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Autogoverno: Pressão dos Uru-Eu-Wau-Wau resulta na prisão de grileiros

Pressão dos Uru-Eu-Wau-Wau resulta na prisão de grileiros

Autogoverno: Pressão dos Uru-Eu-Wau-Wau resulta na prisão de grileiros

Por Mídia Ninja

A institucionalização da perseguição aos povos tradicionais e indígenas têm impulsionado um movimento de reação e . No Brasil, algumas comunidades, sem a atenção do poder público e duramente impactadas pela ação de invasores em seus territórios, têm colocado em prática o autogoverno pela garantia de seus direitos. Uma prática conhecida também, como autodeterminação.

É o que tem feito o povo Uru-Eu-Wau-Wau, como explica a Ivaneide Bandeira Cardoso, a Neidinha, que lidera a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, de Rondônia, cuja atuação se estende a 52 . Ela é mãe de uma das mais jovens expressões da resistência no Brasil, Txai Suruí.

Neidinha e outras lideranças têm importante contribuição para tirar comunidades indígenas da invisibilidade imposta por interesses econômicos. Em entrevista à Casa Ninja Amazônia/Mídia Ninja, durante a 10ª edição do Fórum Social Pan-Amazônico, ela disse que dentro do território, dado um processo crescente de grilagem, a situação é crítica. E dessa forma, não restou outra saída, senão, impor resistência e reagir de maneira autônoma, usando seus próprios métodos para pressionar autoridades políticas e órgãos ambientais.

Segundo Neidinha, o processo de grilagem se intensificou nos últimos três anos e meio, durante o governo de Jair Bolsonaro.

“Hoje, a situação se diferencia, porque os grileiros criaram associações, que têm como único objetivo, invadir as . Hoje, os produtores rurais, pecuaristas, depois de criarem essas associações, grilam fazendas no entorno da terra indígena. E a partir delas, entram na terra indígena”.

Ela conta que nesta semana, a Associação Indígena do povo Uru-Eu-Wau-Wau, junto com a Funai e a polícia ambiental prenderam dentro da TI, um grupo de pessoas grilando e roubando madeira. Eles tinham destruído uma área enorme de castanhais. “As castanheiras nos dão alimentos, geram e contribuem para a manutenção do , além de ajudar a preservar a biodiversidade, afinal, muitos animais dependem delas para se alimentar”.

Neidinha realça quão ilegal é a prática, pois no Brasil, há uma proibição de derrubar a castanheira. “Mas veja só, na lei diz que é proibido queimar a castanheira. Então, eles vão lá e não derrubam, mas queimam. E essa impunidade gera prejuízos aos povos indígenas pois o castanhal é vida para os povos indígenas”.

E ela ressalta, que é difícil para os indígenas resistirem a esse tipo de ação predatória, pois comumente, os grileiros estão armados. “Como o indígena com arco e flecha vai enfrentar alguém que está com fuzil?”, desabafou. “E eles fizeram. Entraram na Terra Indígena, desmataram e até cercaram. Isso foi a poucos metros de uma base da Funai. O governo está completamente inerte e a gente registra até uma situação sui generis, que é ‘Funai brigando com Funai’”.

Na terra Uru-Eu-Wau-Wau há quatro povos indígenas isolados e todo esse desmatamento e grilagem avança sobre o território.

“E essa briga entre a Frente de Proteção Etnoambiental e a coordenação da Funai fragiliza tanto os povos isolados quanto os povos contatados. E hoje, a gente conta com a Frente de Proteção dos Indígenas Isolados e não com ação da coordenação da Funai, o que é no mínimo muito louco”.

Incoerência é tamanha, que o Brasil assiste ao órgão que deveria proteger os povos indígenas do Brasil, “sendo contra os povos indígenas do Brasil. E isso faz com que, o povo Uru-Eu-Wau-Wau, que já vinha numa luta, tenha que tomar posição qual lado do órgão que ela fica. Para quem pede ajuda?”.

E aí, recorreram à frente de proteção de índios isolados. “Tem uma barreira que a gente chama de Posto Indígena de Vigilância, que a gente chama de Barreira 2. Parece uma mansão, construída com recurso de compensação ambiental da hidrelétrica de Jirau. Ou seja, uma compensação ambiental que dá concessão para destruir o território”.

Afinal, conta Neidinha, depois que construíram a hidrelétrica, a invasão só aumentou. A estrutura, “que custou mais de 1,5 milhão de reais e servia como posto de entrada para grileiros na terra indígena, estava abandonada e virou vetor de invasão na terra indígena”.

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Neidinha palestrou em evento sobre autodeterminação dos povos indígenas, durante o Fospa (Mídia Ninja)

Então, os Uru-Eu-Wau-Wau resolveram que iriam ocupar a barreira e alertaram a Funai que ou ela tirava os grileiros, ou eles próprios os retirariam para interromper a invasão. E isso poderia representar uma tragédia, como haviam realçado, e também, que caso isso acontecesse, a Funai seria responsabilizada.

