Povos indígenas do Rio Grande de Sul continuam sofrendo com o impacto das inundações
Apesar de serem parte da população que menos prejudica o meio ambiente, os povos indígenas são os mais vulneráveis frente às mudanças climáticas.
Por Maria Letícia Marques
Os povos indígenas afetados pelas enchentes do Rio Grande do Sul ainda vivem os efeitos das enchentes severas, provocadas por chuvas intensas, que atingiram a capital do estado gaúcho no decorrer de quase todo o mês de maio.
O Cacique Kretã, liderança indígena do povo Kaingang, se manifestou em suas redes sociais emitindo um triste comunicado sobre as condições precárias em que se encontram diversas comunidades indígenas:
“As populações indígenas no Rio Grande do Sul, durante todo esse período de chuvas, muitas perderam suas casas, muitas estão ilhadas. É fundamental a junção de organizações para que possamos ajudar essas comunidades que estão espalhadas em todo o Rio Grande do Sul.”
Foto: Carolina Lima (BdF RS)
Ainda em vídeo divulgado pela rede oficial da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul – Arpinsul, Cacique Kãka também se manifesta: “A gente sofre mais porque temos menos recursos para sobreviver diante dessa situação”, declarou.
De acordo com informações da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), milhares de famílias indígenas tiveram que abandonar suas casas, suas lavouras e seus modos de produção, impactando diretamente a geração de renda de diversas famílias. Além disso, a insegurança alimentar é uma das maiores preocupações dos movimentos indígenas e órgãos indigenistas, que vêm tentando capitalizar recursos financeiros em prol das vítimas afetadas.
Esta infeliz realidade tem assolado cerca de 30 mil pessoas indígenas, das etnias Charrua, Guarani e Kaingang, que foram severamente impactadas pelas inundações no Rio Grande do Sul, cujos efeitos já perduram há mais de um mês.
Apesar da situação adversa que a região tem enfrentado, o Cacique Kretã pontuou que a organização tem mobilizado esforços para concentrar e distribuir as doações recebidas, além de destacar a atuação da Cruz Vermelha e do Greenpeace nos territórios indígenas afetados. Segundo Kretã, os órgãos indigenistas – Funai, MPI e Sesai – também continuam prestando assistência às comunidades atingidas.
Foto: Fernanda Canofre/ Agência Pública)
Maria Letícia Marques – Colunista da Revista Xapuri.
Os Indígenas foram os primeiros habitantes do Rio Grande do Sul, antes da ocupação européia, sendo dividido em três grupos:
Jês, Pampiano e Guarani. As expansões povoadoras eram formadas por portugueses e espanhóis, que se articulavam no espaço indígena de maneira diferente.
No oeste do estado os missionários jesuítas, criaram as reduções com o objetivo de transformar os índios em cristãos.
Havia também os bandeirantes que buscavam mão de obra para o cultivo de cana de açúcar, sempre deixando um rastro de sangue, por onde passavam, chegando a dizimar povoações, tanto por assassinatos como por doenças contagiosas.
Nesse mesmo período, ao leste surgiam as sesmarias, dando início ao processo de povoamento, através de fazendas de criação de gado.
Já na região da campanha, viviam os índios pampianos, que eram aproveitados como soldado, peão e tropeiro.
Os jês habitavam a parte norte junto a Santa Catarina, os guarani ocupavam o litoral e a parte central até a fronteira com a Argentina, e os pampianos se localizavam ao sul junto do Uruguai.
Indígena Guarani
Os guarani também conhecidos como tapes, arachane e carijó eram o grupo indígena mais numeroso da região. Habitavam principalmente os vales dos rios e as margens das lagoas, onde a caça e a pesca eram mais abundantes.
O guarani coletava diversos tipos de moluscos, frutos, erva-mate e raízes e cultivavam principalmente o milho e o aipim, mas também plantavam feijão, abóbora, batata, fumo e algodão.
Viviam em aldeias com varias casas dispostas em círculo. Cada clã ocupava uma casa de forma alongada, com uma porta para os homens e outra para as mulheres. Suas moradias tinham uma estrutura de madeira coberta com fibras vegetais, em geral de base circular. Essas habitações denominadas de ocas eram habitadas por diversas famílias com grau de parentesco entre si.
