Quilombos Brasileiros: Maioria vive sob ameaças
Mais de 16 milhões de pessoas negras vivem em quilombos remanescentes. O dado divulgado pelo Instituto Socioambiental (ISA), no mês de maio, traz à tona que quase 100% dessa população vive em constantes ameaças de vida dentro de seus próprios lares e territórios.
Por Maria Letícia Marques
De acordo com recente pesquisa realizada pelo Instituto Socioambiental (ISA), mais de 98% dos quilombos brasileiros estão ameaçados. O estudo foi elaborado em conjunto com a Conaq e relata dados inéditos acerca dos impactos causados por obras de infraestrutura, mineração e sobreposição de imóveis rurais sobre os territórios quilombolas.
É importante destacar que os Territórios Quilombolas são as áreas mais conservadas no Brasil e desempenham um grande papel frente às mudanças climáticas. Para os nascidos dentro de um quilombo remanescente, a terra significa resistência e é de onde emana a principal fonte de sustento da comunidade, onde, dia após dia, as pessoas lutam pela titularização de suas terras, além de enfrentarem ameaças constantes de ruralistas.
Além disso, o levantamento de dados, realizado pelo ISA e Conaq, aponta as principais atividades, majoritariamente praticadas de forma irregular, que causam severas ameaças aos quilombos brasileiros. Dentre elas, estão: a degradação florestal, provocando a perda da biodiversidade; a exploração descabida de recursos naturais; a produção agropecuária inconsequente; além de atividades ligadas a obras de infraestrutura, como aberturas de rodovias e estradas.
RESISTÊNCIA E PRESERVAÇÃO AMBIENTAL
Cerca de 3,8 milhões de hectares são ocupados por territórios quilombolas, número que corresponde a 0,5% em relação à totalidade do território brasileiro. Apesar de parecer pouco, 3,4 milhões de hectares são tomados por vegetação nativa, significando um grande respiro para o Planeta.
De acordo com dados do MapBiomas, em 38 anos os territórios quilombolas perderam apenas 4,7% de vegetação nativa, enquanto nas áreas privadas a perda foi de 17% no mesmo período.
“As florestas, a água, os animais e toda forma de vida são cuidados meticulosamente pelos quilombolas, seguindo os ensinamentos ancestrais, pois todas as vidas importam em um quilombo”, pontua Francisco Chagas, membro da Conaq.
O PAPEL DO GOVERNO FRENTE AO SOFRIMENTO HISTÓRICO DOS QUILOMBOS
Os quilombos têm enfrentado problemas relacionados ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), o registro público eletrônico nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais.
Dito isso, cabe destacar que o poder público deveria ser o principal agente facilitador na inscrição das populações quilombolas no CAR, levando em consideração que uma das maiores dificuldades das comunidades tradicionais consiste no cadastramento adequado no CAR. Vale ainda ressaltar que diversos estados não possuem a categoria “povos e comunidades tradicionais”, o que torna a política pública excludente em relação às comunidades quilombolas.
“É fundamental promover um amplo debate nacional envolvendo todos os níveis de governo e os povos quilombolas para discutir as práticas de racismo estrutural no Brasil. Os governos precisam reconhecer essa questão e pedir desculpas, pois somente assim será possível resolver os problemas enfrentados pelas comunidades quilombolas no país”, explica Chagas, da Conaq.
Mediante a evidente falta de atuação do Estado, os quilombolas têm se organizado com intuito de promover a resolução dessa situação, através de articulações com Organizações Não Governamentais, como sindicatos e demais comunidades quilombolas, que têm se juntado para criar um espaço de diálogo sobre o tema.
Maria Letícia Marques – Estudante de Direito. Redatora voluntária da Revista Xapuri.