividades de pastoral. Atuou ainda como dirigente sindical no Sindicato dos Trabalhadores de Ensino no Amazonas e como lutador incansável no movimento indígena organizado.
Por isso, recebeu apoio político de lideranças, caciques e tuxauas, vereadores e prefeitos indígenas em pelo menos 15 municípios do Amazonas. As comunidades indígenas urbanas de Manaus também o apoiam: os Ticuna da Cidade de Deus e do Mauazinho, os Sateré Mawé do bairro Santos Dumont, os Apurinã do Alvorada e Lírio do Vale, os Tukano do Aleixo.
Da mesma forma, tem gente boa que o apoia nas comunidades indígenas da zona rural: os Kambeba da Comunidade Brasileirinho; os Baré e os Tukano de Terra Preta; os Karapanã de Canaã; o pessoal da comunidade do Tupé – Baré, Tukano e Piratapuia. Além de alguns intelectuais amazonenses renomados como Thiago de Mello, Tenório Teles, Raimundo Nonato Correia e outros.
Zagallo e Belão
Na história do Amazonas nunca elegemos um deputado indígena capaz de defender os interesses de diferentes povos de línguas diversas, mas capaz também de representar – é o caso do Ely – os interesses de quem, não sendo índio, sofre com os problemas ambientais, de educação, saúde, saneamento básico. Ele, Ely, está comprometido com todas essas causas. Sua eleição é uma questão de honra para todos nós.
Lembro aqui – e morro de vergonha – daquela infame sessão da Assembleia Legislativa do Amazonas, em 2006, quando o presidente da Casa, Belarmino Lins – o Belão – discutiu com Francisco Balieiro. Os dois se xingaram com os mais escabrosos palavrões: biltre, canalha, patife, escroque, pulha, filho duma égua, sacripanta, efedepê. Estava empate, até que Belão ganhou quando fulminou o colega cuspindo-lhe na cara o que ele considerou como o insulto mais desqualificador: – “Índio”. A palavra soou como uma bofetada – “É a mãe” – respondeu Balieiro, ofendido.
O índio, até agora, só entrou na Assembleia Legislativa como ofensa., pela porta dos fundos Agora tem que entrar como proposta, como luz, como resistência. A melhor resposta que o eleitor amazonense pode dar ao Belão, ao Balieiro e à cambada dos que têm vergonha de sua ascendência baré é eleger um deputado indígena, para que ele entre naquele mesmo recinto onde todos nós amazonenses fomos  xingados e humilhados. E inicie seu discurso de posse com um “bom dia, senhores deputados”, em língua Macuxi ou em Nheengatu.
O número do Ely é fácil de guardar: basta lembrar o Zagallo, amante do 13, e o Belão. Primeiro você lembra o Zagallo e escreve 13. Depois, lembra o Belão e coloca um zero à esquerda – 013. Depois volta a se lembrar do Zagallo: 13013.
Agora, leitor (a) se um gringo te perguntar: – Do you know mister Ely? Responde: Yes, now I know. E tasca em guarani: Ha’e xeirŨ porã ete. Ou em macuxi:  Morî pu’kuru mîîkîrî pemonkon. O que quer dizer, em ambas as línguas: ele é muito bom, ele é o cara! (tradução do guarani por Alberto Tupara’y e do macuxi por Celino Raposo, Coordenador da Licenciatura Intercultural de Roraima).
O leitor amazonense, generoso, vai perceber que esse é o momento histórico importante para eleger Ely, o Cara: 13013 (Lembra: Zagallo Belão Zagallo). Se estou fazendo propaganda eleitoral gratuita? É. É isso mesmo. Trata-se de declaração de voto gratuita, entusiasmada, escancarada e consciente em prol de uma representação indígena na Assembleia Legislativa do Amazonas.
 – Ely epuinen amîrî?
Responde, eleitor (a), com teu voto:
– Morî pu’kuru mîîkîrî pemonkon.
P.S. – Minhas muitas irmãs, meus inumeráveis sobrinhos, meus poucos amigos, meus inteligentes ex-alunos, meus escassos leitores, votem por mim, já que meu título de eleitor não é do Amazonas. Lembre, ele, Ely Macuxi, o Cara, número 13013 (Zagallo Belão Zagallo).
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O próprio Ely Macuxi assim se define e nos conta sua história:
“Minha rotina de trabalho não deve ser diferente da maioria dos escritores, mantenho a porcentagem de 90% de trabalho e 10% de inspiração. Rotineiramente, escrevo uma ou duas laudas por dia, mas existem momentos em que eu tenho que responder aos meus personagens e fico um ou dois dias escrevendo. Como venho de tradição oral, estou sempre atento às histórias que são contadas, delas retiro personagens e enredos. Muitas dessas histórias vêm em sonhos e, assim que desperto, faço o registro.