“E quando eles disseram que iriam resolver, a Funai decidiu resolver. Mandou um pessoal de , por meio da frente de índio isolado, que ocupou a barreira. E isso fez com que houvesse muitas outras fiscalizações que culminaram na prisão de muitas pessoas e queima de maquinário”.

E é dessa forma que estão conseguindo conter a invasão. “E tem sido dessa forma. A estratégia de manter o território já está incorporada ao plano de vida, ao plano de gestão dos Uru-Eu-Wau-Wau”.

E além de proteger o território, os indígenas têm buscado garantir também segurança alimentar às comunidades, e indiretamente, , já que “a Sesai é descaso total com saúde”, como conta Neidinha.

“A gente precisa manter protegido o território, mas a gente precisa gerar renda, segurança alimentar, pois o povo sem segurança alimentar, não tem força pra manter o território protegido”. Então, os indígenas têm se dedicado à cadeia produtiva da castanha, aos Serviços Agroflorestais, produção de farinha, melhoramento do café, feijão… “Enfim, que não só garanta segurança alimentar, mas que gerem renda. A educação é outro gargalo do governo. “Esse conjunto faaz com que eles possam ter segurança pra lutar por políticas públicas, pra lutar para os jovens tá fazendo faculdade. É um grupo que só tem 40 anos de contato. É muito pouco tempo para essa pressão enorme, que destrói sua , seu modo de vida”.

Ela indica que é essencial também a formação de alianças. “Temos conseguido apoio de algumas instituições, pois sem ela não conseguiríamos fazer as ações que realizamos. Parcerias são fundamentais para proteger o território, a biodiversidade”.

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UMA REVISTA PRA CHAMAR DE NOSSA

revista 119

Era novembro de 2014. Primeiro fim de semana. Plena campanha da Dilma. Fim de tarde na RPPN dele, a Linda Serra dos Topázios. Jaime e eu começamos a conversar sobre a falta que fazia termos acesso a um veículo independente e democrático de informação.

Resolvemos fundar o nosso. Um espaço não comercial, de resistência. Mais um trabalho de militância, voluntário, por suposto. Jaime propôs um jornal; eu, uma revista. O nome eu escolhi (ele queria Bacurau). Dividimos as tarefas. A capa ficou com ele, a linha editorial também.

Correr atrás da grana ficou por minha conta. A paleta de cores, depois de larga prosa, Jaime fechou questão – “nossas cores vão ser o vermelho e o amarelo, porque revista tem que ter cor de luta, cor vibrante” (eu queria verde-floresta). Na paz, acabei enfiando um branco.

Fizemos a primeira edição da Xapuri lá mesmo, na Reserva, em uma noite. Optamos por centrar na pauta socioambiental. Nossa primeira capa foi sobre os povos indígenas isolados do Acre: ‘Isolados, Bravos, Livres: Um Brasil Indígena por Conhecer”. Depois de tudo pronto, Jaime inventou de fazer uma outra boneca, “porque toda revista tem que ter número zero”.

Dessa vez finquei pé, ficamos com a capa indígena. Voltei pra Brasília com a boneca praticamente pronta e com a missão de dar um jeito de imprimir. Nos dias seguintes, o Jaime veio pra Formosa, pra convencer minha irmã Lúcia a revisar a revista, “de grátis”. Com a primeira revista impressa, a próxima tarefa foi montar o Conselho Editorial.

Jaime fez questão de visitar, explicar o projeto e convidar pessoalmente cada conselheiro e cada conselheira (até a doença agravar, nos seus últimos meses de vida, nunca abriu mão dessa tarefa). Daqui rumamos pra Goiânia, para convidar o arqueólogo Altair Sales Barbosa, nosso primeiro conselheiro. “O mais sabido de nóis,” segundo o Jaime.

Trilhamos uma linda jornada. Em 80 meses, Jaime fez questão de decidir, mensalmente, o tema da capa e, quase sempre, escrever ele mesmo. Às vezes, ligava pra falar da ótima ideia que teve, às vezes sumia e, no dia certo, lá vinha o texto pronto, impecável.

Na sexta-feira, 9 de julho, quando preparávamos a Xapuri 81, pela primeira vez em sete anos, ele me pediu para cuidar de tudo. Foi uma conversa triste, ele estava agoniado com os rumos da doença e com a tragédia que o Brasil enfrentava. Não falamos em morte, mas eu sabia que era o fim.

Hoje, cá estamos nós, sem as capas do Jaime, sem as pautas do Jaime, sem o linguajar do Jaime, sem o jaimês da Xapuri, mas na labuta, firmes na resistência. Mês sim, mês sim de novo, como você sonhava, Jaiminho, carcamos porva e, enfim, chegamos à nossa edição número 100. E, depois da Xapuri 100, como era desejo seu, a gente segue esperneando.

Fica tranquilo, camarada, que por aqui tá tudo direitim.

Zezé Weiss

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