Rio Negro – Proteger e conservar a Amazônia é uma questão de sobrevivência, Em forma de poesia, podemos conhecer um pouco mais sobre a fauna, flora, animais e vegetação e também todos os encantos da floresta amazônica
Rio Negro – Por Rogel Samuel
Na terra em que eu nasci, desliza um rio
ingente, caudaloso,
porém triste e sombrio;
como noite sem astros, tenebroso;
qual negra serpe, sonolento e frio.
Parece um mar de tinta, escuro e feio:
nunca um raio de sol, vitorioso
penetrou-lhe no seio;
no seio, em cuja profundeza enorme,
coberta de negror,
habitam monstros legendários, dorme
toda a legião fantástica do horror!
Mas, dum e doutro lado,
nas margens, como o Quadro é diferente!
Sob o dossel daquele céu ridente
dos climas do equador,
há tanta vida, tanta,
ó céus! e há tanto amor!
Desde que no horizonte o sol é nado
até que expira o dia,
é toda a voz da natureza um brado
imenso de alegria;
e voa aquele sussurrar de festas,
vibrante de ventura,
desde o seio profundo das florestas
até as praias que cegam de brancura!
Mas o rio letal,
como estagnado e morto,
arrasta entre o pomposo festival
lentamente, o seu manto perenal
de luto e desconforto!
Passa – e como que a morte tem no seio!
Passa – tão triste e escuro, que disséreis,
vendo-o, que ele das lágrimas estéreis
de Satanás proveio;
ou que ficou, do primitivo dia,
quando ao – “faça-se!” – a luz raiou no espaço,
esquecido, da terra no regaço,
um farrapo do caos que se extinguia!
Para acordá-lo, a onça dá rugidos
Que os bosques ouvem de terror transidos!
Para alegrá-lo, o pássaro levanta
voz com Que a própria penha se quebranta!
Das flores o turíbulo suspenso
manda-lhe eflúvios de perene incenso!
Mas debalde rugis, brutos ferozes!
Mas debalde cantais, formosas aves!
Mas debalde incensais, mimosas flores!
Nem cânticos suaves,
nem mágicos olores,
nem temerosas vozes
o alegrarão jamais!… Para a tristeza
atroz, profunda, imensa, que o devora,
nem todo o rir que alegra a natureza!
nem toda a luz com que se enfeita a aurora!
Ó meu rio natal!
Quanto, oh! Quanto eu pareço-me contigo!
eu que no fundo do meu ser abrigo
uma noite escuríssima e fatal!
Como tu, sob um céu puro e risonho,
entre o riso, o prazer, o gozo e a calma,
passo entregue aos fantasmas do meu sonho,
e às trevas de minha alma!
ROGEL SAMUEL
Rogel Samuel, escritor, ensaísta e crítico literário natural de Manaus, tece em seu poema “Rio Negro” uma complexa narrativa poética que se desenrola ao longo das margens do Rio Negro, um dos mais imponentes afluentes do Rio Amazonas.
Esse rio, famoso por suas águas escuras e misteriosas, serve como pano de fundo e inspiração para uma reflexão profunda sobre a relação entre a natureza e o eu lírico.
O Rio Negro, reconhecido por ser o mais extenso rio de águas negras do mundo, é cercado por uma paisagem de beleza única e majestosa.
No poema, o eu lírico se detém para observar e descrever minuciosamente tudo o que se passa ao seu redor, tanto na terra quanto nas águas. Sua observação atenta revela um cenário repleto de vida, onde a fauna local desempenha um papel central.
Os animais, descritos de maneira vibrante, são apresentados como símbolos de vitalidade e alegria, em contraste com a imagem sombria do rio.
Essa dualidade entre a vivacidade da fauna e a obscuridade das águas reflete uma tensão constante no poema. O Rio Negro, com suas águas escuras e profundas, é retratado como um lugar cheio de mistérios, um espaço onde o desconhecido e o imprevisível reinam. Essa atmosfera enigmática provoca no eu lírico uma identificação com o rio, especialmente em relação ao seu caráter melancólico.
À medida que as águas do Rio Negro avançam e começam a dominar as margens, o eu lírico se vê refletido nessa invasão silenciosa e gradual. O rio, com sua presença imponente, simboliza uma força natural irresistível, que inevitavelmente se conecta à introspecção do sujeito poético.
A correnteza que arrasta e transforma a paisagem ao seu redor é comparada à própria condição humana, marcada por uma tristeza profunda e uma sensação de inevitabilidade diante dos mistérios da existência.
No poema, Rogel Samuel constrói uma narrativa que vai além da simples descrição de uma paisagem natural. Ele utiliza o Rio Negro como uma metáfora para explorar questões existenciais, refletindo sobre a relação do homem com a natureza e consigo mesmo.
A escuridão das águas, assim como os mistérios que elas escondem, torna-se um espelho para os sentimentos de melancolia e introspecção do eu lírico, criando uma obra de profunda ressonância emocional.
Fonte: Cultura Genial