A partir daí, inicia-se o processo de ordenamento e tradução do sonho para, então, fazer a síntese da história; em seguida, amplio em capítulo, tentando visualizar o início, o meio e o fim da história… Convencido de que a história é razoável e coerente, elaboro alguns diálogos, colocando os nomes dos personagens e suas características físicas e psicológicas, os contextos, paisagens… Enfim, é uma produção literária comum a quem escreve e quer transmitir mensagens.

O tempo de elaboração e conclusão dos meus textos é aberto e não corresponde a uma sistematização cronológica, metódica de pesquisar e escrever. Escrevo nos momentos livres, já que me dedico à docência e assessorias antropológicas no Conselho Estadual de Educação Escolar Indígena do Amazonas – CEEI/AM.

Quando vivia na aldeia, a e sua escrita era um símbolo de desejo, sonhava em falar e escrever como os brancos (não índio) que por lá estavam. Nesse momento da vida, ainda não imaginava o que ela representava para integração e aniquilamento de nossa cultura tradicional.

Posteriormente, entrei na Igreja Católica, na condição de seminarista, passando a ter acesso aos conhecimentos, tidos como universais, a ciência e a filosofia. Nesse processo, dois aprendizados: ler e escrever. Não servia para ser padre, era muito rebelde, disse-me o reitor.

Então, fora da vida religiosa, fui ser professor de História e Filosofia, o que me obrigava a escrever e contar histórias. Paralelamente, atuava no Movimento Indígena Organizado, elaborando e negociando a documentação de nossas pautas por demarcação e homologação das terras indígenas.

Numa dessas viagens, em São Paulo, encontrei o Daniel Munduruku, que me convidou para contar uma “história de índio” em um evento literário e, neste, havia um representante da Editora Paulinas – que gostou tanto da história e convidou-me para publicá-la. Desse dia em diante, começaram a me chamar de escritor.

As premissas iniciais sobre as diferentes perspectivas do que vem a ser Literatura no ocidente também se aplicam à realidade indígena, sendo difícil enquadrá-las conceitualmente em sistemas ou correntes literárias. Falamos de uma realidade antiga – a presença indígena na literatura – mas de um movimento relativamente novo no contexto da literatura brasileira, pensada e escrita por autores de origem indígena. Não sabemos exatamente qual é o seu papel, nem de qual corrente ela se aproxima em um quadro conceitual mais geral dentro da Literatura.

Mas, creio que os críticos literários devem ter algumas preocupações ao tentar enquadrá-la em algum sistema, ou estrutura, como entender que se está analisando textos escritos por representantes de povos, de diversidades, com concepções de mundo e de escrita completamente diferentes da cultura geral brasileira. Que existem outros tipos de simbolismo e grafias, outras formas de registrar as histórias além da oralidade e da escrita que se convencionou no ocidente. É fácil perceber isso nos vestígios deixados pelos antepassados indígenas, nas pinturas corporais, nos desenhos que enfeitam nossas malocas, formas e estéticas da cultura material.

Considerando que uma das dimensões da Literatura é expressar os valores e verdades de seu tempo, recebendo o corolário ideológico de seus contextos, interesses de seus produtores e divulgadores, em muito depende das versões de quem conta e como se contam as histórias. Assim, é preciso considerar – salvaguardando os ideários e as boas intenções de muitos escritores e correntes literárias – que houve muitas produções que distorceram nossas histórias, traduzindo-as como mitos, lendas, ou parlendas, naturalizando-as como folclore; outros, maldosamente, traduziram-na como ficção e magia… Equívocos que alimentaram preconceitos e discriminações ao longo do tempo, reificação de imagem de povos detentores de cultura primitiva, moradores de ocas, caçadores, coletores, falante de línguas estranhas, eternos moradores das florestas.

Assim, o movimento que hoje é denominado de “Literatura Indígena” é uma forma de expressão de um coletivo de escritores de origem indígena cuja função é dialogar com a sociedade nacional por meio da escrita, levando ao conhecimento de todos histórias mais reais sobre nossos povos, nossos conhecimentos desenvolvidos ao longo de séculos, filosofias e ciências; formas coerentes e consistentes de adaptabilidades aos ecossistemas, sociabilidade entre todos os seres, assim como a harmonização entre cultura e natureza enquanto formas simétricas de complementariedade sociais e espirituais.

Podemos, assim, dizer que a Literatura Indígena é diferente por abranger textos escritos por autores indígenas, mas – sobretudo – por trazer entre suas linhas a mensagem de vozes ancestrais, ensinamentos, conhecimentos, valores, riqueza cultural que orienta a forma de viver de 305 povos que, hoje, sobrevivem no Brasil.

