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PEDRO RAMOS: UMA VIDA EM DEFESA DA HUMANIDADE

PEDRO RAMOS DE SOUSA, A FLORESTA TE CHAMOU!

RAMOS DE SOUSA, A FLORESTA TE CHAMOU!

Neste 11 de dezembro, meu companheiro de tantas lutas, meu mano Pedro Ramos de Sousa partiu do espaço físico deste mundo.

Por Júlio Barbosa de Aquino

Me sinto muito triste, e expresso o meu pesar contando um pouco da nossa e do que ele representa para este movimento de resistência, do qual ele não só faz parte, mas, assim como seu grande amigo , representa a própria alma, a própria razão de ser. Acho que o Pedro Ramos ia gostar de saber desta pequena .

Conheci o Pedro Ramos em 1989, logo depois da morte do Chico Mendes. Eu já tinha ouvido a Mary Allegretti e o Chico falar dele, mas foi depois daquela morte que eu fui pro Sul do Pará e para o Amapá, cumprir a agenda de mobilização que o Chico tinha marcado, com o objetivo de convidar os companheiros e as companheiras para o I Encontro dos Povos da Floresta, que seria também o II Encontro Nacional dos Seringueiros, marcado para acontecer em março de 1989, como de fato ocorreu, na capital do Acre, .

Dadas as circunstâncias, eu, que era o vice-presidente do Sindicato dos Rurais de Xapuri, assumi a presidência do STR e em seguida assumi também a difícil missão de cumprir a agenda do Chico. Fui primeiro para Altamira, onde o Movimento protestava contra a Usina de Belo Monte e contra o próprio nome que estavam dando para a usina, Kararaú, um nome indígena, que os Kayapó não permitiam que fosse usado.

Foi em Altamira que eu conheci o Gatão (Atanagildo de Deus Matos) e uma grupo de advogados que defendiam os trabalhadores rurais no Pará. De Altamira seguimos juntos pela Transamazônica para Marabá, porque era essa turma que falava com o Chico Mendes, através dos Sindicatos, do PT e da CUT pela Base. De lá, eu segui para Belém, e de Belém para Macapá, para me encontrar com o Pedro Ramos, que eu meu contato passado pela Mary. Pedro Ramos foi me buscar no aeroporto e me levou pra casa de um médico chamado Batista, que me hospedou por três dias.

Em Macapá, Pedro Ramos agendou reuniões na CUT e no PT, e saímos delas com os delegados eleitos para Rio Branco. O Pedro veio com a delegação do Amapá para Rio Branco e, em março de 1989, no II Encontro Nacional dos Seringueiros, que naquela época era Encontro e não Congresso, eu fui eleito presidente e o Pedro Ramos secretário geral do CNS. Dali pra frente, até recentemente, quando a dele não mais permitiu, por essas quase quatro décadas, o nosso foi sempre junto.

Eu preciso dizer que, naquela hora terrível da morte do Chico, que foi a figura principal no meu processo de formação e compreensão a luta sindical, e, mais tarde, da sua dimensão ambiental, o Pedro Ramos foi a pessoa que, não só a mim, mas a todos e todas nós, nos deu muito lição sobre seguir adiante, como se organizar na luta, como a gente ter cuidado no trato com o inimigo, como diferenciar inimigo de adversário.

 Sim, porque foi como o Pedro Ramos que eu aprendi inimigo e adversário que são coisas diferentes, que inimigo é aquele com quem a gente não conversa, e adversário é aquele com quem você pode ter diferenças filosóficas e ideológicas, mas que adversário continua sendo adversário, mas sendo preciso a gente conversa e se trata com respeito.

Nessa nossa luta, o Pedro exerceu um papel fundamental no debate que foi feito, no plano nacional, sobre as Reservas Extrativistas (Resex). Foi ele quem nos ajudou a pensar sobre como implementar as Resex, sobre como construir os protocolos de utilização dos territórios, que foram os primeiros documentos oficiais depois da assinatura do Decreto Presidencial que criou as primeiras Reservas Extrativistas.

O papel do Pedro Ramos foi também essencial da Política Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais. Porque o Pedro tinha essa coisa com ele que ninguém de nós tinha: Ele tinha a capacidade intelectual de pensar políticas e de analisar documentos. No CNS, era ele quem primeiro, com muita paciência, lia tudo o que chegava e, depois de ler com calma, elogiava ou questionava, analisava os riscos e oportunidades e recomendava que a gente assinasse ou não.

Hoje, nessa hora triste em que nós nos sentimos um pouco órfãos com a despedida do Pedro, é preciso lembrar que Pedro Ramos de Sousa nos deixa um grande legado. Sem ele, não teríamos tido tantas conquistas, tantos territórios sob a guarda de nossas comunidades extrativistas. Sem esse ser humano tão extraordinário, sem este segundo Chico Mendes que passou por nossas vidas, teríamos tido uma jornada bem mais dura e com muito menos resultados.

Do exemplo de Pedro Ramos, fica o aprendizado de que a nossa luta, para ser vitoriosa, como dizia também o Chico Mendes, depende de muita disciplina, de muito compromisso, de muita disciplina e de muita organização. Mesmo o Pedro Ramos tendo aquele jeitão dele de parecer que era desorganizado, na verdade ele era um dos companheiros mais disciplinados que já passou por essa nossa longa luta.

Então, neste dia de tristeza, mesmo a gente sabendo que o Pedro estava muito doente e precisava descansar, não tem jeito de não se entristecer, o que espero é que o exemplo de vida dele sirva de inspiração para nossa juventude. Espero que cada jovem de cada Reserva Extrativista, se ainda não conhece, que venha a conhecer a história do companheiro Pedro Ramos e que faça dela referência em sua própria caminhada de luta.

Que todos e todas nós possamos honrar a e defender os legados dos e das que tombaram em luta por uma sociedade mais justa: de Chico Mendes, de Irmã Dorothy Stang e, agora, também de Pedro Ramos de Souza.

Júlio Barbosa de Aquino – Presidente do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS).

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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