Uma aldeia, normalmente era formada por três a seis ocas. Os guarani foram o grupo que formariam mais tarde, os povos missioneiros, catequizados pelos jesuítas espanhóis.
Indígenas Jê
Os Indígenas Jês que ocupavam o planalto norte do estado viviam em aldeias de cinco a seis cabanas com 20 a 25 famílias, dirigido por um chefe que praticava feitiçaria.
Viviam da caça, da pesca e da coleta de frutos e raízes. Também praticavam a agricultura, cujo principal produto era o milho, além de comer e cultivar o pinhão. Para se proteger do frio alguns moravam em casas “subterrâneas”. Eles cavavam buracos no chão, que tinham aproximadamente dois metros de profundidade e cinco metros de largura e protegiam o buraco com um telhado feito de galhos de árvores cobertos por ramos de palmeira.
A terra pertencia à comunidade, com território de caça marcado. Os jês foram sendo expulsos de suas terras pelos brancos que iam chegando ao território. Em 1882 os jês fora chamados de caingangues (Kaingang – habitantes do mato). Muitos de suas aldeias foram simplesmente massacradas durante a colonização.
No século XIX, os poucos jês que sobraram e que haviam sido um dia os senhores do planalto, foram obrigados a viver em pequenas reservas. Os Kaingang que constituem a maior parte dos indígenas que vivem hoje em terras gaúchas faziam parte desse grupo.
Indígenas Pampeanos
Os pampianos, grupo formado principalmente pelos charruas e minuanos, eram o povo indígena menos numeroso. Viviam principalmente nos campos e em áreas com bastante água, pois nelas havia abundancia de recursos para a pesca e caça. Diferentemente dos guarani e jês, os pampianos não praticavam a agricultura. Viviam da caça, da pesca e da coleta de frutos e raízes e logo incorporaram os animais trazidos pelos europeus à sua vida.
Viviam na região da campanha, sendo os cavalos utilizados como meio de transporte para auxiliar na caça.
O gado bovino servia de alimento, onde havia em abundancia na região. Praticavam a poligamia e quando a mulher envelhecia era trocada por uma mais jovem.
O homem em sua maioria, não se importava se a china (mulher) tivesse relações com outro e trocava ela por qualquer outro objeto. Usavam botas de garrão de potro, e com o contato com espanhóis começaram a usar poncho, chiripá e se cobriram com chapéu de couro de “barriga de burro”.
Com a ocupação de suas terras por portugueses e espanhóis, os pampianos foram obrigados a ir cada vez mais para o interior.
A escassez de recursos provocou a fome, e a situação se agravou com as epidemias e as guerras. Muitos deles foram trabalhar nas fazendas dos colonizadores europeus.
Os pampeanos que restaram foram massacrados por tropas uruguaias na década de 1830.
Na cultura gaúcha seus vocábulos são utilizados na linguagem coloquial tais palavras como cancha, china, chiripá, poncho, guacho, charque, chasque, chiru, guaiaca, guampa, guasca, inhapa, lechiguana, mate, pampa, tambo e vincha.
Atualmente os grupos indígenas que habitam o Rio Grande do Sul chegam a aproximadamente 40 mil, dos quais somente 23 mil vivem nas reservas ou em aldeias. Os pampeanos foram completamente dizimados ainda no século XIX.
Os poucos jês que restaram pertencem ao grupo Kaingang e os guarani tentam sobreviver e enfrentam diversas dificuldades, principalmente em relação a demarcação de suas terras. A importância dos índios no Rio Grande do Sul, esta presente até hoje, através dos costumes mais tradicionais dos gaúchos como o churrasco e tomar chimarrão oriundo da herança indígena.
Fontes: Diones Franchi/- Flores, Moacyr. História do Rio Grande do Sul. Martins Livreiro, 1986. – Povos indígenas – Coleção: História Geral do Rio Grande do Sul, Ed. Méritos, 2009
Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.
Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.
Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.
Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.
Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.
Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.
Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.
Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.
Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.
Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.
Zezé Weiss
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PARCERIAS
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