É uma Literatura de resistência porque escreve sobre um segmento estigmatizado historicamente, violentado em seus direitos enquanto povos tradicionais, que continua sofrendo com as invasões de suas terras, destruição de seus ecossistemas… A Literatura Indígena é filosófica porque escreve sobre modelos de homem e de sociedade, valores, ética nas relações entre os seres vivos; é uma cultura literária porque expressa, pela escrita, formas variadas de linguagens, estéticas, paisagens, histórias e poesias.

Considero fundamental a presença da literatura na vida da criança, pois delas é que vêm as primeiras compreensões mais sistematizadas do mundo, das pessoas, manifestações de sonhos e desejos. Creio que o hábito da leitura na infância ajuda a despertar, na criança, o senso crítico, além de auxiliar o aprendizado, tornando criativas e seguras, no escrever e no falar, os modos de se colocar no mundo. Nesse primeiro momento, dizem os especialistas, a base do pensamento é a linguagem e a literatura fornece, à infância, alimentos primordiais para seu desenvolvimento: “palavras significantes e imaginação”.

Em suas leituras, as crianças ressignificam a história e personagem, reinventam e dão uma tradução muito particular que as ajudam a enfrentar seus medos e a realizar seus desejos… Tamanha responsabilidade deveria sensibilizar os governos e a sociedade em geral para o comprometimento com a oferta e promoção da leitura. Infelizmente, sabemos que isso não é prioridade enquanto política pública, limitando-se a ações pontuais ou de parte dos segmentos que trabalham com literatura, mas sem continuidade e acompanhamento em longo prazo…

Democratizar o acesso à leitura ou formar leitores é um processo embrionário que deveria começar nos lares, aperfeiçoado e motivado nas escolas e em cada canto de rua, das pequenas e grandes cidades. No entanto, isso seria resultado de uma política que enxergasse, na cultura e na educação de qualidade, uma necessidade tal qual o alimento que supre a fome e garante a vida. Não enchemos a barriga, mas alimentamos a alma, a criatividade, os sonhos, desejos, liberdade, comprometimentos sociais, cidadania…

Destaca-se, no entanto, que em contexto indígena existem especificidades, diferenças quanto a entendimento do que vem a ser criança, relacionado às concepções de mundo, cosmologias de cada povo. O universo da criança é amplo e contínuo, como as florestas, rios e , considerando os lugares de aprendizagem, ritos, regras, lazer e trabalho. Na escrita, o simbólico se dá por meio das imagens criadas na oralidade, histórias contadas, percepções que ela retira dos vários eventos que participa em sua casa, nas festas, nas brincadeiras e rituais – que começam antes mesmo dela nascer – nas rezas, nos cantos, conversas e resguardos.

O espaço de aprendizado dos primeiros anos de vida é a sua casa, sua centralidade, onde se aprende a língua, valores e verdades de sua cultura. A aldeia, ou maloca é a extensão de sua casa, onde todos cuidam, ensinam e vigiam. Embora, existem povos que já estão mais ocidentalizados, sofreram a intervenção cultural dos não indígenas, aldeamentos onde a cidade já chegou a seus terreiros, sua formação e educação já são escolares e não se diferenciam muito de uma criança da cidade. Outra realidade são as famílias de indígenas que vivem na cidade, no urbano. O esforço destas é de como manter a tradição cultural indígena em ambiente onde a língua de dominação é a língua portuguesa. Nesses contextos apresentados, enfrentamos outros desdobramentos, quanto à idade certa para a criança ir à escola, à idade para aprender outras línguas…

Aos colegas professores sugiro leitura, como acabamos de registrar, sem leitura não temos nada a ensinar, literalmente. Para nós professores a leitura tem de ser nosso alimento diário. Através dela pode-se aprender sobre as histórias, a e a especificidade dos povos indígenas no Brasil. Quanto à leitura de minhas obras sugiro que não se perca a fluência, o ritmo, o humor que tento dar aos enredos. Não são histórias de medo, terror e, sim, de estripulias, molecagem, diversão e alegria, bem próprias do mundo da criança.

O curumim gosta do engraçado, de sorrir, de se alegrar. Se os educadores conseguirem, antes de começar a contar a história, fazê-las viajar em seus imaginários para dentro das florestas, das aldeias, sentirem o cheiro das árvores e flores, o barulho dos rios, os assobios dos pássaros, entre outros animais, as crianças poderão usufruir de ricas experiências sensoriais que a ajudarão a compreender e a enxergar que as histórias de curumim são boas e são legais, ensinam a brincar e ter responsabilidades. Histórias que aprendi e vivi na minha Maloca enquanto curumim, no Maturuca, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima.”

Fontes:
Com editorial da Xapuri Socioambiental

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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